É urgente falar sobre a depressão

Admitir um problema mental ainda é visto como sinal de fraqueza, desprestigiante, capaz de colocar em causa a nossa credibilidade profissional

Celebrou-se, a 10 de outubro, o Dia Mundial da Saúde Mental, data criada em 1992 pela Federação Mundial de Saúde Mental (World Federation for Mental Health). No dia 3 de outubro, assinalou-se o Dia Europeu da Depressão.

A existência destes dias é fundamental para o combate ao preconceito e estigma em torno da saúde psicológica. A saúde mental não é somente um problema de saúde, mas também um problema social, reflexo de uma sociedade cada vez mais exigente e distante, realidade que a pandemia da covid-19 intensificou.

A depressão é incapacitante e a principal causa de morte por suicídio (fonte: https://eurocid.mne.gov.pt/). A morte parece tão mais fácil quando a vida deixa de fazer sentido e é isso que a depressão nos provoca: baralha-nos, confunde-nos, troca-nos as prioridades até que o próprio ato de respirar torna-se irrelevante.

Do alto dos papéis sociais que representamos, admitir um problema mental ainda é visto como sinal de fraqueza, desprestigiante, capaz de colocar em causa a nossa credibilidade profissional. Errado. Tão errado! É urgente desmistificar a doença mental, falar abertamente do que sente, de como se vê o mundo nestes momentos em que parece que as paredes nos apertam e ninguém nos vê ou compreende.

É urgente sensibilizar para a sua prevenção e tratamento. É urgente que compreenda: não está só. É possível ultrapassar a depressão, a ansiedade, o stress. O primeiro passo é procurar ajuda, sem medo ou receio de julgamentos.

Quando somos a ilha, é difícil perceber como todo o processo se inicia. Gradualmente, tudo começa a tornar-se demasiado complicado. Tudo se transforma numa obrigação, sem qualquer prazer associado. As insónias instalam-se — a cabeça não consegue desligar —, o mal-estar é geral: vomitar por reflexo nervoso, sangrar do nariz ao acordar, distúrbios intestinais, infeções urinárias, candidíase e gastroenterites recorrentes tornam-se banais, tal como as idas ao médico, os exames a tudo e mais alguma coisa. A causa é mental, mas o reflexo é físico, psicossomático. A perda de peso foi talvez o meu sinal exterior mais evidente.

Tudo era um problema, as pequenas decisões do dia a dia eram difíceis, mas era necessário representar um papel, avançar para mais um dia até que avançar tornou-se impossível.

As poucas pessoas que conheciam o meu verdadeiro estado psicológico, sem máscara, não compreendiam a razão. Tudo parecia bem no exterior. A família, os amigos, um bom emprego, mas o processo de ansiedade, depressivo, estava instalado. O porquê? Agora percebo: exigia de mais de mim e permitia que exigissem demasiado; não soube colocar barreiras; importava-me sobremaneira com a opinião dos outros, com a dimensão profissional. Depois, com a depressão instalada, outras sombras ganharam peso, outros medos apoderaram-se da minha existência.

Cheguei a questionar continuar a viver, mas não queria morrer, aliás, tinha pavor da Morte, de ouvir falar Dela, de estar na Sua presença iminente, como se fosse algo contagioso. Esse estado mental não me permitiu acompanhar uma amiga em fase terminal porque acredita (e sentia), que também estava em risco. E de certo modo, estava, mas não como julgava.

A depressão quase destruiu a minha saúde e a minha vida. Não sei onde estaria hoje se não tivesse parado, se não tivesse pedido ajuda. Comecei com psicoterapia, passei pela hipnose clínica, experimentei acupunctura, yoga, meditação.

Tudo ajudou um pouco, minimizou os estragos, mas a verdadeira ajuda surgiu quando alguns anos depois, aceitei finalmente tomar medicação, que ainda hoje continuo a fazer, passados três anos. Foi um processo difícil.

Se não fosse o apoio constante do psiquiatra teria desistido logo nos primeiros tempos quando a antidepressivo começou a atuar. Não sei como será com outras pessoas, mas comigo, antes de melhorar, piorou bastante. Nunca a ansiedade foi tão forte, a instabilidade tão incapacitante. Mas, felizmente, persisti, insisti e não desisti.

Poderei afirmar que ultrapassei a depressão? Sim. A tempestade ficou mais longe no horizonte, mas ainda há um longo caminho a percorrer, um caminho de conquistas diárias, de treino de resiliência, de aceitação da vida tal como ela é. Há dias melhores, outros, nem por isso, mas a isto se chama, viver.
Espero conseguir alcançar a dose certa de serenidade, equilíbrio e aceitação para que no futuro, o Ciplalex saia definitivamente da minha vida. Hoje, ainda não é esse dia e, está tudo bem.

 



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