Erasmus no Algarve: Portugueses são chico-espertos e sem iniciativa

A amostra é mais do que variada: ao todo são quase 400 por ano – de diversas nacionalidades – só […]

A amostra é mais do que variada: ao todo são quase 400 por ano – de diversas nacionalidades – só na Universidade do Algarve. Mas há muito mais a uni-los do que a separá-los. Exemplos? Bem, vir estudar para Faro é quase sempre um recurso – e quase nunca uma primeira opção para estes estudantes de Erasmus.

Javid Jalilzadeh Rahmati, iraniano de 29 anos, é um desses casos. Um amigo falou-lhe da possibilidade de vir estudar para a Europa. Sendo do Irão, as suas possibilidades de viajar e ter contacto com a União Europeia são diminutas. Entusiasmou-se. Quis ir estudar para um dos países nórdicos; acabou em Portugal.

“Preenchi os formulários de candidaturas – half, half [ndr: metade, metade] porque na altura não falava uma única palavra palavra de inglês e até a minha própria língua só falava mais ou menos… [ndr: graceja] – e escolhi o Royal College da Noruega. Mas eles… mandaram-me para Portugal”, diz Javid, que já está em Portugal desde 2009 no âmbito do programa Erasmus Mundus.

Anna Zaretskaya, russa de 24 anos, é de Moscovo, uma cidade com uma população maior do que Portugal: cerca de 11 milhões de pessoas (!). Entretanto, viveu em França, onde começou o seu Mestrado, também no âmbito do programa Erasmus Mundus. A primeira impressão que teve quando chegou a Faro, pela primeira vez, para procurar alojamento, não foi (só) má: foi de choque. “Quando cheguei ao aeroporto e vi a cidade, pequeníssima, a primeira coisa que pensei foi: o que raio vou eu fazer durante um ano inteiro?”. As suas escolhas para estudar, explica Anna, não passavam por Portugal – muito menos por Faro. “Eu queria ir para França – onde estive – e Inglaterra, porque já falava inglês e francês… Mas aparentemente toda a gente teve precisamente a mesma ideia de ir para Inglaterra e a minha única possibilidade era mesmo Faro. Senti-me miserável quando soube que tinha de vir para Faro. Conferi na Wikipedia e pensei: 40 mil pessoas [ndr: número de habitantes da cidade de Faro]? A sério?”, conta.

Javid, um iraniano em Faro

Por outro lado, houve quem visse em Portugal virtudes – ou, pelo menos, uma opção não tão má. “Eu queria estudar num país que tivesse água, mar ou rio, e um clima agradável. Pensei em ir para Espanha mas como a minha universidade tinha uma cooperação com a Universidade do Algarve… Bem, acabei aqui”, recorda Marita Papagianni, grega de Salónica.

Para a estudante de 22 anos, no entanto, a exclusão de partes acabou por não ser uma desvantagem: tendo em conta que a sua área de estudos é Ciências Florestais e Naturais [departamento de Arquitetura Paisagista na Universidade doAlgarve (UAlg)], tem na região um objeto de estudo interessantíssimo. “O Algarve tem uma flora autóctone muito diversificada e muito rara, algumas das espécies só podem mesmo ser encontradas no Algarve. Infelizmente, a UAlg não está muito avançada em matéria de investigação nesta área e penso que a própria população desconhece estes factos”, diz Marita.

Exclusão de partes foi também a fórmula utilizada por Stijn de Munch, belga de 22 anos, para escolher um local no estrangeiro para fazer o seu programa Erasmus. A história é simples: Stijn é um apreciador dos países do Sul e as hipóteses para fazer o seu Erasmus fora da Bélgica resumiam-se a Faro, em Portugal, e a países nórdicos. A escolha, revelou-se, portanto, fácil. “Por outro lado, porque não?” – perguntou-se Stijn. “Afinal, é também um país da Europa – que até nunca tinha visitado…”.

Faro? Primeiro estranha-se, depois…

Marita Papagianni

Com mais ou menos vontade, uma vez aterrados no Algarve, não há grande volta a dar. Mas o resultado, ao fim de contas, acaba por não ser… como – por vezes – esperado. Depois de quase um ano em Faro e a semanas da partida de Portugal para outras paragens, Anna Zaretskaya diz hoje que o “inimaginável” lhe aconteceu: do choque que sentiu ao chegar a uma minúscula cidade – principalmente se comparada com Moscovo – às já mais do que previsíveis saudades da cidade de Faro foi um salto.

