Manuel Viegas Guerreiro trocado por miúdos no Dia Mundial da Criança

O programa desenrola-se entre as 9h30, com a chegada das crianças, e as 11h00, hora do regresso às escolas de origem

As crianças da aldeia de Querença criaram jogos e um vídeo que dão a conhecer o antropólogo Manuel Viegas Guerreiro, aí nascido em 1912, às gerações do século XXI. O projeto chama-se “Antropologia do Espanto” e é apresentado em Junho, no Dia Mundial da Criança.

O legado de Manuel Viegas Guerreiro, o histórico de colaborações entre as várias parcerias envolvidas e o barro de Querença permitiram que, através da arte, fosse concebido um conjunto de recursos educativos em torno da vida, do pensamento e dos estudos do etnólogo, antropólogo e pedagogo do século XX.

«Os recursos educativos germinados em Querença têm a sua génese no pensamento de um homem de escuta, uma figura singular e do mundo. Universalista, profundamente humanista e cujos valores, acreditamos, podem ser trabalhados desde muito cedo, junto das gerações mais novas, a partir da sua aldeia natal, Querença», salienta Marinela Malveiro, da Fundação Manuel Viegas Guerreiro (FMVG).

 

 

A pensar no público infantil, a FMVG aliou-se à Câmara Municipal de Loulé e à associação Ao Luar Teatro que desenvolvem com a comunidade escolar local, respetivamente, o projeto multissensorial “Vemos, Ouvimos e Lemos” (desde 2019, a partir da Fundação) e “Quarto Minguante”, numa parceria com a União de Freguesias de Querença, Tôr e Benafim (desde 2016).

Juntas, as três entidades resolveram criar o projeto “Antropologia do Espanto”, inscrito na I Bienal Cultura e Educação, “Retrovisor: uma história do futuro”, promovido pelo Plano Nacional das Artes (disponível aqui).

No processo de concretização de “Antropologia do Espanto”, os/as alunos/as têm sido sensibilizados/as, ao longo deste ano letivo, para os valores do eminente antropólogo: «Celebraram o centenário do seu nascimento e delinearam o seu roteiro biográfico, da infância em Querença até aos 30 anos de idade. Contactaram com a riqueza intelectual deste homem do saber, explorando a sua biblioteca pessoal e uma exposição fotográfica sobre os koïsan, existente nos arquivos da Fundação», refere Maria Mackaaij, bibliotecária da Câmara Municipal de Loulé.

A partir dessa sensibilização, as crianças concretizaram vários jogos, entre eles, o jogo da botica e o do galo. Esta, uma componente do projeto que tem sido implementada pela associação Ao Luar Teatro. Célia Martins explica: «Através das áreas de expressão artística, plástica e físico-motora, os jogos despertam para Manuel Viegas Guerreiro, para a entreajuda e para as trocas intergeracionais. Tudo isto acontece em momentos lúdicos e de partilha».

O projeto tem despertado as crianças para a importância do património cultural e imaterial local, explorando provérbios, adivinhas, rimas, trava-línguas e lengalengas. Um jogo de chão em lona com 4×3 metros, similar ao Jogo da Glória, relaciona este património a partir do conto maconde recolhido por Manuel Viegas Guerreiro no norte de Moçambique: “O caracol e a gazela”.

Cruza jogos, tradições e o legado de Manuel Viegas Guerreiro. Uma das casas do jogo, por exemplo, convida a ouvir cantos macondes, por crianças macondes, a partir do acervo sonoro de Manuel Viegas Guerreiro, alojado em Querença.

 

 

O “tabuleiro de chão”, onde se desenrola o jogo, com ilustrações em aguarela, evidencia a multiculturalidade, a inclusão, a interajuda, os lugares em que o antropólogo desenvolveu investigação no mundo, espelhando fotografias de animais, alojamento e pessoas por si captadas. Inclui ainda algumas das suas recolhas, tais como as adivinhas que constam dos cartões, registadas em “Adivinhas Portuguesas”, um livro de 1957 com património oral de Querença.

Na dinâmica do jogo, as crianças são desafiadas a usar a sua fisicalidade para saltar em sacas de serapilheira ou percorrer o espaço exterior da Fundação ao encontro das respostas para os cartões que o jogo também integra, lembrando as palavras de Viegas Guerreiro «A vida é actividade permanente, o repouso não passa de ilusão», no livro “Os Macondes de Moçambique” (Junta de Investigação do Ultramar, 1966).

O projeto multidisciplinar, criativo e integrador da comunidade de Querença contempla um vídeo (que será exibido no dia 1 de Junho) com entrevistas realizadas pelas crianças de 1.º ciclo de Querença junto de várias pessoas da aldeia, que conheceram Manuel Viegas Guerreiro ainda em vida.

Jogos e oficinas aguardam pelos/as alunos/as das escolas do ensino básico de Querença, Tôr e Benafim, do agrupamento Padre João Coelho Cabanita. A associação Ao Luar Teatro trará a animação infantil “Bichos do mato”, para as crianças do pré-escolar.

O programa desenrola-se entre as 9h30, com a chegada das crianças, e as 11h00, hora do regresso às escolas de origem. A apresentação é aberta ao público em geral.

Manuel Viegas Guerreiro lutou sempre pela preservação da memória, pelo registo das tradições, tendo criado a disciplina de Literatura Tradicional Oral na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde foi Professor Catedrático.

Nesse mesmo local, em parceria com o Centro de História da Universidade de Lisboa, a FMVG inaugurou recentemente a exposição itinerante «Boers de Angola, 1957», organizada pela investigadora Luísa Martins.

A mostra é complementada com a exibição de um conjunto de equipamentos de vídeo e áudio de Viegas Guerreiro. De acesso livre, está patente ao público até ao dia 9 de Junho.

 

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