Algarve Tech Hub Summit: O universo das pequenas plataformas starting up e made in

Este é, também, o tempo de imaginar e reinventar a sociedade solidária e colaborativa num triângulo virtuoso

Entre 28 de março e 3 de abril, decorre no Algarve a 1ª edição da Algarve Tech Hub Summit. A este propósito, vamos fazer uma curta visita ao universo das pequenas plataformas starting up e made in, aquelas que tiram partido da engenharia das redes digitais bem distribuídas e que são fundamentais para a arquitetura e o design de uma verdadeira política de desenvolvimento local e regional.

Não me refiro às grandes plataformas tecnológicas globais, mas, antes, mais modestamente, às muitas soluções imaginativas que os atores locais e regionais desenham para a interligação dos seus territórios e respetivas economias de proximidade.

Na nova sociedade da informação, da inteligência, da internet, da imaginação, da invenção e inovação, dos bens intangíveis e imateriais, assistiremos a uma troca permanente entre a velha economia dos produtos industriais e materiais e a nova (i)conomia dos serviços imateriais, numa troca constante entre produto e serviço e entre propriedade e acesso e na qual a (i)conomia acrescentará cada vez mais valor à economia material convencional que se reduzirá do mesmo passo.

Face a este novo ecossistema da era digital, é toda a estrutura empresarial que terá de se adaptar, pois os produtos viram serviços, os desperdícios viram matéria-prima, os ciclos de vida ficam mais curtos, a miniaturização faz o seu caminho, os stocks são reduzidos, a logística é redesenhada, o espaço disponível é também reduzido, o leasing e o outsourcing de algumas funções serão práticas correntes.

É assim que os novos modelos de negócio empresariais e o movimento starting up, mas, também, o movimento made in muito associado à administração local, às instituições de solidariedade social e às atividades culturais e criativas exprimem, cada vez mais, esta mutação fundamental, onde as plataformas tecnológicas desempenham o papel principal pois são a placa giratória de todos os interesses em presença.

 

A economia das plataformas, das redes e das aplicações multilocais

Uma das imagens de marca desta longa transição paradigmática do capitalismo informacional é aquilo que pode ser designado como o universo das plataformas starting up e made in, isto é, a nova economia das redes e aplicações multilocais. O princípio geral da economia das redes e apps é simples de enunciar: na sociedade da informação e do conhecimento, a internet, as plataformas tecnológicas e as redes sociais colaborativas criam as condições favoráveis à formação de comunidades online de utilizadores e fornecedores/prestadores de bens e serviços.

Estas comunidades virtuais online comunicam entre si por meio da internet móvel e interagem através de programas ou aplicações informáticas (apps) com mais ou menos funcionalidades e interatividade.

Sabendo nós que estas comunidades virtuais de utilizadores e prestadores podem cobrir um leque muito variado de atividades económicas, sociais e culturais e que uma jovem empresa tecnológica, uma start up, pode criar a plataforma certa para essa comunidade em modo de autogestão e auto regulação, fica a curiosidade em saber até onde pode ir o movimento multilocal das redes e aplicações starting up e made in, não apenas na modernização do capitalismo mais convencional, em especial, as PME, mas, também, na modernização das funções do Estado-administração, na mutualização de serviços comuns para os municípios e, ainda, numa nova geração de empresas sociais, recreativas e culturais inspiradas no mesmo espírito colaborativo, comunitário e solidário.

Dito de outro modo, temos agora uma excelente oportunidade para refrescar um certo capitalismo popular de pequenas plataformas ao serviço das coletividades municipais, das economias de proximidade, das instituições de solidariedade social, do movimento cooperativo e mutualista, das atividades culturais e criativas, do movimento associativo empresarial, do movimento colaborativo propriamente dito e de inúmeras funções públicas do estado-administração que, em vez de serem serviços públicos, passam a ser serviços ao público em múltiplas formas de parceria e coprodução.

 

As condições de partida do movimento starting up e made in

Dito assim, tudo parece muito simples. Pura ilusão. Precisamos de uma política de desenvolvimento regional com objetivos claros, metas e incentivos apropriados, de um polo de inovação regional para aplicar a agenda digital respetiva, de uma escola de artes e tecnologias conectada com a associação regional de jovens empresários para levar a bom porto a sucessão geracional empresarial e, por último, de um incumbente acreditado para executar de modo eficiente e em tempo útil esta política para o seu território ou região.

