Yannick Schade/Volt: Melhorar a «mobilidade tem de ser a prioridade para o Algarve»

No Algarve, «algo tão banal como ir às compras tinha de ser sempre feito com o apoio de um carro»

Yannick Schade tem 23 anos de idade. Trabalha no setor do atendimento ao cliente desde 2019. Tem experiência com voluntários e ONGs, incluindo a ReFood e o Rias, desde 2011. Juntou-se à política em 2018 por se «sentir frustrado» com ela. Representa, pela primeira vez como cabeça-de-lista do Volt, o círculo eleitoral onde nasceu e cresceu.

Agora que já está a decorrer a campanha eleitoral, o Sul Informação está a publicar entrevistas com os cabeças-de-lista dos 15 partidos ou coligações que se candidatam às Eleições Legislativas do próximo dia 10 de Março.

As mesmas questões foram enviadas, atempadamente, a todos os 15 primeiros candidatos, abrangendo os principais temas em foco no Algarve.

As entrevistas serão publicadas à medida que as respostas forem chegando à nossa redação.

 

Sul Informação – Quais são as prioridades da sua força política na próxima legislatura para o Algarve?

Yannick Schade – Queremos diversificar a economia algarvia. No entanto, para que as empresas se fixem no Algarve, é necessário haver incentivos e condições favoráveis.
Como tal, é necessário investir nas infraestruturas do distrito, nomeadamente na ferrovia. Essa seria das melhores formas de capacitar a região com melhores transportes, tornando-a mais atrativa para as empresas e melhorando a qualidade de vida dos algarvios.

SI – O que levou a que aceitasse ser cabeça de lista pelo partido ou força política que representa?

YS – No Volt, realizam-se eleições primárias entre os membros do partido para decidir as lideranças das listas.
Eu decidi concorrer por considerar ser importante que o meu perfil fosse representado na política portuguesa: o perfil de um jovem trabalhador que não conseguiu financiar os seus estudos no ensino superior e que está cansado da estagnação do país e da região onde vive.

SI – Quais são as expetativas e objetivos da sua força política em relação a estas Eleições Legislativas?

YS – Pretendemos, principalmente, eleger a nossa primeira deputada por Lisboa. É essa a nossa ambição.
Este sistema eleitoral não permite, no entanto, uma representação real da vontade dos eleitores, já que milhares de votos são desperdiçados, o que incentiva os eleitores a votarem de forma estratégica, através do chamado “voto útil”, em vez de votarem no partido que de facto os representa.
O meu objetivo é trazer para a mesa este e outros temas, assim como lutar pela criação de um círculo eleitoral nacional de compensação, de forma a assegurar a representação dos eleitores.

SI – O que falta fazer no Algarve?

YS – Tanto! Por onde começar? Eu cresci no Algarve e sempre tive dificuldade na deslocação durante o dia-a-dia.
A oferta de transportes públicos é pouca e os serviços fracos. Algo tão banal como ir às compras tinha de ser sempre feito com o apoio de um carro.
No entanto, existem bons exemplos de outros pontos da Europa sobre como integrar as populações rurais na vida da sociedade. É o caso do “Rufbus” na Alemanha, onde é possível telefonar para a junta de freguesia local e chamar um autocarro para a aldeia mais próxima.
É necessário investir numa rede de transportes públicos eficaz e que responda adequadamente às necessidades da população.
Para mim, a mobilidade tem de ser a prioridade para o Algarve, porque isso ajudaria a enfrentar questões como o problema da habitação.
Permitiria, por exemplo, que se viva fora das cidades, mas que se consiga ter fácil acesso às mesmas, diminuindo assim a procura nos centros das cidades e, consequentemente, a especulação imobiliária.
Isto permitiria ainda que fosse mais rápido e fácil viajar de uma cidade para a outra, dando às empresas mais opções no recrutamento de recursos humanos.
Tal tornaria o Algarve mais atrativo para novas empresas, permitindo maiores economias de escala, criando mais emprego e gerando mais lucro para a região.
A ideia é, deste modo, atrair novos setores da economia, ao contrário da falta de diversificação atual, na qual a região é dominada pelo turismo.

SI – A seca e a falta de água são tema premente no Algarve. Que soluções defende, no curto prazo, sabendo-se que a água atualmente disponível só chega até Agosto? E no médio e longo prazo?

