Elisa Ferreira: Objetivo do Plano de Recuperação e Resiliência não é «estar a pagar estradas»

Comissária Europeia deu entrevista coletiva a uma dezena de media regionais, entre os quais o Sul Informação

O objetivo do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) não é «estar a pagar estradas», garantiu Elisa Ferreira, Comissária Europeia da Coesão e Reformas, durante uma entrevista coletiva a uma dezena de órgãos de comunicação social regionais de todo o país, entre eles o Sul Informação.

Tendo em conta que, como o nosso jornal noticiou, duas das obras principais previstas no PRR para o Algarve são precisamente na área das infraestruturas rodoviárias – a construção da variante de EN125 a Olhão e a ponte sobre o rio Guadiana, entre Alcoutim e a localidade espanhola de Sanlúcar -, a afirmação categórica da Comissária Europeia ganha outro impacto.

Elisa Ferreira explicou que «as estradas são muito importantes, mas não são propriamente o projeto mais indicado para materializar um relançamento económico que tenha uma base verde [ou que pretenda] refazer as condições de funcionamento da administração pública».

O que se pretende, reforçou, é que «a economia, quando sairmos da crise, seja uma economia mais verde, uma economia mais digital e tecnológica, e que seja mais coesa socialmente e mais coesa espacialmente».

«Quando estamos a falar do plano de relançamento da União Europeia, estamos a falar de relançar a atividade económica da Europa de uma forma diferente do passado».

O objetivo é relançar a economia europeia «no sentido de criar mais valor acrescentado às empresas, fomentar uma economia mais verde, recuperar a eficiência energética de edifícios», «muito virado para o apoio à educação, à digitalização das escolas, extensão das redes digitais».

Outro aspeto a ter em conta é que os projetos de infraestruturas demoram muito tempo a ser concretizados e não é isso que o PRR pretende. «Se, de facto, num projeto, por exemplo, para fazer uma ferrovia, o concurso público, muitas vezes internacional, vai demorar de tal modo que o projeto não fica capaz de ser candidatado, aceite e iniciado até 2023 e terminado até 2026, ele não caberá aqui. Vai caber melhor nos fundos 21-27», acrescentou Elisa Ferreira.

Tendo em conta que não existe ainda um projeto aprovado, sujeito a avaliação do impacte ambiental e discutido, até com as autoridades espanholas, para a ponte de Alcoutim a Sanlúcar, este pormenor do prazo apertado faz com que esta antiga aspiração local, apesar de prevista no PRR, possa ficar mais uma vez adiada.

Respondendo a uma pergunta do Sul Informação, a Comissária Europeia replicou: «Quando eu disse que o objetivo do PRR é relançar a economia europeia numa base mais ecológica, mais verde, mais tecnológica, e não propriamente fazer estradas, não estava a dizer que, num quadro em que faça sentido, em que seja necessário, não pode haver uma estrada ou uma ponte que possam ser financiadas. Estou a dizer que não está no objetivo central do plano».

É que, explicou, «o dinheiro que vem da Europa [no âmbito do PRR] é para fazer coisas que eram impossíveis, ou que eram muito difíceis de fazer, sem ele. Há um princípio fundamental, que é o princípio da adicionalidade, e portanto, o que se pensa em Bruxelas, é que o Estado Português já tem condições para fazer algumas estradas, algumas ligações, algumas ferrovias, e que o dinheiro da Europa devia ser mais bem aproveitado para fazer coisas mais difíceis…». E que «coisas» seriam essas? «Ideias que vêm dos Politécnicos, das Universidades, e fazer a ligação com as empresas para que as empresas ganhassem, também, valor acrescentado adicional».

A Comissão Europeia «olha para Portugal e diz que Portugal já gastou tanto dinheiro em estradas, que, provavelmente, agora é altura de se dedicar a outro tipo de coisas, a outro tipo de investimentos», nomeadamente utilizando «os fundos europeus para ciência, para tecnologia, para inovação também no interior». Por isso, defendeu, há «um trabalho muito importante, que é pegar nas regiões e ver o que é que os Politécnicos, o que é que as Universidades podem dar, e quais são os projetos que são mais interessantes para redinamizar a economia dessas regiões».

 

Por outro lado, na sua entrevista coletiva ao grupo selecionado de jornais regionais portugueses, Elisa Ferreira adiantou que «quer nos fundos 21-27, quer no PRR, há setores sobre os quais há uma preocupação especial», sendo que «um deles é o setor do turismo».

A Comissária Europeia salientou que muitas zonas turísticas de outros países estão a preparar projetos, no âmbito do PRR, que lhes dêem vantagens «nos mercados concorrenciais fortíssimos internacionais de turismo». «Emissões zero», a implementação da «economia circular», «uma oferta turística que reutiliza as águas [residuais tratadas] nos jardins, que não faz emissões atmosféricas porque utiliza energia solar, que isolou os edifícios». O que é preciso, incitou, é «aproveitarmos esta oportunidade para ganhar novas formas de competitividade».

Quanto ao Algarve, Elisa Ferreira lembrou que esta «região turística não é só orla costeira, não é só turismo de sol e praia».

«Qual é a visão do Algarve para si próprio, relativamente a um futuro mais sustentável? Isto é algo que eu interpelo os atores: qual é o vosso plano?»

«No âmbito do relançamento, seja ele através do REACT, seja através dos fundos estruturais normais ou até do PRR, há aqui toda uma oportunidade» a aproveitar.

Dando um exemplo num outro setor importante da economia do Algarve, a Comissária falou da possibilidade de «um financiamento para que os operários de construção civil não fiquem numa situação de miséria» em caso de nova crise, levando-os a «fazer uma formação em isolamento de edifícios ou em poupança energética ou em técnicas inovadoras de construção. Ao mesmo tempo, podemos fazer a recuperação do comportamento ambiental e energético seja dos hospitais, seja dos tribunais, seja das nossas habitações. Vejam a quantidade de postos de trabalho e a dinâmica que uma coisa destas pode trazer à economia. E ao mesmo tempo, claro, o trabalho foi apoiado, mas ganhou novas bases para a competitividade».

A terminar, a Comissária Europeia da Coesão defendeu que «a imprensa regional tem um papel fundamental na partilha, no pensamento e na divulgação da informação de maneira a não perdermos esta oportunidade, porque esta é histórica. Vamos ter fundos e vamos ter de os utilizar muitíssimo bem, com muita exigência e qualidade e, sobretudo, muita responsabilidade».

 

Veja e oiça na íntegra a entrevista coletiva da Comissária Europeia Elisa Ferreira:


Nota: Este artigo tem o apoio da Representação em Portugal da Comissão Europeia

 

 



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