Uma das questões mais interessantes desta mutação fundamental diz respeito ao grau de adesão da velha economia corporativa empresarial à nova economia das plataformas e redes digitais, de tal modo que possamos dizer, sem qualquer dúvida, que a economia regional foi bem-sucedida na apropriação que fez da transição tecnológica e digital. Não creio, porém, que o possamos afirmar tão categoricamente.

Sabemos bem, dada a extrema fragilidade do movimento na sua fase inicial de lançamento, que a criação de start up tecnológicas e sociais precisa de uma rampa de lançamento robusta na fase de arranque.

Essa rampa de lançamento poderia ser assegurada pelo estado-plataforma por via da criação de polos de inovação regional dirigidos às suas próprias start up internas à função pública, mas, também, por via da intermediação institucional e associativa em sentido largo, por intermédio de um programa de transformação digital abrangente onde entram, também, os centros de investigação das universidades e os laboratórios colaborativos de consórcios formados com esse específico propósito.

Esta colaboração entre o serviço público e os serviços ao público poderia proporcionar múltiplas formas de inteligência coletiva de baixo custo e um campo imenso para a criação do que poderíamos designar como um capitalismo popular de pequenas plataformas que, de resto, nós já experimentamos hoje em várias áreas de atividade.

Dou, apenas, alguns exemplos de plataformas de proximidade: o condomínio de aldeias, o alojamento local e rural, a produção biológica e respetivos circuitos, a produção e gestão do institutional food, a economia circular e a gestão de resíduos, os cuidados ambulatórios e serviços de proximidade, a produção local de energia, os mercados de ocasião, o cohousing para a comunidade sénior, as comunidades terapêuticas, a mobilidade partilhada, a organização do trabalho voluntário, os serviços de extensão agro rural, os serviços de reparações, etc.

No final, porém, o que fica por saber é se estas comunidades virtuais de baixo custo têm tradução concreta, prática e efetiva em comunidades reais das respetivas coletividades locais ou se, pelo contrário, entram em rota de colisão com os interesses económicos já instalados, podendo ser, no limite, capturados pelas grandes plataformas tecnológicas que, diga-se, desde já, não parece morrer de amores pela concorrência do capitalismo das redes colaborativas de inspiração mais comunitária.

O exemplo da UBER, na área do transporte de passageiros, é apenas um exemplo desta nova fase do capitalismo, em que o velho modelo da (e)conomia corporativa colide com o modelo novo da (i)conomia colaborativa.

 

Notas Finais

Sociedade em rede, economia do conhecimento, plataformas digitais colaborativas, comunidades locais inteligentes, economias de proximidade, inovação e criatividade em novas cadeias de valor e respetiva articulação territorial, eis uma missão grandiosa, mas que está, doravante, ao nosso alcance. Quatro tarefas são necessárias:

Em primeiro lugar, é preciso reforçar o movimento starting up com uma sólida cultura científica e uma ética do bem comum para não cair na tentação do “Portugal fashion e do happening turístico”.

Em segundo lugar, estou convencido de que o estado-plataforma (polo de inovação regional) e as instituições públicas e associativas serão o ecossistema preferencial e o principal parceiro do movimento starting up e made in na sua fase inicial de lançamento e consolidação.

Em terceiro lugar, o desenho da metaplataforma analítica multilocal (centro de dados) que faz girar todo aquele universo interativo, assim como, o desenho da malha arterial e capilar das economias de rede e aglomeração que articulam todas as áreas e atividades referidas no plano regional.

Em quarto lugar, a organização do mercado de trabalho, em especial, em direção aquilo que será o setor quaternário, de emprego e trabalho mais intermitente, mas, por isso mesmo, muito mais interativo, intenso e colaborativo. É justamente aqui que estão localizadas e serão mais úteis as plataformas multilocais made in.

Por último, este é, também, o tempo de imaginar e reinventar a sociedade solidária e colaborativa num triângulo virtuoso que juntará a economia dos bens públicos, a economia dos bens privados e a economia dos bens comuns.

Neste contexto, as economias de proximidade serão um novo lugar central e, na sua essência, um investimento em mais e melhor humanidade, em mais e melhor vizinhança, tirando partido das tecnologias disponíveis.

Esta lista de plataformas multilocais made in é, em si mesma, muito eloquente, pois revela-nos a complexidade da tarefa que temos pela frente, desde logo uma alteração substancial dos valores que nos inspiram e orientam, depois uma alteração da equação que nos liga ao território e à tecnologia, finalmente, a grande transformação em direção à sociedade colaborativa e a economia dos bens comuns.

É uma grande tarefa, mas é a única que vale a pena empreender.

 

 

 



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