O que querem os algarvios do futuro Governo?

Sul Informação falou com cinco algarvios, de diferentes áreas, antes das Legislativas de domingo

Foto: Pablo Sabater | Sul Informação

À paz e ao pão, os algarvios juntariam exatamente as mesmas prioridades que Sérgio Godinho eternizou na canção “Liberdade”, lançada no ano da Revolução: a habitação, a saúde e a educação. A dois dias de umas Eleições Legislativas marcadas pela incerteza, estas são as três áreas prioritárias nas quais, segundo cinco algarvios, um futuro executivo deve apostar.

No domingo, os portugueses voltam a ser chamados às urnas, depois das últimas Legislativas de 2022 em que o PS conquistou a maioria absoluta.

O cenário é marcado pela imprevisibilidade: à direita, o crescimento do Chega – e com a garantia, de Luís Montenegro, que não haverá entendimentos com o partido de André Ventura – parece inviabilizar uma solução estável de maioria.

À esquerda, as últimas sondagens mostram que o número de deputados pode ser insuficiente para repetir a geringonça de 2015 que juntou PS, Bloco de Esquerda, PCP e Verdes – com Pedro Nuno Santos, atual secretário geral do PS, a ser, na altura, um dos principais rostos dessa solução governativa.

E agora? Como será a vida política portuguesa no pós-10 de Março?

Apesar da incerteza, o Sul Informação foi falar com cinco algarvios: um trabalhador-estudante, uma enfermeira, uma professora, uma pensionista e um profissional da área da cultura.

O mote das cinco conversas foi o mesmo: o que querem os algarvios de um futuro Governo?

Apesar das diferentes proveniências, há vários pontos de contacto entre as respostas: a habitação, a saúde e a educação são as áreas em que o executivo – liderado seja por quem for – deve apostar.

Ricardo Teixeira tem 24 anos e é trabalhador-estudante.

A frequentar o Curso Técnico Superior Profissional em Secretariado Executivo, na Universidade do Algarve, e operador de caixa no Auchan, em Faro, pede a esse futuro Governo «uma maior preocupação em dar conforto e segurança para os jovens, sem que tenhamos a necessidade ou até mesmo o pensamento de emigrar em busca de melhores condições de vida».

A isto junta-se uma «valorização na área da saúde, nomeadamente dos seus profissionais», bem como uma proposta para o ensino superior, defendida por este universitário.

«Acho que deveria ser mais aberto a uma aprendizagem remota para que os jovens pudessem construir o seu futuro à medida que trabalham e estudam», diz ao nosso jornal.

A habitação também é vincada por Ricardo Teixeira, que pede «um travão no aumento das rendas». «A situação da falta de habitação deve ser resolvida, visto que está tudo muito direcionado para o luxo e para o turismo», acrescenta.

 

 

Ângela Pestana

 

Com uma vida de trabalho dedicada ao turismo, Ângela Pestana tem 70 anos e está reformada há três, apesar de manter o seu negócio de aluguer de bicicletas, em Monte Gordo.

«Se tivesse gerido a minha empresa como eles [os políticos] gerem o país, tinha ido à falência», atira em início de conversa.

Para Ângela, as prioridades estão bem definidas: «zero corrupção, melhor SNS, menos esperas nas urgências e mais condições para os jovens».

«Eu não tenho médico de família e também acho importante melhorar o Hospital de Faro com mais profissionais. Estou há mais de três anos à espera de uma consulta de especialidade», lamenta ao Sul Informação.

Ângela Pestana também realça a necessidade de «mais habitação», dando o exemplo da filha – bolseira de doutoramento – «que estuda uma vida inteira para viver miseravelmente».

Ainda assim, esta reformada tem medo de que «não se faça nada daquilo que se está a prometer».

Para Ana Paula Sousa, 62 anos, professora de Português, o grande receio é que se entre «numa solução de ingovernabilidade» no pós-eleições.

Como seria de esperar, deseja, enquanto docente, que «o próximo Governo finalmente reponha o tempo de serviço dos professores».

