José Alberto Quaresma: «João de Deus era uma personalidade única»

Livro sobre João de Deus «traz muita informação desconhecida, inédita, procurando iluminar os caminhos mais obscuros» do poeta e pedagogo algarvio

José Alberto Quaresma com o seu livro – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

O livro começa por descrever, em jeito quase de reportagem, a enorme homenagem nacional de que o poeta e pedagogo foi alvo, a 7 de março de 1895, em Lisboa, por ocasião do seu 65º aniversário. Foi a maior homenagem que algum poeta já teve em vida, pelo menos em Portugal.

O livro chama-se «João de Deus – Vida» e resulta de mais de «quatro anos de trabalho» do professor, escritor, cronista em jornais e também poeta José Alberto Quaresma. Foi lançado 129 anos e um dia depois dessa homenagem, a 8 de Março deste ano, em São Bartolomeu de Messines, terra natal de João de Deus.

José António Gomes, escritor, investigador e professor do ensino superior, convidado para apresentar a obra biográfica, salientou que a leitura deste livro de mais de 600 páginas «é prazeirosa, até divertida», cheia de «deliciosos pequenos episódios, plenos de graça», tudo características da escrita de José Alberto Quaresma. Destacou mesmo o uso de um verbo muito comum no falar algarvio mas não tão habitual no resto do país: «assomar», «verbo muito da preferência do biógrafo, que o usa do princípio ao fim».

Mas nem por isso, salientou José António Gomes, a biografia de João de Deus escrita por Quaresma deixa de ser uma «narrativa sustentada de forma rigorosa em documentos coevos», manuscritos e impressos.

«Como é que este rapaz de estatura meã, barba longa e destrambelhada me capturou, fazendo de mim seu servo?», interrogou-se o autor da biografia, quando chegou a sua vez de falar.

José Alberto Quaresma confessou que, depois da sua obra sobre Manuel Teixeira Gomes, em que investiu dez anos de trabalho, «não tinha previsto fazer mais nenhuma biografia. Mas João de Deus trocou-me as voltas».

 

 

É que, acrescentou Quaresma, o poeta, prosador e pedagogo nascido em Messines em 1830 já «andava a assediar-me há mais de 40 anos (…). Entrei em João de Deus musicando alguns dos seus poemas».

Perante esta «personalidade única», este «extraordinário ser humano», «tal como em Teixeira Gomes, eu quis caminhar com o João de Deus para mais longe» e assim escrever uma biografia que falasse sobre todos os aspetos da sua vida.

«Não apenas o poeta, o pedagogo, mas também a pessoa, o homem, com as suas dualidades, com a sua grandeza».

Ao Sul Informação, José Alberto Quaresma explicou ter estado «mais de quatro anos a investigar e a redigir o manuscrito que agora sai em livro, com mais de 600 páginas. É muito diferente de Manuel Teixeira Gomes – Biografia, na forma e no conteúdo. Traz muita informação desconhecida, inédita, procurando iluminar os caminhos mais obscuros de uma vida e obra, da que é uma das mais fascinantes personalidades nascida no Algarve».

«Embora seja um ensaio, com todo o rigor científico que procurei realizar, está escrito como uma narrativa descomplicada, a muitas vozes, entrecortada por muitos dos seus poemas e da sua prosa, parte dela também inédita», acrescentou o biógrafo.

Na apresentação do livro em Messines, Quaresma recordou que, desde que João de Deus foi para Lisboa em 1868, para ser deputado um bocado a contra-gosto, «nunca mais voltou aqui», a São Bartolomeu de Messines.

Por Lisboa se manteve, até ao fim da sua vida. «Nunca teve o mundo que o Teixeira Gomes teve, mas tinha o mundo que a janela da sua casa lhe permitia espreitar».

«Sacrificando o poeta, sacrificando o prosador», a grande luta de João de Deus foi contra um cancro que então grassava na sociedade portuguesa, «dedicando-se de alma e coração a trazer para a luz a miséria do analfabetismo, que era gritante», atingindo, no século XIX, uma taxa que «rondava os 90%».

Foi por isso que João de Deus criou a «Cartilha Maternal», pela qual ainda hoje há quem aprenda a ler e a escrever português e que, na altura, veio dar um abanão no Portugal analfabeto e ignorante que alguns teimavam em querer eternizar.

