Novo campo de golfe no Algarve é «projeto incompatível com a emergência hídrica que se vive»

«Condicionantes impostas pela DIA, sobre os recursos hídricos, desfasadas da atual situação de seca e escassez hídrica que afeta a região»

Campo de golfe Monte Rei (arquivo)

O projeto de expansão do Campo de Golfe de Monte Rei, localizado na freguesia de Vila Nova de Cacela, concelho de Vila Real de Santo António, é «incompatível com a emergência hídrica que se vive no Algarve», considera a associação ambientalista ZERO.

O projeto, que corresponde à construção de um novo campo de golfe de 18 buracos e cujo período de consulta pública ao Relatório de Conformidade Ambiental do Projeto de Execução (RECAPE) terminou na quinta-feira passada, abrange uma área de intervenção superior a 56 hectares dos quais cerca de 30 hectares são ocupados por relvados.

A ZERO recorda que o projeto tinha já sido sujeito a procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) que culminou com a emissão de uma Declaração de Impacte Ambiental (DIA) favorável condicionada, emitida a 20 de dezembro de 2019, a qual foi alvo de um pedido de prorrogação em outubro de 2023.

Agora que o RECAPE esteve em consulta pública, a associação ambientalista defende que as «condicionantes impostas pela DIA, sobre os recursos hídricos, desfasadas da atual situação de seca e escassez hídrica que afeta a região».

É que, salienta a ZERO, «a Declaração de Impacte Ambiental (DIA) emitida em 2019 impôs que, em fase de RECAPE, o sistema de rega do campo de golfe estivesse preparado para, no futuro, usar outras origens de água, além da fornecida pela Associação de Beneficiários do Plano de Rega do Sotavento Algarvio (ABPRSA), nomeadamente com origem na reutilização de águas residuais, já que, em situação de seca severa, o fornecimento a partir da ABPRSA poderia ser suspenso».

Perante um agravamento da situação de escassez hídrica, os ambientalistas consideram que «a condicionante imposta pela DIA não configura uma garantia de salvaguarda dos interesses ambientais e sociais da região do Algarve, a qual enfrenta uma situação de escassez hídrica sem precedentes, agravada pelas alterações climáticas e pela elevada pressão turística».

Perante aquilo que consideram «uma condicionante desfasada da atual realidade da região», o RECAPE «não prevê a utilização de outras origens de água que não a fornecida pela ABPRSA, justificando-se com os elevados custos associados à construção de uma ligação entre a ETAR de Vila Real de Santo António (VRSA) e com a possibilidade de, no médio prazo, a reutilização de águas residuais na rega poder vir a ser uma realidade face às medidas implementadas na região para otimização da gestão e da distribuição de água para rega, assumindo ainda que a curto prazo o acesso à água não será limitado pela ABPRSA».

Por tudo isso, reforça a ZERO, a «construção de um novo campo de golfe é mais uma ameaça à já muito frágil sustentabilidade hídrica da região».

De acordo com os dados da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), o Algarve está na pior situação de sempre em termos de recursos hídricos, com as albufeiras a registarem níveis muito baixos de armazenamento, que não chegam os 20% em algumas delas.

O presidente das Águas do Algarve, António Eusébio, reconheceu, no final de 2023, que «falta muita água» na região e mostrou-se receoso com o futuro próximo, admitindo que podia ser necessário impor limites ao consumo em 2024, situação já concretizada nas mais recentes medidas destinadas a enfrentar a seca no Alentejo e Algarve, que preveem uma redução dos consumos imposta ao abastecimento público, abastecimento agrícola e turismo.

Neste contexto, sublinha a ZERO, «não é razoável que o RECAPE assuma que não haverá restrições à utilização de água para rega do campo de golfe por parte da ABPRSA e que seja considerada outra forma de rega que não, exclusivamente, através da utilização de água residual tratada».

«A construção de um novo campo de golfe com uma área de relvados superior a 30 hectares, que obviamente implica um elevado consumo de água para a rega, é uma ameaça à sustentabilidade hídrica do Algarve, que já sofre com a escassez de água com impacte em atividades essenciais para a população e para a economia local», acrescenta a associação ambientalista.

Outro aspeto que suscita preocupação neste projeto, de acordo com a ZERO, «é o uso de fertilizantes e fitofármacos para a manutenção dos relvados do campo de golfe, e as consequências negativas que podem advir para a qualidade das águas subterrâneas e superficiais, bem como para a biodiversidade local».

No caso dos impactes sobre os recursos hídricos, estes podem ser «especialmente graves numa região que está extremamente dependente dos escassos recursos hídricos existentes, cuja qualidade é imprescindível garantir».

Perante tudo isto, a ZERO «manifestou o seu parecer desfavorável ao projeto de expansão do campo de golfe de Monte Rei, por considerar que o mesmo é incompatível com a emergência hídrica que se vive no Algarve podendo colocar em causa direitos fundamentais das populações, nomeadamente o direito ao acesso a uma quantidade suficiente de água e com qualidade adequada».

 

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