«Como se sabe, os professores que estavam integrados na carreira em 2005, antes do primeiro congelamento, tiveram 9 anos, 4 meses e dois dias de tempo de serviço congelado. O Governo, em 2018, devolveu 30% – 2 anos, 9 meses e 18 dias. Por isso, faltam 6 anos, 6 meses e 23 dias de tempo que permanece congelado», explica.

Além disto, a professora do Agrupamento de Escolas D. Dinis, de Quarteira, pede a um futuro executivo que, «para bem dos nossos alunos, consiga resolver o problema da falta de professores».

 

Ana Paula Sousa

 

Focando atenções no Algarve, Ana Paula Sousa diz que a questão da falta de água «já deveria estar solucionada há muito».

«As reservas não são eternas, pelo contrário. Portanto, mais tarde ou mais cedo, iríamos ter este constrangimento, logo já deveria estar prevista e pensada uma solução. Não se pode apenas querer solucionar este tipo de problemas quando já nos encontramos numa situação limite», argumenta.

Tal como Ângela Pestana e Ricardo Teixeira, a professora de Português também aponta a «falta de habitações» como um «problema grave» e «prioritário».

«As que vão aparecendo estão a uns preços ou rendas exorbitantes. Mais uma vez, são os nossos governantes que devem apresentar soluções, nós votamos neles, acreditando que isso vai acontecer», diz.

Na última legislatura, a par dos professores, os enfermeiros foram das profissões que mais se manifestaram contra as medidas do Governo.

Em conversa com o Sul Informação, Inês Ventura, enfermeira no Hospital de Faro, não nega que uma das principais reinvindicações que tem para um futuro Governo é «melhorar o acesso à saúde pública».

 

 

Inês Ventura

 

 

«Há imensas especialidades desfalcadas e serviços vitais que fecham por dias consecutivos como as urgências pediátricas. A gestão a nível da saúde está péssima, temos médicos tarefeiros a ganhar num fim de semana o mesmo que ganha um médico da casa durante um mês. Isto é normal?», questiona a profissional do serviço de cuidados intensivos neonatais e pediátricos do Hospital de Faro.

Por isso, o que pede, apesar de assumir que possa «parecer um clichê», é mesmo uma «diminuição dos impostos e aumento dos salários».

«Sou enfermeira e tenho colegas a receber 900 euros, quase o equivalente ao salário mínimo… É insustentável, tendo em conta o aumento de custo de vida que se tem sentido nos últimos tempos», considera.

João de Brito, 40 anos, ator, diretor do LAMA, estrutura teatral de Faro, acrescenta um novo ponto: para ele, «acabar com as portagens na Via do Infante» deve ser uma das prioridades do futuro Governo, bem como «resolver a situação da seca».

«Gostaria de ter um Governo que reestruturasse o país de baixo para cima. Identificasse os problemas sociais que existem e não ficasse pela identificação, mas que os resolvesse com justiça e dignidade. Existem problemas estruturais na educação, na saúde, na segurança, na cultura, na habitação. Está na ordem do dia. Tudo se resume a falta de planeamento que entronca numa desorganização e burocracia generalizada», considera.

Para João de Brito, há vários pontos urgentes: a defesa da cultura, do SNS e a necessidade de «estancar a especulação imobiliária».

 

 

 

 

«É urgente dar esperança aos jovens para que possam construir as suas carreiras profissionais no seu país de origem. Há muitos assuntos que gostaria que fossem resolvidos pelo próximo executivo, mas, acima de tudo, tenho esperança no diálogo e que o novo Governo tenha a capacidade de ouvir a oposição e chegar a consensos para que juntos (como deveria ser) resolvam a situação catastrófica que atravessamos», acrescenta.

Com conhecimento na área, João de Brito também pede a um futuro Governo que perceba «que a comunidade artística cresceu muito nos últimos anos no Algarve, do teatro à música, passando pela dança, pelas artes plásticas e pelo vídeo, e tentar acompanhar essa evolução para que não haja um retrocesso e com isso sejamos obrigados a rumar aos grandes centros».

Agora, a bola está do lado dos algarvios que vão às urnas no domingo.

 

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