«Há aqui situações em que, se não fizéssemos nada e houvesse uma chuva muito forte, como pode acontecer, podia haver sérios problemas para as casas e as localidades. O risco seria grande em Odeceixe, mas também na zona de São Miguel e noutros locais», explicou Joaquim Castelão Rodrigues, diretor regional do Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) no Algarve, em declarações ao Sul Informação.
O ICNF, em conjunto com as Câmaras de Aljezur e de Odemira, e com o apoio de outras entidades, como a Agência Portuguesa de Ambiente, está a fazer trabalhos de «estabilização de emergência», em linhas de água e encostas, na zona de Odeceixe (Aljezur) e de São Miguel (Odemira), afetadas pelo grande incêndio de Agosto passado. Estes trabalhos foram, na terça-feira, visitados pelo secretário de Estado da Conservação da Natureza.
Desde há cerca de três semanas que estão no terreno sapadores-bombeiros do ICNF, em conjunto com os sapadores florestais dos próprios Municípios, a limpar as linhas de água de destroços, árvores e arbustos queimados, lixo, muito lixo, bem como a estabilizar algumas obras de correção hidráulica que tinham sido feitas há anos, precisamente para quebrar a força das torrentes, e que há muito tempo estavam entulhadas ou cobertas por silvas e outra vegetação.
No terreno, estão também a ser colocadas barreiras para controlo da erosão e proteção das encostas, feitas com entrançados construídos com os troncos e os ramos das árvores queimadas.
Tudo para evitar que, com as primeiras chuvas, o solo das encostas venha por aí abaixo, agravando a erosão, e criando torrentes de água, lama, pedras e destroços florestais que poderiam causar graves prejuízos mais abaixo, na vila de Odeceixe ou em certas zonas de casas, perto de São Miguel e de Baiona.
Nuno Sequeira, vogal do Conselho Diretivo do ICNF e responsável pela área dos fogos rurais, explicou aos jornalistas presentes – RTP e Sul Informação – que o objetivo dos trabalhos é «desobstruir o caminho da água e recuperar algumas obras de correção torrencial, que já estavam feitas, exatamente para minimizar o perigo de enxurradas. Aqueles muros fazem com que a velocidade de escoamento da água diminua, chegue com menos energia à vila e passe pelas zonas adequadas sem causar estragos».
É que, como salientou José Oliveira, o jovem presidente da Junta de Freguesia de Odeceixe, a vila, situada numa encosta, é «atravessada por uma série de ribeiras e linhas de água» que vão parar à ribeira de Seixe, lá em baixo, no vale.
Nuno Sequeira acrescentou que os trabalhos de emergência após o fogo destinam-se precisamente a fazer com que, quando chover, a água «cause o mínimo de danos possível. Estamos a tirar-lhe a velocidade e a energia, porque, ao diminuir a energia, depois arrasta menos sedimentos, menos vegetação. Havia muita vegetação que foi retirada nesta intervenção, o que faz com que a água corra mais naturalmente pelo seu leito natural, causando menos prejuízos».
José Gonçalves, presidente da Câmara de Aljezur, que acompanhou a visita do secretário de Estado João Paulo Catarino, confessou aos jornalistas que, apesar de estar «mais descansado» com o avanço dos trabalhos, não deixa de «estar preocupado». Porquê? «Imaginemos que começa a chover torrencialmente de um dia para o outro. Se nós pensarmos no que são as condutas que estão por baixo da vila de Odeceixe, que canalizam todas estas linhas de água, imagine-se o que seria todo este volume de destroços, de terra, entupirem tudo isso… poderia causar problemas graves em Odeceixe».
Precisamente para tentar evitar que tal aconteça, a intervenção de emergência em curso também passa pela desobstrução das passagens hidráulicas e canais de escoamento, que atravessam a zona urbana de Odeceixe, e que, como se constatou agora, há longos anos não eram limpos.
Mas as preocupações do ICNF, nesta vasta área que integra o Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, não se concentram apenas em Odeceixe. No lado alentejano, onde até começou o incêndio no dia 5 de Agosto passado, há também zonas onde a estabilização de emergência já está a avançar.
É o caso de um local curiosamente chamado Ribeira Seca, por trás do parque de campismo de São Miguel, onde até há uma casa construída há dezenas de anos no meio da linha de água. A ribeira pode estar seca… mas, como acontece nestas zonas, devido ao regime torrencial, quando chove, a torrente ganha força e pode arrastar tudo à sua passagem, até uma casa.
Pela linha de água acima, a montante da casa, na encosta, tudo está a ser limpo, ao mesmo tempo que os sapadores constroem barreiras com entrançados de ramos, de modo a conter a fúria de uma eventual enxurrada. Evita-se prejuízos, mas também se diminui a erosão dos solos.
Dos 7542 hectares afetados pelo incêndio que começou a 5 de Agosto e se prolongou até dia 11, afetando áreas do concelho de Odemira (5542 ha, 73% do total), Aljezur (1636 ha, 22%) e Monchique (364 ha, 5%), estes trabalhos de estabilização e limpeza de emergência estão a ser feitos «numa área que ultrapassa os 500 hectares, mas em pequenas bolsas», revelou Nuno Sequeira, do ICNF.
No terreno, estão mais de 30 pessoas, entre operacionais do ICNF e da Câmaras Municipais, bombeiros sapadores e sapadores florestais, algumas máquinas pesadas. Pelos cálculos de Nuno Sequeira, ainda há trabalho para mais três semanas.
«É um trabalho difícil, que exige uma elevada competência técnica, seja ao nível da seleção dos locais, seja a nível de quem o executa». Difícil e muito necessário.
Fotos: Elisabete Rodrigues | Sul Informação
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