“Conheci gente interessante (principalmente estrangeiros, devo dizer), e durante este ano nunca me aborreci. Não gostaria de viver em Faro a minha vida toda, mas um ano aqui é muito bom. Sinto que estive quase um ano de férias, porque o clima é tão bom e ninguém tem pressa para chegar a lado nenhum…”, diz, já nostálgica, Anna Zaretskaya.

No mesmo tom alinha o iraniano Javid, também quase a terminar o seu mestrado ao abrigo do programa Erasmus Mundus. “Quando cheguei aqui não tinha nenhuma ideia sobre este país. Gostava do Luís Figo – e era só. Mas gosto muito de Portugal – e no Algarve sinto-me como em casa. Tu, por exemplo, és como o meu vizinho em Teerão…”, comenta, bem-disposto.

Futuro? “Olha, não sei, Portugal é o meu país agora. Quando estou em Faro nunca tenho saudades de casa – mas quando, pelo contrário, estou a viajar na Europa, tenho sempre saudades de casa. Adapto-me a qualquer ambiente. Vou para onde arranjar emprego…”, diz Javid.

Anna Zaretskaya

Vinda de um país mediterrânico, a grega Marita Papagianni estava confiante. Pensava que sabia ao que vinha. Puro engano. “O clima é muito semelhante com o grego, mas há muitas diferenças na mentalidade das pessoas. Enfim, sinto-me em casa mas talvez não pelo contacto com portugueses”, diz Marita.

Já a cidade de Faro tem, diz a estudante grega, um certo encanto. “Acima de tudo, há uma atmosfera na cidade de que gosto. Para mim, é uma cidade bonita. Lembra-me de alguma maneira o tempo antigo, mas também está de alguma maneira virada para o futuro. E há muito potencial para explorar, nomeadamente para atrair a juventude”, diz a grega.

Stijn, belga de 22 anos a estudar Ensino Básico na Ualg através do programa Erasmus, «veio» à procura da Europa que havia em Portugal. Encontrou, acima de tudo, a portugalidade: “Gosto de viver em Faro, no Algarve, em Portugal. O clima é excelente e, acima de tudo, as pessoas sabem aproveitar a vida. Há uma certa maneira portuguesa de viver que se distingue muito dos países nórdicos”.

 

Como é que são os portugueses (ou algarvios) vistos pelos Erasmus?

A pergunta começa por provocar um desconforto inicial. Afinal, o repórter é português. “Não sei se devo dizer…”, começa um(a) dos(as) entrevistados(as). Mas pouca insistência depois, a resposta sai. Começando pela parte positiva, naturalmente: “Sinceramente, gosto de Portugal e dos portugueses – as pessoas são completamente relaxadas”, diz Stijn. As pessoas parecem pura e simplesmente não querer causar problemas uns aos outros”, concorda Anna, revelando que “as pessoas se respeitam muito mais do que na Rússia ou em França”.

O iraniano Javid diz que se sente como em casa. “As pessoas que vejo na rua, à minha volta, não são maldosas… sei que posso confiar nelas”. Por outro lado, o iran

Stijn de Munch, da Bélgica

iano, que já vive em Portugal há três anos, reconhece no português “falta de iniciativa, de cooperação” e alguma propensão para o «chico-espertismo». “De alguma forma, os portugueses têm uma certa tendência para tentar contornar a lei. Se há alguma coisa a que se possa escapar…”, sugere.

Aqui chegados, Marita não podia concordar mais. “Há muitas diferenças entre gregos e portugueses. Para mim, os portugueses são metidos consigo próprios, introvertidos. Isso faz com que – mesmo que alguma coisa esteja mal – cada um apenas queira saber da sua vida em vez de tentar mudar as coisas de facto. Parece que – por falta de confiança ou para não se comprometerem -os portugueses preferem não partilhar as suas opiniões. Pura e simplesmente, tratam da sua vida…”, conta, desiludida.

E como a mudança também se faz pelo exemplo – ainda que negativo –, Marita já sabe o que vai mudar na sua vida. “Quando chegar à Grécia, vou ser ainda mais ativa na minha comunidade. Se alguma coisa está mal, tem que ser mudada!”. A Grécia indica o caminho.

 

 

 

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