Apesar desse seu triunfo na educação, José Alberto Quaresma conta que João de Deus foi um «educador mais azelha com os filhos que com os seus discípulos».

João de Deus, «venerável defunto, inerte no Panteão Nacional desde 1966» é dado a descobrir, às vezes através de episódios e factos desconhecidos, com uma escrita fluida e interessante, ao longo das 614 páginas deste livro, editado pela Imprensa Nacional, e que pesa, segundo o autor, «um quilo e trezentos gramas». O Sul Informação pesou o livro e confirma.

Entretanto, ainda sobre o poeta e pedagogo algarvio, está no prelo, também com a chancela da Imprensa Nacional e tendo José Alberto Quaresma como autor, «um livrito pequeno, mas essencial» denominado «João de Deus no Panteão Nacional».

O livro «João de Deus – Vida», editado pela Imprensa Nacional, pode ser comprado na FNAC, na Bertrand ou na Wook.

 


A biografia «João de Deus – Vida», edição da Imprensa Nacional, bem como «João de Deus no Panteão Nacional», uma edição da Imprensa Nacional e do Panteão Nacional, são livros coeditados pela Câmara Municipal de Silves.

Aliás, como salientou Rosa Palma, presidente da autarquia, no lançamento da primeira destas obras, o trabalho de José Alberto Quaresma resultou de «um repto lançado pelo Município de Silves».A apresentação do livro integrou, aliás, a programação do Dia Municipal João de Deus, a 8 de Março, data do nascimento do poeta e pedagogo. Começou com a deposição de flores junto à escultura de João de Deus, na avenida com o seu nome, em São Bartolomeu de Messines.

Prosseguiu com a entrega do Prémio Nacional Literário João de Deus e culminou com o lançamento da obra biográfica, no auditório da Caixa Agrícola Terras do Arade.

 

Fotos: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 


José Alberto Quaresma nasceu em Portimão. Licenciou-se em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (1979).
Prosseguiu estudos em História Moderna e Contemporânea, na Universidade de Paris-Sorbonne (Paris IV), com Pierre Chaunu e André Corvisier, e em História das Mentalidades Religiosas, no Collège de France, com Jean Delumeau (1983-89).
Foi docente do ensino secundário e formador de professores.
É diretor científico da Casa Manuel Teixeira Gomes.Publicou artigos em revistas científicas da especialidade e apresentou em vários fóruns comunicações sobre História, História das Mentalidades, Sociedade e Sistema Educativo.

Tem, como colunista, colaboração dispersa por vários periódicos, nomeadamente, O Independente, Público, Expresso, Correio da Manhã, Domingo Magazine, e outros da imprensa regional, Barlavento, O Meridional, Terra Ruiva.Obteve o Prémio Revelação de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores (1989), pelo livro A Pose Extática, (Afrontamento). Publicou Ecolalia, poesia (Vega) e, na mesma editora, Direito ao Erro – A Batalha da Educação em Portugal. Foi autor de «Falta de Castigo – o blogue da educação e da falta dela», no Expresso, entre 2008 e 2014.

Coordenou as Comemorações do 122º Aniversário do Nascimento de Manuel Teixeira Gomes (1982-1983). Foi o Comissário para as Comemorações Nacionais dos 150 Anos de Manuel Teixeira Gomes (2010).

É autor de Manuel Teixeira Gomes – Biografia (Imprensa Nacional – Casa da Moeda / Museu da Presidência da República, 634 pg), 1ª Edição, 2016; 2ª edição, 2019). É o coordenador, juntamente com Nuno Júdice, das Obras Completas de Manuel Teixeira Gomes, em cinco volumes, para a Imprensa Nacional, de que saíram os três primeiros volumes. Está em preparação o Vol. IV, agregando outros livros, publicações dispersas e inéditos de Teixeira Gomes.

Assina também, juntamente com Nuno Júdice, Fernando Rosas, Nuno Severiano Teixeira, Helena Carvalhão Buescu, Luís Filipe Castro Mendes, Laurinda Paz e Fernando António Baptista Pereira, o livro Regresso a Teixeira Gomes – Estudos, edição em preparação na Imprensa Nacional.

É membro do Observatório de Cultura da SEDES – Associação para o Desenvolvimento Económico e Social, fundada em 1970.

 

 

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