Barragens do Algarve só têm água até ao final deste ano. E agora?

Situação das barragens da Bravura, Odeleite, Beliche e Arade é preocupante

Barragem do Beliche – Foto: Flávio Costa|Sul Informação

As barragens do Algarve só têm água disponível até ao fim do ano, caso não chova, de forma significativa, até lá, revelou a Comissão Permanente de Acompanhamento da Seca no seu mais recente relatório.

Segundo este grupo de trabalho, «pode afirmar-se que, no final de Junho de 2020, a situação em termos de disponibilidades de água superficial nas origens de água do Sistema Multimunicipal de Abastecimento de Água e Saneamento do Algarve (SMAASA), associadas às medidas e estratégias de gestão implementadas, permitem apenas assegurar os consumos estimados durante o ano civil de 2020».

«Tendo em consideração o balanço em termos de disponibilidade de água, face às necessidades de captação nestas origens pelos seus principais utilizadores (abastecimento público, agricultura e turismo), verificou-se também que, no final de Junho de 2020, estavam apenas assegurados os volumes necessários captar no presente ano civil», lê-se no mesmo documento, datado de 30 de Junho.

Ou seja, o Algarve enfrenta uma situação preocupante, como não enfrentava há, pelo menos, uma década, desde que entrou em funcionamento a Barragem de Odelouca, que é agora o principal e maior reservatório de águas superficiais da região algarvia.

Afinal, não é foi só o atual ano civil que foi marcado pela pouca chuva. O relatório aponta a «ausência de anos húmidos após 2000 e aumento de anos hidrológicos consecutivos com precipitação muito abaixo da média».

«Da análise dos volumes armazenados nas albufeiras, é possível verificar que, nos últimos oito anos hidrológicos, nunca foi atingida a capacidade máxima de armazenamento das principais reservas superficiais da região do Algarve, designadamente as albufeiras da Bravura, Odelouca, Funcho, Arade, Beliche e Odeleite», acrescenta.

 

Barragem da Bravura quase seca, no fim de semana passado – foto: © João Mariano | The Understands – Aljezur BTT Team

 

Desta forma, «na Albufeira da Bravura, a situação é preocupante, dado que os episódios de precipitação registados em Abril e Maio pouco contribuíram para a recuperação de volumes, que permaneceram muito baixos face aos valores médios».

Nas barragens do Beliche e de Odeleite, no Sotavento Algarvio, e na do Arade, no Barlavento, a situação não é mais animadora.

Segundo o mais recente boletim das disponibilidades hídricas a nível nacional da Agência Portuguesa do Ambiente, datado de 31 de Agosto, estas quatro barragens do Algarve estão no grupo das albufeiras que apresentam volumes totais inferiores a 40%.

Na Bravura, o volume total de água armazenada era, há dois dias, de apenas 18,3%. O Beliche está a 26% da sua capacidade total, Odeleite a 33% e Arade a 34%.

Se estes são já valores muito baixos, há que ter em conta que se referem à capacidade total, e não à capacidade útil, aquela que se pode, efetivamente, usar, que é bem mais reduzida.

Segundo os dados da Águas do Algarve, a 21 de Agosto o volume útil da barragem de Odelouca era de 42,4% (total 53%), o da Barragem de Odeleite era de 22,6% (total 35,25%) e o do Beliche era 19,6 (total 28,2%).

No final de Agosto, Odelouca mantinha-se a cerca de 53% da sua capacidade total e a do Funcho estava a 55%.

 

Barragem do Odeleite – Foto: Flávio Costa|Sul Informação

 

Contactada pelo Sul Informação, a empresa Águas do Algarve, através da sua porta-voz Teresa Fernandes, admitiu que os níveis de água nas barragens do Algarve «estão muito abaixo daquilo que seria desejável».

No entanto, aquela responsável não quis comentar a avaliação feita pela Comissão de Acompanhamento da Seca, remetendo esclarecimentos para a Agência Portuguesa do Ambiente, que está a coordenar a execução do Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve, a futura bíblia do uso eficiente de água, na região.

