Renature Monchique «já deixou uma marca» na serra e nas suas gentes

Em três anos, foram ajudadas dezenas de proprietários, que passaram a ter terrenos mais “monchiquenses”

Renature Monchique – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação (arquivo)

Começou em 2019 como um programa de reflorestação após os grandes incêndios do Verão anterior, mas hoje já pode ser considerado um autêntico movimento, que envolve a comunidade local e «já deixou uma marca em Monchique». O Renature Monchique, que permitiu plantar mais de 200 mil árvores na serra algarvia e ajudou 60 proprietários, vai entrar no seu quarto ano e continuar a tornar este território mais resiliente.

Em 2022, o objetivo é plantar mais 75 mil árvores de espécies autóctones, com especial incidência no carvalho-de-Monchique, mas também sobreiros, castanheiros, medronheiros, carvalhos-cerquinhos, freixos e amieiros, anunciaram ontem, dia 10 de Novembro, os parceiros deste projeto, numa sessão em Faro.

Mas, mais do que plantar árvores, a grande preocupação da equipa do GEOTA – Grupo de Estudos do Ordenamento de Território e Ambiente, que coordena este projeto, é garantir que o trabalho perdure no tempo e torne a floresta mais resistente aos incêndios.

«O trabalho importante que estamos a fazer é o contacto direto com os agricultores e com os proprietários, para os fazer perceber não só o perigo de apostarem em espécies de crescimento rápido, que não são autóctones do Algarve – porque os grandes incêndios são, em boa parte, fruto disso -, como as vantagens de apostar nas espécies naturais da região», disse aos jornalistas João Dias Coelho, presidente do GEOTA, à margem da sessão.

«Dessa forma, estamos a defender a resiliência e, acima de tudo, a proteger o ecossistema da serra de Monchique, porque o conjunto de espécies autóctones não inclui o eucalipto e o pinheiro-bravo», acrescentou.

 

João Dias Coelho e Paulo Alves

 

No fundo, trata-se de «dar uma alternativa» aos proprietários do terreno, «em termos do que estão a produzir», apresentando as «mais valias que possam ter com outro tipo de espécies, que se adequem à realidade do território».

«É isso que estamos a privilegiar: manter as espécies endémicas ou autóctones da região, tentando que elas possam embelezar e criar um espaço dinâmico para o turismo sustentável e rural. Isto é tudo compatível com as demais atividades económicas locais, proporcionado às populações e proprietários a sua rentabilidade», acrescentou o presidente do GEOTA.

Para conseguir fazer este trabalho, o GEOTA e a Câmara de Monchique, que tem trabalhado de perto com a Organização Não Governamental e dado assistência a vários níveis à equipa do projeto, estão a contar com um substancial apoio financeiro da Ryanair, o mecenas deste projeto.

Até agora, a companhia aérea low cost e os seus clientes já contribuíram com um milhão de euros para esta causa, 250 mil euros por cada ano de Renature Monchique.

Como ilustrou Thomas Fowler, diretor de Sustentabilidade da Ryanair, que não conseguiu estar na sessão, mas enviou uma declaração em vídeo, o dinheiro investido pela companhia irlandesa permitiu «reflorestar Monchique com mais 200 mil árvores» e vai proporcionar «a plantação de mais 75 mil árvores», ainda este ano.

 

Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação

 

Tanto da parte do financiador, que na sessão foi representado por Elena Cabrera, country manager da Ryanair para Portugal e Espanha, como de todos os parceiros – nos quais também se incluem a Região de Turismo do Algarve (RTA) e o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) -, o balanço do Renature Monchique, até ao momento, «é positivo».

«Tem havido boa aceitação por parte dos proprietários, apesar disso nem sempre ser fácil, numa primeira abordagem, porque as pessoas estão traumatizadas, não só com o incêndio, mas, muitas vezes, também com a carência de apoios que cada vez mais se faz sentir», assegura João Dias Coelho.

Ainda assim, «as pessoas acolhem bem a ideia, até porque depois há toda uma economia local que se vai desenvolvendo».

No caso de Monchique, também há «uma comunidade estrangeira diversificada, que adere totalmente ao processo. Há pessoas que, não sendo de cá, vieram para cá viver e estão muito interessadas em manter aspetos tradicionais da própria agricultura e produção local. Isso é muito interessante».

«É evidente que há igualmente muitos proprietários portugueses que também aderem ao projeto», acrescentou o presidente do GEOTA.

Foi, precisamente, esta realidade que o Sul Informação encontrou no terreno, em 2020.

«Os números demonstram que as pessoas estão envolvidas no processo. Pelo que eu percebo, há uma grande aceitação por parte dos proprietários, até porque preferem ter alguma produção em terrenos que estavam abandonados ou que foram fustigados pelos incêndios. Por exemplo, os medronheiros, três ou quatro anos após serem plantados, começam a frutificar e a dar algum rendimento», disse, por seu lado, Paulo Alves, presidente da Câmara de Monchique.

O edil monchiquense não tem dúvidas de que «o projeto já deixou uma marca em Monchique, ao apoiar 60 proprietários, plantar mais de 200 mil árvores, com mais 75 mil a caminho».

Tudo de uma forma «simples e desburocratizada», que incentiva «à realização de uma gestão florestal sustentável num território desgastado pela ocorrência de incêndios rurais».

 

João Fernandes – Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação

 

Outra entidade parceira do projeto Renature Monchique é o Turismo do Algarve, cujo presidente, João Fernandes, assegurou hoje que «acarinha particularmente» a iniciativa, não só pelo que representa para a conservação da natureza, mas também por a ter acompanhado desde o início.

«O restauro destas paisagens beneficia em muito a competitividade da região, tendo em conta que os turistas de hoje procuram cada vez mais destinos que apostam na sustentabilidade», acredita.

Agora, com a renovação do apoio da Ryanair, que João Fernandes recordou que foi oferecido, logo após os incêndios, por Michael O’Leary, diretor executivo da companhia aérea, o trabalho no terreno vai continuar.

E isso é fundamental, segundo o presidente do GEOTA. já que este «é um projeto de resiliência, porque nós temos de estar sempre a acompanhar o processo, mesmo quando já temos as árvores plantadas».

«Sabemos, à partida, que 30% das árvores não vão vingar, pelo que temos de replantar e reforçar as equipas no terreno», concluiu João Dias Coelho.

 

 



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