O adeus em Paris

Num mundo repleto de diversidade cultural, é notável como o adeus é compreensível em qualquer contexto

Foto: Joe de Sousa | Unsplash

O adeus, frequentemente associado a despedidas, transcende essa conotação e assume-se como um cumprimento universal. É um gesto que ultrapassa barreiras culturais e linguísticas, ligando pessoas de diferentes partes do mundo através de um aceno ou interação. Este gesto modesto carrega consigo significados, muitos dos quais vão além do simples adeus.

Estive em Paris e, enquanto navegava no Rio Sena num bateau mouche, a degustar um couscous com sabor a hortelã e cores primavera, embalada pela voz suave de Édith Piaf, senti a magia do gesto despreocupado de adeus, e de receber em retorno, o adeus simpático dos desconhecidos que se passeavam nas margens firmes. A felicidade inocente, quase infantil, desses instantes fez juntar estas palavras que agora está a ler.

Num mundo repleto de diversidade cultural, é notável como o adeus é compreensível em qualquer contexto. Independentemente da língua falada, da indumentária ou das tradições, o gesto de acenar “adeus” é reconhecido. Este facto realça a beleza da comunicação humana, que vai além das palavras e encontra expressão nas ações.

O adeus é uma saudação com várias nuances. É uma despedida após um encontro, mas também uma saudação ao que virá. Expressa gratidão e apreço pela companhia, e um compromisso de reencontro no futuro. O adeus torna-se uma ligação entre o passado, o presente e o porvir, celebrando a vida que se desdobra diante de nós.

Este gesto transcultural testemunha o desejo intrínseco de nos conectarmos uns com os outros. Através do adeus, estabelecemos uma ligação, por vezes breve, mas significativa, com as pessoas que cruzam o nosso caminho. Esta ligação é um lembrete de que, apesar das diferenças, partilhamos uma humanidade comum e a habilidade de comunicar emoções e intenções sem recorrer às palavras.

Na sua simplicidade, o adeus também nos recorda a brevidade da vida e a importância de valorizar cada momento. As despedidas podem ser agridoces. Enquanto celebramos as memórias que criamos, reconhecemos também a inevitabilidade das separações. No entanto, o adeus mantém vivo o espírito daqueles que conhecemos e permite-nos manter aceso o fogo das experiências partilhadas.

Quando acenamos adeus, saudamos a humanidade partilhada. Foi isso que senti nas dezenas de acenos amistosos que recebi e enviei, enquanto o reflexo da Torre Eiffel resplandecia no Sena. Com um adeus, honramos o presente e o futuro, expressando o que as palavras nem sempre conseguem transmitir.

Enquanto escrevo estas linhas, é impossível não recordar o «Senhor do Adeus»:

«Venho para a Praça Duque de Saldanha desde que fiquei nas mãos de não ter ninguém. Nasci aqui perto, na casa da minha avó. Um palacete bonito que o Calouste Gulbenkian quis comprá-lo. A vida dá estranhas voltas, o meu destino é acenar a quem me cumprimenta. Estou sujeito a que me chamem maluco, mas não me importo. Da minha solidão sei eu».
João Manuel Serra, o «Senhor do Adeus»

O adeus é saudade. É esperança no que ainda virá. Mas também é solidão.

 

 

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