O que é que aconteceu à Praia do Forte Novo e como podia ter sido evitado? 

Praia só voltará ao que era com reposição de areia

Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

A praia do Forte Novo, em Quarteira, já não é a mesma depois do temporal do fim de semana da Páscoa, que fez desaparecer o areal e causou a destruição parcial dos passadiços. Contudo, por ser uma destruição que já se previa que pudesse acontecer, podia ter sido evitada. Mas como?  

«Há um plano de reposição [de areias] que está delineado desde 2020, mas que até agora ainda não foi efetuado. Se tivesse havido uma continuidade de reposição, isto tinha sido evitado».

Óscar Ferreira, doutorado em Dinâmica Costeira e investigador do Centro de Investigação Marinha e Ambiental (CIMA) da Universidade do Algarve, explica ao Sul Informação que a zona de Quarteira/Forte Novo é uma área do Algarve com «o perímetro de costa conhecido e muito bem estudado», principalmente depois da construção da Marina de Vilamoura, que desencadeou um fenómeno de erosão naquela zona costeira, «que começou a ter um recuo de cerca de três metros por ano». 

«Para aliviar esse recuo e impedir alguma destruição de ocupação existente ou continuidade de recuo, em 2010 foi feita uma realimentação [de areias] de grande dimensão entre a zona de Quarteira e as Dunas Douradas, depois de Vale do Lobo. Essa realimentação tinha um tempo de vida estimado de entre 10 a 12 anos», explica Óscar Ferreira. Só que esse tempo já passou e, por isso, «a areia que lá foi depositada já foi toda removida pelo mar e foi transportada em direção à Praia de Faro».

«Durante estes quase 14 anos, houve ali uma zona tampão que foi a tal areia que foi colocada. Essa área foi agora toda erodida e por isso passámos a ter a erosão da arriba e da duna, que já tinha acontecido anteriormente», continua.

Rory Bova trabalha no A Gaivota Beach Restaurant Bar há cerca de 10 anos, e, por isso, diz que nunca tinha assistido a uma destruição tão grande, mas sabe que já havia acontecido.

 

Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

«A diferença é que antes não havia este passadiço e por isso acho que agora a destruição parece ainda maior», diz o jovem ao nosso jornal.

Neste restaurante situado mesmo ao lado da praia do Forte Novo, no fim do calçadão de Quarteira, o impacto negativo da destruição ainda não se sentiu. Rory salienta até que «muitas pessoas têm vindo aqui de propósito para ver o que se passa».

«Em termos de negócio, ainda não conseguimos ter noção se isto irá afetar muito ou não, até porque o tempo ainda não está a chamar muitas pessoas para a praia», afirma.

Enquanto falamos com o jovem, são de facto muitas as pessoas que vão aparecendo, de bicicleta ou a pé, e que, ao deparar-se com aquela vista atípica, aproveitam para a registar em fotografias ou vídeo.

Óscar Ferreira, especialista em questões de gestão e dinâmica costeira, duvida que este ano haja, na Praia do Forte Novo, uma época balnear semelhante às anteriores. 

«Só com nova realimentação é que aquela zona pode voltar ao que era, porque não tem capacidade de reposição natural. Não sendo feita a reposição até lá – porque isso obriga a concursos, provavelmente até internacionais,  a avaliação de impacte… uma série de coisas que faz com que essa obra não se possa fazer de um dia para o outro – neste Verão aquela praia viverá com a areia que recuperar naturalmente, que será muito pouca».

 

Óscar Ferreira. Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

O areal disponível será assim, diz o especialista, o que existir em maré baixa, «e com uma largura reduzida».

Neste caso, é a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) que terá de intervir, colocando em prática o plano que já havia elaborado.

«A APA sabe perfeitamente, porque tem especialistas muito bons na área, que a areia que é colocada é transportada a uma determinada taxa, que por isso tem um tempo de vida estimado, e que esta intervenção estava no seu tempo limite de vida», frisa Óscar Ferreira, reforçando que «só eles podem responder ao porquê do atraso da intervenção».

O Sul Informação tentou entrar em contacto com a APA, mas, até ao momento de publicação deste artigo, não foi possível.

Numa nota enviada às redações, no dia 1 de Abril, a Câmara de Loulé prometeu que irá fazer esforços para «solucionar, com a maior celeridade possível, esta situação»: primeiro com «trabalhos de remoção de todos os destroços e outros resíduos aí acumulados, a fim de limpar toda a área afetada» e depois com a prevista reposição da areia, ao abrigo de  «um projeto de recarga de toda a zona de areal entre a frente de mar de Quarteira e a praia do Ancão», que a ARH Algarve – Agência Portuguesa do Ambiente «tem já executado», cujo valor estimado ronda os 14 milhões de euros.

Só depois de o areal estar devidamente “reposto” é que será possível reconstruir o passadiço, intervenção que a autarquia diz que assumirá, «logo que estejam reunidas as condições para tal».

Apesar de, nos últimos anos, se ter tornado cada vez mais frequente ouvir falar em vários tipos de destruição nas zonas costeiras, Óscar Ferreira explica que a zona entre Quarteira e Faro é, sem dúvida, a mais afetada em todo o Algarve e das mais em risco no país.

 

Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

«O Algarve tem duas áreas de comportamentos completamente diferentes: uma zona arenosa – onde o troço mais problemático é este, e em que tem de se ter sempre uma continuidade de gestão elevada para que não haja problemas graves – e o troço de costa rochosa – que tem problemas diferentes, sobretudo de possibilidade de queda das arribas. Nestas zonas, não há recuos de vários metros por ano, o que pode haver são desprendimentos pontuais locais e que trazem perigo para quem está na praia».

Situação que também tem preocupado a população local é a cor da água e a areia negra que agora é bastante visível naquela zona, mas quanto a isso o especialista tranquiliza a população.

«É tudo natural. O mar está castanho porque, por baixo, existem bancadas de argila que ficaram expostas e provocam aquela tonalidade».

Já o «material escuro» que aparece na zona também não é poluição, mas minerais mais pesados.

«Em vez de serem areias de quartzo, às quais nós estamos habituados aqui no Algarve, de praias branquinhas, são areias semelhantes às que existem em zonas vulcânicas, como nos Açores ou na Madeira».

Dada a ocorrência «causadora de prejuízos à imagem turística da região», a Câmara de Loulé, na sua nota, tinha aproveitado para reafirmar publicamente «a necessidade de o legislador criar as condições legais necessárias, através da instituição de um fundo regional para resposta imediata e simplificada às consequências graves dos fenómenos climáticos, que irão aumentar de frequência no futuro».

A autarquia diz ainda que se «manterá atenta e estará em permanente contacto com a ARH Algarve para solucionar, com a maior celeridade possível, esta situação».

 

 

 

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