CCMAR e Oceano Azul refutam críticas da Quarpesca ao Parque Marinho da Pedra do Valado

Argumentos da Quarpesca «não correspondem à realidade dos factos»

O Centro de Ciências do Mar (CCMAR) da Universidade do Algarve e a Fundação Oceano Azul refutam as críticas da associação de pescadores Quarpesca em relação ao futuro Parque Natural Marinho do Recife do Algarve – Pedra do Valado, defendendo que este foi um «processo participativo» e que esta será a área marinha protegida com o «conjunto de estudos prévios mais completo» de Portugal. 

A posição do CCMAR e da Fundação Oceano Azul, promotores do Parque Natural Marinho do Recife do Algarve, surge após um comunicado muito crítico da Quarpesca.

Nele, a associação de pescadores, que até promoveu uma manifestação este sábado, 19 de Agosto, deixa várias críticas ao processo – algo que já tinha feito também em Junho, logo após a apresentação do projeto.

Uma das falhas apontadas por esta entidade à proposta apresentada, que resultou de um processo de participação prévio, coordenado pelo CCMAR, em parceria com a Fundação Oceano Azul, é a «ausência de estudos de impacto social, económico e até cultural que a implementação deste projeto teria».

Em resposta, o CCMAR e a Fundação Oceano Azul recordam que houve um «forte apoio dado, pela sociedade, ao processo de criação de uma nova Área Marinha Protegida em Portugal, incluindo as principais associações de pesca da área do novo Parque Natural Marinho do Recife do Algarve – Pedra do Valado (PNMRA-PV)».

Além disso, salientam, «esta é a área marinha protegida com um conjunto de estudos prévios mais completo que se conhece em Portugal, sobretudo a nível de mapeamento dos habitats marinhos, da biodiversidade, da distribuição espacial das atividades humanas, em particular do esforço da pesca polivalente e do cerco».

«Estes estudos foram desenvolvidos sobretudo pelo CCMAR e incluem: o estudo científico dos valores naturais do Recife do Algarve e o estudo do impacto socioeconómico das pescas e atividades marítimo-turísticas. Adicionalmente, no processo participativo, foi ainda incorporado o conhecimento empírico das várias entidades participantes, incluindo o setor da pesca», acrescenta.

Toda esta informação, defendem os promotores, é pública e consta do dossiê de suporte à criação da área marinha protegida e que foi entregue ao governo em Maio de 2021.

Outra questão levantada pela associação de pescadores é uma alegada «falta de veia democrática dos impulsionadores do projeto, que apregoavam consensualidade e participação quando ela não existia».

 

Sessão de apresentação do projeto, na Universidade do Algarve, em Junho

 

Face a isto, tanto o CCMAR como a Fundação Oceano Azul recordam que o «processo participativo envolveu, ao longo de quase três anos, 89 entidades, num movimento pioneiro em Portugal».

«A proposta de criação do PNMRA-PV resultou de um compromisso entre a fundamentação científica para assegurar a eficácia da Área Marinha Protegida e as preocupações e solicitações das diferentes partes interessadas. Saliente-se o cuidado que sempre houve com as associações de pescadores profissionais e lúdicos, patente na realização de reuniões complementares para aferir dos seus interesses e das possibilidades de minimizar eventuais impactos», acrescentam.

«Estes contactos, nomeadamente os promovidos em particular pelo CCMAR, mantiveram-se até hoje, com o estabelecimento de uma fórmula de compensação adaptativa aos pescadores, discutida e validada pelo setor da pesca em reuniões dedicadas (com a presença de várias associações de pescadores, incluindo a Quarpesca), e que inclui muito mais do que a atribuição de montantes em dinheiro, tal como propostas para melhorias nas lotas, melhores infraestruturas de apoio à pesca e remoção do lixo nos fundos marinhos», lê-se ainda.

Os promotores também recordam que «foram incluídas outras propostas, não diretamente relacionadas com a atividade pesqueira, mas que beneficiarão toda a região, tais como a criação de museus ou centros interpretativos fundamentais para a consciencialização da importância da proteção do nosso património natural para as gerações futuras».

Ainda assim, alegando a falta desses estudos, a própria Quarpesca diz que «avançou com um estudo de impacto económico através da auscultação às cerca de 50 embarcações» a ela associadas e que operam regularmente na zona da Pedra do Valado, «tendo chegado a valores muito próximos dos 3 milhões de euros anuais (a vida de muitas famílias está em causa)».

Os números são criticados pelo CCMAR e Fundação Oceano Azul por estarem «substancialmente inflacionados», uma vez que se baseiam «numa premissa incorreta».

«O valor de 3 milhões baseia-se na eventualidade das embarcações de Quarteira deixarem de pescar em toda a área do Parque. Este cenário não está, nem nunca esteve, previsto. Na maior parte da área do novo Parque Natural Marinho (>85%), a atividade de pesca será permitida, sobretudo para a pesca local artesanal, que representa a maior parte das embarcações da lista da Quarpesca (>60%)», lê-se no comunicado.