YS – A curto prazo, é necessário reduzir o impacto da seca, através de medidas como a eliminação das perdas de água nas condutas, seja por fugas ou avarias, garantindo que a rede seja reabilitada onde necessário.
Tendo em conta que alguns municípios chegam a ter 50% de perda de água nas condutas, esta tem de ser uma prioridade nesta área.
Propomos que se fiscalize os furos ilegais, na agricultura e não só, já que estes furos devem ser geridos pela comunidade, de forma a que sejam usados pela a população em geral, e não apenas por alguns.
Outras medidas a médio e longo prazo passam por maximizar a reutilização das águas provenientes das ETARs, que são devolvidas ao mar e poderiam ser usadas para limpezas industriais e lavagens de carros, por exemplo.
A transição para uma agricultura mais sustentável, com plantações adaptadas ao clima mais seco e que precisem de menos água, é outra das medidas que propomos.
A dessalinização não pode ser a primeira solução, já que não vai resolver os problemas estruturais, como são as fugas nas condutas.

SI – A Saúde é um setor muito deficitário no Algarve e no país. Que medidas preconiza para resolver os problemas da Saúde no Algarve?

YS – Sem dúvida que a saúde digital tem de ser um dos focos, de forma a assegurar um serviço moderno e eficiente.
Temos também de garantir que os fluxos mais elevados de utentes nas épocas altas são tidos em conta no financiamento local, em vez deste ser baseado no número de residentes. Tal contribuiria para assegurar que os serviços de saúde no Algarve são capazes de responder à procura sazonal, sem afetar as necessidades dos Algarvios.
É necessário garantir também que há foco nas USF-B e que o Algarve é apelativo a médicos de família.

SI – E quanto ao Hospital Central do Algarve? O que deve ser feito?

YS – A falha na oferta de serviços de saúde no Algarve é um problema bastante conhecido no distrito, mas que não tem tido grandes melhorias.
Tendo em conta que a equipa para dar “início ao processo de estudo e preparação do lançamento de uma nova parceria público-privada para a constituição do novo Hospital Central do Algarve” (como se pode ler no boletim do Ministério da Finanças) foi constituída em abril do último ano, poderemos estar a falar de décadas até terminar a construção do hospital em si.
Acho que deve ser prioritário o investimento na melhoria e recuperação das infraestruturas existentes, como é o caso do Hospital de Faro.
É essencial assegurar que os serviços atuais estejam em condições e respondam de facto às necessidades dos Algarvios.

SI – O Centro Hospitalar Universitário do Algarve e a Administração Regional de Saúde juntaram-se, a partir de 1 de Janeiro, num único organismo, a Unidade Local de Saúde do Algarve. O que pensa desta alteração e que expectativas tem para o seu futuro?

YS – A transição para a ULS é positiva porque incentiva a integração de cuidados de saúde primários e terciários e a saúde preventiva.
No entanto, o resultado real vai depender da implementação a nível de sistemas e processos. É necessário assegurar que esta mudança será executada de forma eficiente e tenha com foco nas necessidades da população e região algarvia.

SI – O anterior Governo, agora apenas em gestão, transformou as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional em Institutos Públicos, agregando novas funções (como a Agricultura e Pescas, bem como a Cultura). O que pensa desta alteração e que expectativas tem para o seu futuro? Trata-se de um primeiro passo para a Regionalização?

YS – A integração destes serviços periféricos na CCDR é, efetivamente, um passo inicial para uma maior autonomia da região, porque haverá uma melhor articulação entre os diferentes serviços, nomeadamente os mais recentemente integrados, o que levará a uma maior eficiência na comunicação e alocação dos diferentes recursos.
Esta alteração permite também que os serviços se mantenham na mesma localidade, o que leva a uma continuidade do trabalho realizado com as comunidades locais.
Uma vantagem também vinda desta nova lei orgânica é a maior autonomia administrativa e financeira da CCDR, ainda que sob tutela do Ministério da Coesão Territorial.
No entanto, considero importante uma monitorização minuciosa desta nova reestruturação, dado que as metas estabelecidas até 2029, como o aumento de funcionários, acarretam um nível de esforço e organização substanciais.

SI – É a favor ou contra a Regionalização? Porquê?

