Biografia de Manuel Teixeira Gomes desvenda um «homem fascinante» e o seu tempo

Oito anos de trabalho de investigação, histórias e facetas pouco conhecidas, 632 páginas, 1700 notas de rodapé, bibliografia «extensíssima», árvore […]

Manuel Teixeira GomesOito anos de trabalho de investigação, histórias e facetas pouco conhecidas, 632 páginas, 1700 notas de rodapé, bibliografia «extensíssima», árvore genealógica, cronologia. Esta é uma breve descrição do livro «Biografia – Manuel Teixeira Gomes», da autoria do também portimonense José Alberto Quaresma, que amanhã, dia 18 de Outubro, às 18h30, será lançado, numa sessão no Antigo Picadeiro Real (Museu Nacional dos Coches), em Lisboa, numa edição do Museu da Presidência da República e da Imprensa Nacional-Casa da Moeda.

A data do lançamento foi escolhida de propósito, já que amanhã se assinala os 75 anos da morte de Manuel Teixeira Gomes, que foi, como se pode ler na capa do livro, «boémio, negociante, melómano, viajante, escritor, diplomata e Presidente da República».

A apresentação da obra estará a cargo de três pessoas, o poeta Nuno Júdice, Nuno Severiano Teixeira e António Valdemar, «cada uma deles trabalhando diferentes aspetos de Teixeira Gomes que são abordados no livro», explicou o autor, José Alberto Quaresma, em entrevista ao Sul Informação.

Mas a sessão contará ainda com um pequeno concerto do violoncelista Paulo Gaio Lima, que interpretará a «Suite nº1 para Violoncelo», de Bach, que poderá ter sido uma das obras musicais preferidas de Teixeira Gomes. Mas não é essa a única ligação ao antigo chefe de Estado nascido em Portimão: é que Paulo Gaio Lima «já tocou muitas vezes com o violoncelo de Guilhermina Suggia, que Teixeira Gomes ouvia em Londres e que foi até tocar ao Palácio de Belém, quando ele era Presidente da República».

Portimão «vai acompanhando toda a biografia, quase como se fosse uma personagem secundária»

E porque o que se pretende fazer amanhã é uma verdadeira celebração, o lançamento da biografia inclui ainda a exibição de um excerto do filme de longa metragem «Zeus», de Paulo Filipe Monteiro, ainda inédito, «sobre o período da vida de Manuel Teixeira Gomes desde a sua renúncia ao cargo de Presidente da República até à sua morte no exílio, na Argélia».

Haverá também leituras de excertos de obras literárias de Manuel Teixeira Gomes por Silvina Pereira (atriz e encenadora) e Jorge Vaz de Carvalho (barítono).

Mas o que é esta biografia de Manuel Teixeira Gomes, um homem do mundo, que, em 1925, pressentindo já a ditadura que se aproximava e cansado da política portuguesa, renunciou ao mais alto cargo da República e se exilou, de forma voluntária, numa cidadezinha da costa da Argélia?

O livro, explica o seu autor José Alberto Quaresma, «é quase um diálogo entre mim e o Teixeira Gomes», sendo de algum modo «inovador em termos de biografia», uma vez que é «escrito no tempo presente».

Dividido em sete partes, o livro «começa no início do século XIX, com a prisão do avô de Teixeira Gomes, que era liberalista e acabou por morrer na cadeia como preso político, descreve um enorme arco temporal, que vai até 1950, com o regresso dos restos mortais a Portimão». Aliás, a cidade natal do estadista e escritor «vai acompanhando toda a biografia, quase como se fosse uma personagem secundária» da história que aqui se conta.

José Alberto Quaresma
José Alberto Quaresma, o biógrafo

Para escrever esta biografia que aborda todos os aspetos, mesmo os mais desconhecidos, da vida do estadista e escritor, José Alberto Quaresma, ele próprio poeta e professor, vasculhou durante anos o espólio de Teixeira Gomes na Biblioteca Nacional («50 caixas com milhares de documentos»), bem como o espólio do Museu da Presidência, da Fundação Mário Soares, do Ministério dos Negócios Estrangeiros, do Museu de Portimão e do Arquivo Distrital de Faro.

«Fui à vida pessoal dele, à vida íntima da correspondência com a Belmira, a mãe das suas filhas, e à sua correspondência com as próprias filhas», sublinha Quaresma. E o autor salienta uma contradição que salta à vista depois de analisar essas cartas: «ele era um homem de esquerda, muito voltado para a emancipação das mulheres, mas depois há uma grande contradição nos conselhos que dava às filhas, muito conservadores».

Mas não é só em relação à vida pessoal de Manuel Teixeira Gomes que esta biografia traz novidades. «O historiador deve ser voraz no sentido de procurar conhecer a realidade nas suas variadas facetas, não só a das biografias oficiais e oficiosas», explica José Alberto Quaresma. Daí que «haja muita coisa que não se sabia e que está aqui no livro».