«O cálculo deste valor incluiu também embarcações de cerco costeiras com rendimentos superiores a 1,3 milhões de euros, e que vão poder continuar a sua faina na zona que normalmente utilizam para capturar as espécies de peixe pelágicas (por fora/ao largo da Pedra do Valado). Assim sendo, o valor de potenciais perdas deverá ser uma pequena percentagem do valor anunciado e estima-se que esteja em linha com os montantes previstos para a compensação dos pescadores desta associação, na sua adaptação às novas regras», acrescentam CCMAR e Oceano Azul.

Quanto às críticas de que não está discriminada a área que realmente fica imediatamente interdita à pesca, ambas as entidades explicam que «a proposta apresentada ao Governo, e discutida com todas as entidades, já contempla estas questões».

«Serão determinadas pelo Programa Especial, que, como previsto pela lei, será elaborado após a aprovação do Ato de Classificação, conforme divulgado na sessão de apresentação pública do Parque Marinho, promovida pelo Governo, a 5 de Junho, e à qual a Quarpesca foi convidada a participar e não compareceu».

Outra das acusações da Quarpesca é que a «preservação de uma área exclusiva para a pequena pesca entre as seis e as oito milhas, sem as embarcações que operam com a arte de arrasto», foi uma medida avançada, mas descartada.

«Esta situação não foi considerada no processo de criação do Parque Marinho, porque está muito para além dos limites propostos para a área, e como tal, nunca esteve enquadrada com os objetivos do mesmo, nem tendo, por isso, as associações de pescadores do arrasto sido convidadas, nem estado presentes», defendem os promotores.

 

Recifes Pedra do Valado – Foto: João Rodrigues

 

«Ou seja, a criação de uma reserva de pesca polivalente costeira, de grandes dimensões, excluindo o arrasto e outras atividades humanas, não esteve nos desígnios deste Parque Marinho. A extensão da área marinha para a zona mencionada poderia ser interessante a diversos níveis, mas, obrigaria à inclusão destes intervenientes em todo o processo, ou num novo, dedicado a esta questão. De salientar que, ainda assim, a proposta foi incluída no relatório das medidas de compensação efetuado pelo CCMAR, como medida a analisar, a pedido das associações de pescadores presentes nas reuniões bilaterais efetuadas na altura com o setor», acrescentam.

Quanto às medidas compensatórias, a Quarpesca considera que a fórmula encontrada pelo CCMAR foi «totalmente descabida e injusta».

Este centro de investigação não vê a situação pelo mesmo prisma.

«É importante clarificar que, em Portugal, não existe obrigatoriedade legal para a atribuição de fundos compensatórios no processo de criação de Áreas Marinhas Protegidas. Ainda assim, e numa ação inédita, o Governo comprometeu-se com o estabelecimento de mecanismos de compensação aos pescadores. Com base num conjunto de princípios de justiça, o CCMAR elaborou e propôs uma fórmula, em colaboração com todas as associações de pesca e a DGRM, que forneceram a informação necessária. O modelo de compensação financeira selecionado posteriormente pelo Governo baseia-se nesta fórmula que não foi contestada pelo setor em reuniões dedicadas (com a presença e participação de várias associações, incluindo a Quarpesca)».

«Efetivamente, a percentagem de afetação das embarcações à área protegida foi dada pelos dirigentes associativos, tendo as restantes ponderações sido feitas no sentido de valorizar as embarcações de pesca local (<9m), mais próximas do Parque Marinho e que, como tal, teriam mais dificuldades de se deslocarem para outros bancos de pesca», defende o CCMAR.

Neste comunicado conjunto, o CCMAR e a Fundação Oceano Azul também rebatem outras informações – dizendo que não são «verdadeiras» – como as relacionadas com as áreas das pradarias de ervas marinhas, que terão proteção, as restrições às atividades turísticas, que acontecerão, ou a falta de auscultação ao IPMA, mas que, explicam os promotores, «fez parte integrante do processo, tendo-o apoiado em todas as fases».

«As espécies novas descobertas para a ciência e para Portugal, na área do parque, revelam sobretudo que o lugar é singular em termos de complexidade e riqueza de habitats rochosos, e que essas zonas terão sido menos acessíveis à pesca, e aos estudos, que são muito mais recentes. A proteção dos ecossistemas marinhos e a pesca responsável e eficazmente gerida são realizadas mediante a aplicação de diversas medidas, incluindo ferramentas como as áreas marinhas protegidas, que são vulgarmente utilizadas nos países mais desenvolvidos do mundo e, com a ajuda de todos, serão cada vez mais uma realidade em Portugal e, em particular, no Algarve», conclui.

 

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