Petróleo no Algarve: quando acordamos?

Fala-se muito da necessidade de tornar a Democracia mais participativa e de encontrar formas de aproximar os cidadãos da política. […]

anabela afonsoFala-se muito da necessidade de tornar a Democracia mais participativa e de encontrar formas de aproximar os cidadãos da política. No entanto, quando há oportunidade de o por em prática, não apenas como exercício, mas como imperativo democrático, a urgência desse desígnio de abertura e transparência parece desaparecer.

Vem isto a propósito da exploração de hidrocarbonetos (petróleo e gás natural) em terra e no mar, que está já a avançar no Algarve, tema debatido num encontro realizado no passado dia 15 de abril, na Escola Superior de Saúde da Universidade do Algarve.

Foram levantadas muitas questões, dúvidas e alertas, sobre os quais pouco se tem debatido na região, apesar de termos atingido o ponto em que tudo parece já estar decidido. Segundo é já do conhecimento público – e, se não é, basta ver a reportagem que passou no dia 8 de abril na RTP3 – dias antes das últimas eleições legislativas o anterior governo contratualizou com a empresa Portfuel – detida pelo empresário Sousa Cintra e familiares – a exploração de hidrocarbonetos no Algarve.

Em apenas 2 contratos, firmados por negociação direta, prescindindo de qualquer consulta ao mercado, tendo por base uma legislação de 1994, Sousa Cintra fica com os direitos de prospeção e exploração de hidrocarbonetos em cerca dois terços de todo o território do Algarve, incluindo áreas protegidas como a Costa Vicentina.

Entretanto, o atual governo já informou estar a rever as condições legais em que os contratos foram realizados, mas até à data não se sabe de nenhuma alteração.

Segundo os organizadores do encontro, todos os deputados eleitos pelo Algarve foram contactados para estar presentes na sessão, mas nenhum compareceu, e apenas um se fez representar. Não será esta uma questão para uma tomada de posição por parte dos deputados eleitos pela região?

Para além desta, várias outras perguntas ficaram sem resposta naquela sessão, e a duas ou três delas, pelo menos, deveríamos exigir uma resposta rápida aos responsáveis políticos:

1. Não será estranho o Estado recorrer a legislação que tem mais de 20 anos, para fechar um contrato destes por negociação direta, numa área de atividade que levanta tantas questões de impacto no território, incluindo o facto de abranger zonas de proteção ambiental, quando, se há área em que o quadro legal tem vindo a evoluir num sentido cada vez mais restritivo, é precisamente a da proteção ambiental?

2. Sendo uma das evoluções que as diretivas comunitárias vieram introduzir em projetos com elevado potencial de impacto ambiental, a obrigatoriedade da discussão pública desses mesmos projetos, não será de estranhar este assunto só vir a público quando os contratos com a Portfuel estão assinados e quando a Partex se prepara para iniciar as primeiras perfurações offshore distando 40 a 50 quilómetros da costa de Faro?

3. Não será estranho, num país que aponta como desígnio nacional estratégico a aposta nas energias renováveis, surgir agora uma aposta tão forte em recursos que contrariam totalmente este objetivo?

Por fim, talvez importe referir a infeliz coincidência de a exploração de petróleo estar, em regra, associada aos pontos geográficos mais pobres, desiguais e conflituosos do planeta, como são o caso de Angola, Nigéria, Líbia, Médio Oriente, só para enumerar alguns.

Será que tudo isto não é suficientemente preocupante para que a região do Sol e da Praia acorde de vez e exija que lhe façam a pergunta: Querem a exploração do Petróleo na vossa terra?

 

Autora: Anabela Afonso é licenciada em Relações Internacionais e mestre em Comunicação, Cultura e Artes, variante Teatro

 

 

Comentários

pub