Higiene significa progresso económico?

Em tempo de pandemia, as medidas de higiene são um fator de desenvolvimento económico

Somos diariamente bombardeados, seja no supermercado ou na TV, com a importância de lavar as mãos e higienizar as mesmas, assim como de utilizar máscara de proteção, como medidas de prevenção à propagação da afamada Covid-19.

Em tempos mais distantes, já a Peste Bubónica, conhecida também por Peste Negra, condicionou o quotidiano dos habitantes do continente europeu e deu, igualmente, origem à utilização de máscaras da peste negra, comummente utilizadas pelos médicos.

Foi também em Itália, mais concretamente em Veneza, que foi forjado o termo “Quarantena”, significando 40 dias, que era nada mais que o tempo que os navios que chegavam ao porto tinham de permanecer em isolamento antes de atracar. Este termo deu origem à atual palavra “Quarentena”, que espelha a necessidade de isolamento.

Durante os tempos da Idade Média, apenas a classe rica tinha acesso a condições que permitiam algum nível de higiene, embora escasso para os padrões atuais. A higiene da restante população era praticamente nula. Hábitos como assoar o nariz com a mão, por maior repúdio que possamos agora sentir, era prática comum naqueles tempos.

Foi, no entanto, com o desenvolvimento da industrialização que as grandes cidades tiveram de tomar medidas de saúde pública. Dado o seu elevado crescimento e concentração da população, com poucas ou nenhumas práticas de higienização, conjugado pela crescente poluição do ar pelas fábricas, e pela drenagem de esgotos em rios e outros corpos de água, os quais eram utilizados para as populações se hidratarem, levou a que fosse constante haver surtos de epidemias de doenças veiculadas pela água, como a cólera por exemplo.

Foram estas as circunstâncias que ditaram uma mudança de paradigma e levaram os governos a tomar medidas de saúde pública, de maneira a contrariar as elevadas taxas de mortalidade, que impunham maior entrave ao capitalismo do que a doutrina socialista.

A mortalidade tornou-se o “gargalo” do crescimento económico. Tal levou as elites a pressionarem para que fossem tomadas medidas. Contudo não foi tarefa fácil visto o conhecimento científico ao nível microbiológico ser diminuto.

Os governos começaram a tomar medidas de saúde pública, passando inicialmente por limpar as cidades: remoção de resíduos, limpeza das ruas, providenciar água limpa e ligações de esgotos. Foi um processo lento, mas que deu frutos sendo o resultado evidente: as taxas de mortalidade diminuíram enormemente.

Consequentemente, o foco mudou. A higiene pública e a forte mortalidade das cidades deixaram de ser o gargalo do crescimento económico.

Seguidamente, nas economias industriais, aumentou a procura por trabalhadores qualificados. As famílias começaram a investir na educação. O crescente progresso tecnológico e o aumento da escolaridade levaram ao aumento dos rendimentos.

Assim, o desenvolvimento económico propiciou a evolução do conhecimento do mundo bacteriológico e no final do século XIX já havia sido identificada a maioria dos micro-organismos responsáveis por grande parte das doenças infetocontagiosas.

Agora, uma vez mais, a higiene significa progresso económico e é tido que os países ricos são os mais higiénicos e, por conseguinte, mais seguros para viajar.

O nosso Algarve do século XXI está a ser fustigado por uma das maiores crises sanitárias que o continente tem memória. Esta condição sanitária introduz uma variável temível: o medo do contágio. O que colocou a economia regional em forte recessão, não fosse a sua forte dependência do turismo que por sua vez depende da circulação de pessoas.

Esta dependência, cimentada pelos 1,2 mil milhões de euros de proveitos em 2019, levou a que o Turismo de Portugal fosse obrigado a repensar uma forma de como transmitir confiança aos mercados e concomitantemente refletir uma aplicação rigorosa de um protocolo de higiene e segurança nas empresas da região (e do país).

Mais uma vez, nos tempos modernos, o crescimento económico foi travado por uma crise de saúde pública. A necessidade ativou o engenho e foi delineada a imperatividade da existência dum protocolo de higiene e segurança, que deve ser adaptado à realidade de cada empresa, de maneira a garantir um ambiente limpo e saudável.

Às empresas que cumpram os requisitos do protocolo de higiene é atribuído um selo de garantia “Clean & Safe”. Na verdade, este conjunto de medidas, não passa de uma forma de colmatar o gargalo causado pela crise sanitária, e criar condições para o progresso económico da região.

É certo que a elevada dependência do turismo é prejudicial e que é imperativo diversificar. Contudo no curto prazo não é possível cumprir tal desiderato. É necessário criar medidas que liguem os motores da nossa economia para que o crescimento económico aconteça. De futuro espera-se que esse crescimento se traduza em desenvolvimento, e uma economia diversificada floresça.

 

Autor: Luís da Ponte é licenciado em Gestão de Empresas e Pós-Graduado em Finanças Empresariais pela Universidade do Algarve. É também licenciado em Administração Pública pela Universidade do Minho.
Foi vice-presidente do Departamento Financeiro da AIESEC da FE UAlg e também vice-presidente do Centro de Estudos em Administração Pública da Universidade do Minho.
É membro efetivo da Ordem dos Economistas e, profissionalmente, é sócio-gerente da TSE Industrial Lda e proprietário da agência VDP Seguros.

 

Nota: artigo publicado ao abrigo do protocolo entre o Sul Informação e a Delegação do Algarve da Ordem dos Economistas

 

 



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