O nosso jornal colocou à APA, atempadamente, várias questões  específicas sobre a falta de água no Algarve, mas não recebeu nenhuma resposta concreta, a não ser o boletim de disponibilidades hídricas, o documento público e que foi divulgado a nível nacional.

O único feedback recebido foi da delegação regional, nomeadamente do seu diretor. Da direção nacional da APA, que terá chamado a si tudo o que se relaciona com a seca e a falta de água, nomeadamente do departamento de comunicação, não houve qualquer resposta ao Sul Informação, quer às perguntas colocadas há cerca de duas semanas, quer às que foram colocadas há quatro meses, sobre o mesmo assunto.

 

Foto: Flávio Costa|Sul Informação

 

Com os alarmes a soar, a comissão, no seu relatório, aponta algumas «medidas extraordinárias de curto prazo, a implementar em cenário de prolongamento de seca no ano hidrológico de 2019-2020».

Desde logo, a restrição de captação de água para todos os fins que não sejam o abastecimento público de água, «salvaguardando, de forma inequívoca, o princípio fundamental da prioridade à captação de água para abastecimento público face aos demais usos».

Isto implicará o estabelecimento de uma cota mínima de captação de água para outros fins (nomeadamente agricultura), que «deverá ser definida de forma a que sejam assegurados os necessários volumes a captar neste Empreendimento Hidráulico de Fins Múltiplos, para suprir as necessidades do Abastecimento Público (e perdas por evaporação), durante o ano de 2020».

O relatório também aponta para a necessidade de «avaliação de operacionalidade/qualidade das captações subterrâneas públicas estratégicas identificadas no âmbito do Plano de Contingência do SMAASA, para eventual reforço, no curto prazo, das origens de água para o abastecimento público no Algarve», bem como a realização de «estudos e soluções técnicas, de médio prazo, no âmbito das medidas do Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve».

Isto serão meros paliativos já que parece ser consensual que o problema é estrutural e que necessita de uma estratégia de médio/longo prazo. Já o caminho a seguir, não merece a mesma concórdia.

«Só há uma forma de resolver a falta de água: é poupando água. Não há outra forma. A política estrutural é ser mais eficiente e poupar água. Porque transformar duas barragens vazias em três barragens vazias, não resolve nenhum problema», defendeu na semana passada, em declarações ao Sul Informação, João Matos Fernandes, o ministro do Ambiente.

 

Barragem do Beliche – Foto: Flávio Costa|Sul Informação

 

A referência específica de Matos Fernandes às novas barragens – da Foupana e de Monchique – cuja construção os presidentes das Câmaras do Algarve defendem acaba por ser um aviso à navegação, de que o Governo não está disposto a ceder, nesta matéria.

Ainda assim, «há aqui uma componente de novas infraestruturas para podermos ter uma maior capacidade interanual no que ao uso da água diz respeito», admitiu o ministro do Ambiente, nas suas declarações ao nosso jornal.

Apesar do membro do Governo não ter falado de nenhum projeto em concreto, já se sabe que um deles – e um dos que reúne mais consenso – é a criação de uma ligação entre o Pomarão e Odeleite, que permita o transvase de água do Guadiana para esta albufeira situada no concelho de Castro Marim.

As restantes potenciais soluções constam do Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve, que, segundo o ministro do Ambiente, foi construído com várias entidades e será «discutido ainda durante o mês de Setembro», salientando que houve «um atraso devido à Covid-19».

 

Foto: Flávio Costa|Sul Informação

 

Também ao Sul Informação, Pedro Coelho, diretor regional da APA do Algarve revelou que o plano «será apresentado em meados de Setembro», estando a ser ultimados os preparativos para a sessão, organizada não só pelo Ministério do Ambiente, mas também pelo da Agricultura.

 

 

Fotos: Flávio Costa|Sul Informação

 

 

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