Agro-florestal e Ambiente: sectores da sustentabilidade em deriva liberal

Quando esgotarem o solo (a água já está a esgotar-se…), os investidores abandonam a actividade e vão apostar noutra localização

Sustentabilidade quer dizer perenidade dos recursos naturais e dos ecossistemas que suportam a vida.

Do sector agro-florestal, sai a produção primária do sistema terrestre, na qual se apoia a base da economia – por isso, a protecção do solo e da água é fundamental e é ensinada às criancinhas logo na escola… ou devia ser.

A produção agro-florestal fornece-nos materiais básicos para a alimentação e para o primeiro comércio, desde logo os fundamentos de uma economia social de mercado; mas o que tem prevalecido com maior impacto nas últimas décadas é a economia de mercado livre e os sobressaltos da deriva liberal da economia global.

O Prof. Joseph Stiglitz, Prémio Nobel da Economia em 2001, escrevia, em 2019, que o liberalismo prejudicava a democracia há uns 40 anos, substituindo os direitos dos cidadãos a uma escolha livre pela escolha imposta pelos mercados sem regulação. Por mais que Fukuyama arranje subterfúgios…

Em Portugal, a deriva neoliberal no agro-florestal acentuou-se com o primeiro-ministro Cavaco Silva, embora ele se arrogue como o paladino da social-democracia (Sá Carneiro espumaria, se fosse vivo).

Na verdade, ele pagou subsídios aos pequenos e médios agricultores para deixarem de produzir e milhares de hectares de solo ficaram ao abandono ou foram parar aos eucaliptos; e também extinguiu os Serviços de Extensão Rural que eram fundamentais para ensinar novas culturas e novas técnicas a quem chegasse à agricultura. Mas os grandes agrários e a agro-indústria têm dinheiro para pagar aos seus próprios técnicos. Social-democracia, hem?…

Ainda com o PSD, o Ministério da Agricultura e Florestas esteve integralmente nas mãos de pessoal oriundo das celuloses, que tentou acabar com os Serviços Florestais e com as Áreas Protegidas, no Ambiente, complô denunciado pelo próprio ministro Amílcar Teias (durou pouco tempo no cargo…).

Com a chegada do PS, as coisas não mudaram de rumo, acentuaram-se! António Costa, quando foi ministro da Administração Interna, não consta que percebesse alguma coisa da matéria, mas, apoiado no seu colega da Agricultura – o pior titular do sector até ter chegado a actual… – concluiu a tarefa começada pelo PSD: acabou com os guardas-florestais, enviando-os para a GNR.

Em que país do mundo se terão inspirado para acabarem com os Serviços Florestais e o seu corpo próprio de guardas?

Há sempre uma razão, pode ser esta: a ética profissional dos engenheiros florestais, mesmo controlados pelas celuloses, e os planos de ordenamento dos grandes Parque Naturais, eram entraves à livre expansão dos eucaliptais, por isso eram alvos a abater. E foram.

Numa economia social de mercado, a agricultura deveria dar prioridade às culturas alimentares e forrageiras de que temos tanta carência – mas não, a agricultura, nomeadamente a sul do Tejo, foi orientada para os grandes regadios industriais.

No Algarve, onde já existia uma cultura tradicional exigente em rega, os citrinos, que deram fama à região, em vez de se incrementar a agricultura alimentar e os pequenos proprietários de hortas e pomares, a política regional orientou-se para os grandes pomares de regadio, nomeadamente de abacates para exportação.

Quando esgotarem o solo (a água já está a esgotar-se…), os investidores, qual táctica de jogo de casino, abandonam a actividade e vão apostar noutra localização.

Quem cá fica apanha com os solos exauridos e sem água – deriva liberal da economia que prejudica fortemente a economia social de mercado que deveria prevalecer numa social-democracia.

E nem têm coragem para voltar a reorganizar um verdadeiro Ministério da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, preferem desmantelar as direcções regionais, em nome de uma infeliz concepção da regionalização.

E do Ambiente é melhor nem falar, estão à vista de todos as tomadas de posição a nível nacional e regional. Cada um que faça o seu juízo perante as tropelias que nos são apresentadas quase todas as semanas.

 

Autor: Fernando Santos Pessoa é arquiteto paisagista e engenheiro silvicultor…e escreve com a ortografia que aprendeu na escola

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