Um dos maiores mistérios da História do Sotavento Algarvio acaba de ser desvendado: foram localizadas as pedras nobres da ermida de Santo António, edificada na vila de Santo António de Arenilha (antiga Vila Real de Santo António).
O historiador Fernando Pessanha recorda que a vila de Arenilha foi fundada na foz do Guadiana, em 1513. Foi constituída como um couto de homiziados, sendo que no seu porto – onde eram contrabandeados escravos e mercadorias trazidas das praças portuguesas do Norte de África – era frequentemente atacado pelo corso e pela pirataria.
Ainda segundo o investigador, a partir de 1542, a alcaidaria-mor de Arenilha foi atribuída a António Leite, capitão das praças portuguesas de Mazagão, Azamor e do forte do Seinal, como compensação pela perda da capitania de Mazagão, onde se concentraram as forças portuguesas no sul de Marrocos depois da evacuação de Safim e Azamor.
De facto, foi durante a evacuação de Alcácer Ceguer, em 1550, que o capitão António Leite transferiu para os edifícios religiosos de Santo António de Arenilha (Igreja da Trindade e Ermida de Santo António) as pedras nobres da capela existente no forte do Seinal, nomeadamente, as pias batismais e de água benta, uma coluna com as armas de António Leite e a pedra do altar-mor.
Estas informações, avançadas por Hugo Cavaco, em 2010, e desenvolvidas em vários estudos de Fernando Pessanha, desde 2014, levantaram, no entanto, uma dúvida: o destino dado às pedras nobres de Arenilha quando a população da vila se dispersou pelo concelho, no século XVII, durante a guerra da Restauração, para fugir aos constantes ataques de espanhóis e do corso do Norte de África.
A resposta a este enigma com quatro séculos foi agora desvendada pelo historiador de arte Marco Sousa Santos, que identificou, na ermida do Revelim de Santo António, em Castro Marim, um pedestal com o que será o brasão de armas do capitão António Leite, alcaide-mor de Arenilha, assim como o tampo de uma mesa de altar onde figura a inscrição: “ESTE.(A)LTAR.E.IRMI/DA.MANDOV.FAZER.AMTO.LE.ESTÃNDO.POR.CAPITÃ.N/O.SE(INAL) (…)”.
«Esta descoberta destaca-se, portanto, pela sua grande importância histórico-cultural, não só por se tratar de um património arqueológico dos Algarves de Aquém e de Além-mar, trazido para a foz do Guadiana no contexto da reformulação da estratégia norte-africana de D. João III, como também por se tratar dos únicos materiais (conhecidos) que sobreviveram ao desaparecimento da vila de Santo António de Arenilha, reconstruída a partir de 1774 já com o nome de Vila Real de Santo António», explicam Fernando Pessanha e Marco Sousa Santos.
«Por trás destas pedras, há toda uma epopeia», salienta Fernando Pessanha em declarações ao Sul Informação. O capitão António Leite, recordou o historiador, trouxe estas pedras «de Marrocos para Arenilha, para não as deixar lá entregues aos mouros». Durante muito tempo não se soube do seu paradeiro, mas agora, graças à investigação de Marco Sousa Santos, foram localizadas na ermida do Revelim de Santo António, que está habitualmente fechada ao público.
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