Há festa para os 66 habitantes da Penina (e para quem se quiser juntar)

A Penina está em festa este sábado, com atividades de manhã à noite

Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

O concelho de Loulé é um dos maiores do país em termos de área geográfica e nele moram muitas aldeias, que, outrora esquecidas, hoje lutam para «vir no mapa». A Penina, onde moram 66 pessoas, grande parte com mais de 50 anos, é uma delas. Para lá chegar, dizem os moradores, «é mesmo preciso querer lá ir», mas há uma festa que já está a mudar mentalidades.

Alice Ferreira tem 81 anos. Na Penina, todos a conhecem e quem cá vem nunca se vai embora sem passar pela casa dela.

As oito décadas de vida não a impedem de, todos os dias, ir apanhar as suas ervas para o chá ou tratar do pequeno museu que, ano após ano, foi construindo.

Num anexo, bem tratado e cuidado, Alice junta hoje todas as alfaias que usava na agricultura, as peças de empreita que vai fazendo ou as suas costuras na máquina a pedal que, ainda hoje, pode ser usada. Tudo está à disposição de todos, basta bater à porta e pedir para entrar.

Com entusiasmo, Alice conta que aguarda pelo dia de hoje, 17 de Junho, quando, na iniciativa “Penina em Festa”, a aldeia se enche de gente nova e com vontade de aprender e de se divertir. «No ano passado, estive a ensinar a empreita, muita gente quis aprender, este ano também posso mostrar como se faz, mas também vou aprender e ser aluna em vez de professora», diz-nos.

«Estou mais nova, quando me perguntam digo que fiz 18 anos», atira, entre risos.

 

O Museu da D.Alice. Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

Este é o terceiro ano consecutivo em que a Penina abre portas para festejar e as expectativas estão «muito altas».

Quem o diz é Manoli Ortiz, a artista espanhola que escolheu viver nesta aldeia louletana há 23 anos e que desde o começo esteve envolvida na organização do Penina em Festa.

«Este projeto começou em 2021, que foi o primeiro ano em que o Geopalcos fez atividades para promover o Geoparque. Nessa altura, convidaram uns 20 artistas de Loulé para entregar o projeto cultural e eu fui uma das artistas convidadas», explica ao Sul Informação.

 

Manoli Ortiz. Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

No Largo da Fonte da Nossa Senhora de Fátima, Manoli e Vítor (também da Penina) mostram como tudo está a ser preparado para a festa. Já há máquinas de bebida e muito gelo, porque se espera um dia de calor.

«A salamandra pré-histórica [Metoposaurus algarvensis], que é o que está na origem disto tudo, foi descoberta aqui e, por isso, é natural que as pessoas daqui se sintam muito ligadas ao projeto», diz Vítor Gregório, que também faz parte da organização do Penina em Festa.

O projeto de que Vítor fala é o do aspirante a Geoparque Algarvensis, candidato a património mundial da UNESCO, que engloba os concelhos de Loulé, Albufeira e Silves, e parte da descoberta na Penina, por investigadores da Universidade de Edimburgo, do fóssil de uma espécie de salamandra gigante, com 200 milhões de anos.

Para promover a candidatura a geoparque e envolver a população, desde 20 de Maio que está a decorrer o festival Geopalco, que leva arte, ciência e natureza aos três concelhos envolvidos.

Apesar de se tratar de uma iniciativa bienal, as coisas na Penina correram tão bem, em 2021, que, no ano passado, voltou a haver festa, patrocinada pela Câmara Municipal de Loulé. E agora há festa de novo.

«Na Penina, ficámos fascinados com a dinâmica do que estava a acontecer, mas o que veio depois foi ainda mais maravilhoso. Nota-se que isto ficou entranhado nas pessoas: está tudo florido, pintado e nota-se que as pessoas querem mostrar a aldeia ao mundo e que fazem bem. Esta é a ”aldeia exemplo” e gostávamos muito que este sentimento contaminasse o restante território», diz ao nosso jornal Andreia Pintassilgo, designer na Câmara de Loulé e uma das responsáveis, desde o início, pela comunicação da “Penina em Festa”.

Hoje, 17 de Junho, o programa começa às 9h00, com caminhadas, workshops (que vão desde o esparto ao aprender a fazer cerveja artesanal, passando pelo montar a cavalo), exposições, animação de rua e concertos. A partir das 21h30, há música com In Versus e Urze Lume.

 

Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

Apesar de este ser «o grande dia», nos anteriores, as ruas já estavam prontas para receber as centenas de pessoas que a aldeia espera receber.

Na Penina, não é preciso muito tempo para percorrer a aldeia de uma ponta à outra, mas cada rua está mais embelezada do que a anterior.

Maria Palma não esconde o orgulho ao ver as ruas floridas, fruto também do trabalho diário dos aldeões que querem tornar a Penina num lugar melhor.

Maria não nasceu aqui, mas há 35 anos que se mudou para cá, por isso, já se considera mais da Penina do que do local onde nasceu. Ao Sul Informação, recorda como as coisas eram diferentes há uns anos. «Nestas últimas décadas, assisti a uma grande evolução: hoje esta é uma aldeia mais bonita, alegre, florida e muito mais limpa».

 

Maria Palma. Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

Questionada sobre se este tipo de festas trouxe outras dinâmicas, Maria Palma não duvida: «Estas festas ajudam a mostrar a aldeia a outras pessoas. Quase ninguém conhecia a Penina, quase que não vinha no mapa, e agora os caminhos vêm todos dar aqui neste dia», reforça, ao mesmo tempo que vai mostrando o trabalho que algumas pessoas têm feito para dar uma nova vida às ruas.

«Aqui, todos fazem um bocadinho. A Junta dá a água, depois nós temos aí os garrafões e bidões e juntamo-nos para regar. Há sempre quem fique mais encarregue de tratar das flores todos os dias, mas é tudo feito com muito gosto», revela, reforçando que, assim, gostavam também de passar o exemplo de que, «quando as pessoas estão unidas, os sítios andam mais bonitos e bem tratados».

Manoli, que trata de todos os preparativos desde o primeiro dia, acompanha-nos ainda ao Café Faísca, o único da aldeia. Atrás do balcão está Graça, que nos diz que os eventos são bons para todos «e também para o negócio, claro».

«Isto é pequeno e não há assim muito movimento, por isso, com a festa, temos de trabalhar muito mais», continua, reforçando que haverá petiscos para todos os que visitarem o estabelecimento.

 

Graça Faísca, proprietária do Café Faísca. Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

A par de todas as atividades que os visitantes poderão explorar, é ainda possível aprender como se faz velas e sabonetes naturais, na Saboaria D’Aldeia, ou como os pigmentos das plantas autóctones são transferidos para os tecidos através de um processo de cozedura.

Manoli terá também o seu ateliê aberto para que as pessoas possam ter contacto com as suas obras de arte e, se quiserem, adquirir alguma peça.

«Na Penina, encontrei um refúgio e um sítio de inspiração. Aqui, tenho tudo aquilo de que preciso para desenvolver a minha arte», reforça Manoli Ortiz, referindo ainda a importância que esta dinamização territorial tem tido para a aldeia e para pessoas como a D. Alice, que já pouco saem de casa, mas que gostam muito quando as visitam.

«Poucos passam por aqui, mas, quando passam, têm curiosidade para ver as coisas que aqui guardo. Na Festa, estão todos convidados a entrar», salienta a octogenária Alice Ferreira, que se despede com um «até que a gente se veja».

Consulte aqui o programa completo do Penina em Festa.

 

Fotos: Mariana Carriço | Sul Informação

 

 

 

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