YS – Sou a favor. Tal como o Volt, defendo a regionalização como motor de desenvolvimento de todo o território, aproximando as estruturas de decisão política do cidadão e, desta forma, contribuindo para o combate à abstenção, para uma maior coesão territorial e para o aumento da eficácia e da eficiência dos serviços públicos.
A regionalização será um vetor de especialização económica das diferentes regiões, que contribuirá para solucionar problemas estruturais de produtividade e competitividade da economia portuguesa, ao permitir libertar o potencial criativo da região atualmente constrangido pela conceção centralizada das políticas públicas.
A regionalização deverá ter por base o princípio da subsidiariedade, segundo o qual o nível de governo acima (Governo da República, neste caso) apenas intervém se a sua ação for mais eficaz do que aquela que for prosseguida ao nível regional.
Pretende-se tornar a estrutura do Estado mais moderna e flexível.

SI – A integração das antigas Direções Regionais de Cultura e de Agricultura e Pescas na CCDR terá ou não efeitos benéficos para estes setores?

YS – Esta integração é benéfica, já que permite às regiões terem mais autonomia de decisão nestes setores e, consequente, terem uma resposta mais dinâmica e personalizada às necessidades das populações locais.
É, no entanto, necessário um acompanhamento desta mudança, para assegurar que a mesma é feita de forma produtiva.

SI – Que soluções preconiza para as portagens na Via do Infante?

YS – O que acho como prioridade é o investimento na infraestrutura de transportes públicos, já que, de momento, é quase uma obrigação ter carro próprio no Algarve.
Relativamente às portagens da Via do Infante, estas acabam por ser uma expressão dessa realidade, já que, se não tivéssemos todos de usar o carro para chegar a todo o lado, as portagens não teriam tanta relevância como atualmente têm.
A curto prazo, concordo que se deva manter as portagens até estar pago o investimento feito na via e para a sua manutenção, mas que se deve procurar chegar a um acordo com o privado para acabar com as portagens, até haver uma oferta de transportes públicos competitiva e que responda às necessidades dos algarvios.

SI – E para a conclusão das obras na EN125, de Olhão a Vila Real de Santo António?

YS – As obras na EN125 são essenciais para assegurar a segurança da via.
Sendo a EN125 conhecida pelo seu mau estado, é importante que a qualidade e segurança sejam asseguradas.
Tendo em conta que os transportes públicos não têm uma cobertura decente na região e, por isso, os algarvios ficam muitas vezes limitados ao transporte individual, é importante garantir a qualidade das vias, já que nem temos alternativas viáveis.

SI – Um dos grandes problemas do Algarve é o da mobilidade. Estão a ser feitas obras para a eletrificação da Linha do Algarve, prevê-se a criação do Metrobus e fala-se de uma eventual ligação por TGV entre Faro e Huelva/Sevilha. Qual a sua opinião sobre estas questões e que soluções defende?

YS – A oferta ferroviária do Algarve não é competitiva e não responde às necessidades dos residentes, nem dos turistas.
As três medidas mencionadas na pergunta são insuficientes ou não deveriam estar em cima da mesa neste momento, já que se estão a saltar passos importantes.
A eletrificação da rede deveria ser feita, depois de um melhoramento do trajeto da linha, já que eletrificar primeiro secções da linha que ainda podem ser melhoradas não é eficiente, por terem de ser encerradas para a melhoria do trajeto.
Seria mais eficiente rever que secções poderiam ser melhoradas, desta forma permitimos aos comboios alcançar velocidades mais elevadas e depois, então sim, eletrificar a rede.
Entretanto, é de assinalar que a linha do Algarve, neste momento, está a ser usada a 40% da sua capacidade.
Aumentando esta mesma capacidade, conseguimos ter serviços mais regulares, que não nos obriguem a esperar horas, o que torna a ferrovia uma opção muito mais atrativa.
Relativamente ao Metrobus, faz mais sentido investir numa linha de ferrovia nova que conecte pontos estratégicos do Algarve, como o aeroporto e os polos universitários, como proposto no programa do Volt, já que o Metrobus não tem a mesma capacidade e não apresenta soluções que sejam mais atrativas que o uso de transporte individual.
Por último, tem de se criar uma linha que conecte a Andaluzia ao Algarve.
No entanto, uma linha de TGV não faz muito sentido, já que, para que esta seja eficiente, teria de parar apenas nas cidades maiores, como Faro, Huelva e Sevilha, e não contribuiria muito para a mobilidade da região.
Eu apelo a que se crie uma linha regional moderna entre o Algarve e a Andaluzia, de forma a oferecer este novo serviço, mas também melhorando a oferta da linha já existente.