«Procurei que o meu trabalho fosse muito eclético, não quis dar mais importância a um aspeto ou a outro, mas mostrar Manuel Teixeira Gomes nas suas diversas facetas, da sua vida pessoal, de negociante que correu o mundo, da sua obra literária, da vida diplomática, da presidência», acrescenta o autor.

José A. Quaresma: «A minha preocupação não foi escrever para os académicos, mas para o grande público»

Por outro lado, José Alberto Quaresma garante que a sua «preocupação não foi escrever para os académicos, mas para o grande público, para a pessoa que tem curiosidade de saber quem era aquele homem na sua época».

E o livro dá também destaque ao pensamento do antigo estadista. O autor desta que é a biografia mais completa já escrita sobre Manuel Teixeira Gomes salienta que «muitas das coisas que ele dizia têm uma atualidade brutal, nomeadamente sobre os políticos». E foi isso que Quaresma procurou também trazer para esta biografia, que não se limita a contar a história de uma vida – até aventurosa -, mas revela as diversas facetas deste homem «fascinante».

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Manuel Teixeira Gomes, o biografado

«Tentei trazer para a atualidade o Manuel Teixeira Gomes, mas também ligando-o ao que ainda hoje se faz à volta da sua obra, que foi importantíssima, embora esteja muito esquecida a nível nacional».

«Na atualidade, a obra de Manuel Teixeira Gomes e a sua personalidade continuam a suscitar enorme interesse artístico». A este propósito, José Alberto Quaresma recorda a composição «Gente Singular», feita, a partir de uma das obras do escritor, pelo malogrado compositor Bernardo Sassetti. A obra foi estreada em Portimão em 2010, aquando das comemorações dos 150 anos do nascimento de Teixeira Gomes (das quais Quaresma foi o comissário), interpretada por uma orquestra dirigida precisamente por Vasco Pearce de Azevedo, bisneto do escritor.

Mas também Eurico Carrapatoso escreveu, na mesma altura, a ópera «Sabina Freire», a partir de outra obra de Teixeira Gomes, «que ainda não foi encenada, nem estreada».

«Ferreira de Castro, Jorge de Sena, David Mourão Ferreira, Urbano Tavares Rodrigues, entre outros, que então eram jovens, tinham grande admiração por Teixeira Gomes, que era amigo de Viana da Motta ou de Columbano». Ele era «uma pessoa muito admirada e essa admiração vem até tarde. Em 1950, quando os seus restos mortais regressam a Portimão, na homenagem que foi feita, estiveram Alves Redol, Mário Soares, Salgado Zenha».

Manuel Teixeira Gomes «é uma enorme figura, pela qualidade da obra dele e pela sua personalidade muito interessante», assegura José Alberto Quaresma.

Como se escreve na contracapa do livro que amanhã será lançado em Lisboa, «nesta biografia não se trata apenas do retrato de um homem fascinante, mas do retrato de um país e do seu tempo. Aliando o rigor irrepreensível de um historiador às qualidades narrativas de um romancista, José Alberto Quaresma, o biógrafo, chama à liça Manuel Teixeira Gomes, o biografado, e juntos contam-nos uma história – pessoal e coletiva – que, por vezes, nos comove, por vezes nos diverte e, quase sempre, nos interpela».

O livro será depois apresentado em Portimão, terra natal de biografado e biógrafo, muito provavelmente a 11 de Dezembro, o feriado municipal que sempre decorre sob a égide do antigo Presidente da República, que, nessa data, elevou a então “villa nova” a cidade.

 

Um homem com uma «agitada, longa e curiosa vida»

livro MTG«A 10 de Dezembro de 1925, Manuel Teixeira Gomes dá início ao último, e porventura mais assombroso, capítulo da sua «agitada, longa e curiosa vida». Abandona o cargo de Presidente da República e embarca, uma semana depois, rumo ao norte de África, para «voltar a correr mundo». Votando-se a um exílio obstinado, não mais regressaria à pátria, nem mais veria família e amigos.

Boémio, negociante, melómano, viajante, escritor, diplomata e Presidente da República, Manuel Teixeira Gomes, nascido em 1860, atravessou, como testemunha e protagonista, os grandes momentos da história portuguesa do início do século XX: o advento e a afirmação do regime republicano, a participação na I Guerra Mundial, a ascensão e queda do sidonismo, as intrincadas negociações do pós-guerra e a voragem política e social da I República.

Participou intensamente na vida pública e viveu intensamente a sua vida privada. Colecionou experiências, saberes, objetos, arte, amores, amizades e viagens, e tudo nos devolveu através de uma admirável produção literária – cartas, livros de ficção, ensaios e crónicas. Correspondeu-se e relacionou-se com as principais figuras do seu tempo, da literatura à filosofia, da política à arte. Amigos que preservou e que o admiraram mau grado o tempo e a distância».

(texto da contracapa do livro)

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