T4: E7 – Porto – Vilarinho
Sinto-me como um dos irredutíveis gauleses do Astérix, cercado de romanos. No Albergue da Santa Casa da Misericórdia do Porto, a pernoitar com 48 peregrinos, eu era o único português. Até entre a meia dúzia de voluntários que prestavam serviço no albergue, também só havia um português, tripeiro nascido no Porto.
E ficámos os dois na conversa, no meio de tanta gente de tantos sítios, com destaque para uma família de italianos, oito, mas que abrangiam três gerações: eram pais, filhos e netos a fazer o Caminho.
Este albergue não tinha comparação com o humilde albergue de Grijó. Era enorme, cheio de regras. Uma delas foi a necessidade de ter que deixar a mochila num cacifo e apenas levar para o quarto o essencial, num pequeno cesto de roupa. Achei estranho, mas acabei por gostar, evita-se aquele barulho irritante dos sacos de plástico a meio da noite e andarmos a tropeçar nas coisas de cada um.
No quarto onde fiquei, estavam sete beliches duplos, o único vago era o que estava por cima de mim (cortesia do voluntário português?). Gente de todos os tamanhos e feitios, mas, por incrível que pareça, treze pessoas e ninguém ressonou durante a noite!!!
A minha barrela foi um pouco prejudicada por uma chuvinha daquela que parece que não molha, mas molha. Prenúncio do que estava aí para vir…
E veio a chuva, tipo esgarrão, num percurso de cidade que me obrigava a estar a pôr e a tirar a capa de chuva/poncho.
Mal comecei o percurso, encontrei o argentino/espanhol de há dois dias. Estava ele a contar que tinha encontrado duas argentinas e que iriam fazer o Caminho da Costa quando as vimos… A vir em sentido contrário!!! A situação gerou uma apaixonada discussão em espanhol muito rápido, uma acabou por ir por um lado, dois foram por outro e eu fui saindo de fininho… pensando na situação política na Argentina.
Por manifesta falta de qualidade dos produtos apresentados, hoje não foi possível destacar nenhum jardim. Havia um que tinha desde um elefante prateado até um dragão, mas a fotografia não lhe fazia justiça.
Começou a chover a sério e, como estava quase a chegar ao mosteiro de Vairão, resolvi entrar num café em Tresval. Assim que me vê, um dos clientes da casa faz o gesto perguntando se eu queria comer. Quando lhe disse que podia falar português, a reação foi “Português? Mas não é daqui!”. Resposta minha “Nota-se muito?” e ele a rir chamou a dona do café… que se me dirigiu em inglês.
Enquanto me arranjava a comida, uma sopinha, pão, uma dose de esparguete com frango e cogumelos (uma dose que dava, garantidamente, para duas pessoas), pôs uma garrafa de vinho à minha frente. Eu, aflito, disse que não ia beber tudo, ao que ela me respondeu que bebesse o que quisesse e que o café também estava incluído no menu, por sete euros!
Entretanto, resolvi enviar um whatsapp para o mosteiro a dizer que iria lá passar a noite. A resposta foi que lamentavam, mas iriam estar fechados nos próximos dois dias. Pânico, mas lá consegui arranjar alojamento em Vilarinho.
Estava a explicar a situação à senhora do café que, muito solidária, me disse que era perto, eram só mais uns cinco minutos. Não foi certamente por mal, mas cinco minutos de carro ainda são alguns quilómetros a pé…
Nesse meio tempo, começou a chover desalmadamente e, uma vez que a proteção que a capa de chuva dá é meramente psicológica, cheguei ao fim dos 25,5 quilómetros de hoje molhado, escorrendo e pingando.