SI – O presidente da Região de Turismo do Algarve queixou-se de que o orçamento deste organismo é curto e não é aumentado há largos anos. O que preconiza para este setor, na região algarvia?

YS – O turismo é, neste momento, o setor económico dominante no Algarve, o que mais impacto e influência tem sobre o distrito.
O Algarve não pode continuar dependente de um só setor da forma como está atualmente.
Um bom exemplo disso foi visto durante a pandemia, com o desemprego a subir durante esse período de forma desproporcional em relação ao resto do país.
É por isso necessário priorizar a diversificação da economia algarvia. Nós temos, por natureza, uma região atrativa para se viver, com bom tempo e paisagens lindas.
No entanto, sem a infraestrutura necessária, não somos uma região competitiva em comparação com outras pela Europa fora.
Para além da infraestrutura, quero aplicar medidas como a criação de organizações de clusters (aglomerados empresariais), a revisão e alargamento do esquema de incentivos fiscais dirigido a atividades de investigação e desenvolvimento, e apostar em setores como, por exemplo, as energias renováveis, a inteligência artificial, a economia digital, a economia do mar e a biotecnologia.

SI – No atual Governo, o Turismo partilha uma secretaria de Estado com o Comércio e Serviços? Considera que é suficiente? Ou um futuro Governo deveria dar mais importância ao Turismo? De que forma?

YS – Como mencionei na questão anterior, acredito estarmos demasiado dependentes do setor turístico e temos de diversificar a nossa economia.
Essa tem de ser a prioridade para Portugal e não apostar sempre no mesmo setor. Setor este que está fortemente exposto a crises económicas, ambientais, geopolíticas e como se viu, a pandemias.
Assim, considero que o modelo atual de incluir o Turismo na secretaria do Comércio e Serviços é adequado e que o foco tem de ser na criação de condições para que outros setores se fixem em Portugal.

SI – No caso de questões mais fraturantes, votará na AR de acordo com a sua convicção, mesmo que vá contra as orientações do seu partido?

YS – Sim, irei votar de acordo com a minha convicção, se achar que a posição do meu partido não é correta, já que o voto dos deputados deve representar os eleitores, em primeiro lugar, e não os partidos.

SI – Considera que seria útil alterar a lei eleitoral, para criar círculos uninominais e parciais e um círculo nacional de compensação, e assim aproximar mais os deputados dos cidadãos? Porquê ou porque não?

YS – O sistema eleitoral português tem várias mais-valias, mas sofre, ainda assim, de vários problemas que outros modelos resolvem.
Um deles é a falta de representatividade concreta dos deputados na Assembleia da República, o que cria distância entre o representante e o eleitorado, levando a um problema de desresponsabilização.
Outro problema é a falsa proporcionalidade obtida através do uso do método de Hondt sem um círculo de compensação.
Como solução, vejo a adoção de um sistema eleitoral que proporcione um equilíbrio entre representatividade e proporcionalidade, por exemplo, com círculos de compensação, como existe nas eleições regionais dos Açores.
Desta forma, não comprometemos nenhum dos princípios do sistema atual e garantimos a estabilidade governamental com recurso a consenso e coligações, sem dificultar a entrada de novos partidos mais pequenos.

SI – Quer acrescentar mais algum tema ou questão?

YS – Um tema que me precoupa neste momento é a Defesa. Tanto Portugal como uma boa parte dos países europeus não estão em condições de se defenderem a curto prazo.
É importante que apostemos rapidamente neste setor, de forma a que, a médio e a longo prazo, consigamos mudar a realidade atual e ter Forças Armadas com capacidade de responder a ameaças externas.
Alguns primeiros passos a tomar, neste momento, incluem a compra de armamento, equipamento e veículos conjuntamente com outros países; a integração de unidades em exércitos de outros países, como já fazem os Países Baixos e a Alemanha; e tornar a carreira militar mais atrativa.
A longo prazo, é necessário um exército europeu que responda perante o Parlamento Europeu, para que tenhamos uma força militar que seja capaz de servir como dissuasor eficaz a atuais e futuras ameaças.

 

Leia mais um pouco!
 
Uma região forte precisa de uma imprensa forte e, nos dias que correm, a imprensa depende dos seus leitores. Disponibilizamos todos os conteúdos do Sul Infomação gratuitamente, porque acreditamos que não é com barreiras que se aproxima o público do jornalismo responsável e de qualidade. Por isso, o seu contributo é essencial.  
Contribua aqui!

 



Comentários

pub