Associações ambientalistas repudiam mega projeto de abacates em Lagos

Zero, Regenearte e Plataforma da Água Sustentável estão contra este projeto

A consulta pública do processo de avaliação de impacte ambiental para um mega projeto de produção de abacates, de 128 hectares, nas freguesias  e Luz e Bensafrim e Barão de São João (Lagos), termina esta terça-feira, 26 de Janeiro, mas a sua instalação…«já está praticamente concluída». Este é um projeto que merece repúdio das associações ambientalistas porque, defendem, é «insustentável e viola regras de ordenamento do território».

A Zero e a Regenearte (Associação de Proteção e Regeneração dos Ecossistemas), que entregaram os seus pareceres no âmbito desta consulta pública, lamentam, em nota de imprensa, «que estejamos perante a avaliação de um projeto já praticamente executado, o que incluiu a remoção do coberto vegetal, despedrega, intervenções em linhas de água e modelação dos terrenos numa área de 128 hectares. Atualmente já estão instalados os abacateiros e o sistema de rega».

Estas intervenções, dizem, «careciam de uma Declaração de Impacte Ambiental (DIA) prévia, segundo o Regime Jurídico de AIA (Decreto-Lei n.º 151-B/2013 de 31 de Outubro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 152-B/2017 de 11 de Dezembro)».

Segundo o diploma, a «execução parcial ou total de projetos sujeitos a AIA (…) sem que tenha sido emitida a respetiva DIA” constitui uma contraordenação muito grave (alínea a) do ponto 2 do Artigo 39.º)».

Com efeito, «o facto da plantação exceder os 100 hectares e ter lugar em terrenos agrícolas não utilizados há mais de 5 anos torna esta Avaliação como uma condição prévia à intensificação agrícola. No âmbito da afetação de áreas da Reserva Ecológica Nacional o projeto insere-se parcialmente em áreas classificadas como áreas de máxima Infiltração e áreas de risco de cheia», dizem a Zero e a Regenearte.

«Por outro lado, a área do projeto engloba espaços rurais classificados, em termos de carta de ordenamento no PDM de Lagos, como espaço agrícola de conservação e espaço agroflorestal, figuras que não são consentâneas com a instalação desta plantação».

«Acresce ainda o facto de ter sido alterado o leito e destruídas as galerias ribeirinhas associadas a diversas linhas de água, nomeadamente na ribeira de Espiche, constituindo assim mais uma infração, desta vez à Lei da Água (Lei nº 58/2005) e às condicionantes previstas no próprio PDM de Lagos», acrescenta.

Esta instalação, cujo processo teve início em 2018 e que viu as plantações concluídas em Agosto de 2019, «teve, entretanto, a intervenção da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve, donde decorreu a instauração de processo de contraordenação, cujo resultado final se desconhece, e a imposição da necessidade de se promover a presente Avaliação de Impacte Ambiental».

Ainda assim, o comunicado destas duas associações ambientalistas é duro com as instituições públicas: «não se compreende como é que as entidades responsáveis pela fiscalização em matéria de uso e ocupação do solo, nomeadamente a CCDR Algarve e Direção Regional de Agricultura e Pescas do Algarve e também a Câmara Municipal de Lagos, não impediram o decorrer dos trabalhos ilegais ao ponto de permitirem, ao promotor do projeto, a instalação das estruturas de produção sem uma salvaguarda dos bens públicos e ambientais que só a posteriori estão a ser analisados, ou seja, quando a ação preventiva já não é possível».

Além das questões associadas ao ordenamento do território, «não se pode compreender que se opte pela expansão da monocultura intensiva do abacate numa altura onde é manifesta a crescente escassez de água nesta região, quando é reconhecido em vários planos e documentos de orientação estratégica que são previsíveis situações de seca mais frequentes, devendo-se apostar em culturas menos exigentes em água».

De resto, a «exploração agrícola depende da captação de água para rega a partir dos dois furos existentes, sendo que os valores apresentados para a capacidade de rega e sustentabilidade do projeto, suscitam preocupação quanto à sua disponibilidade no futuro. O facto das dotações licenciadas para os dois furos na herdade serem de momento suficientes face aos números para consumo apresentados pelo promotor – os quais nos suscitam algumas dúvidas – não garante que no futuro não seja necessário rever esses valores face à evolução das recargas efetivas dos aquíferos da região, nomeadamente no aquífero Almádena-Odiáxere».

 

Acesso à propriedade

 

Na análise efetuada ao EIA submetido pela empresa, «ficou claro que a plantação de abacateiros e o respetivo sistema de rega, já instalados, não mereceram um escrutínio adequado quanto à disponibilidade e qualidade da água necessária para uma produção sustentável. Há uma grande probabilidade de não haver água disponível para assegurar sequer a viabilidade da cultura, numa região onde a procura de água para rega é cada vez maior».

Neste contexto, ambas as associações podem que a declaração de impacte ambiental seja desfavorável.

Ao coro de críticas também se juntou a Plataforma Água Sustentável (PAS) que submeteu um parecer durante a consulta pública.

Num relatório de 10 páginas relativo ao descritor Recursos Hídricos, a PAS denuncia que «fica evidente no estudo que esta plantação irá contribuir tanto para a depleção gravosa dos níveis de água do sistema aquífero que mantém a cultura, como para a sua contaminação com fertilizantes e pesticidas pondo em causa o equilíbrio ecológico de toda a região e que não consegue alternativas de fornecimento de água».

A falta de rigor técnico no Estudo de Impacte Ambiental é também apontada, «chegando-se a encontrar diferenças significativas e inverosímeis entre as estimativas dos consumos de água para rega com a DRAP-Algarve a aprovar a assunção de pressupostos não técnicos para essas estimativas baseados na alegada experiência do promotor, mas que contrariam dados de outros produtores de abacate na região».

A PAS salienta ainda «que este é mais um exemplo da pressão que os grandes produtores, coadjuvados pela DRAP, estão a exercer para promover uma cultura de uma espécie alóctone que se adapta bem ao clima algarvio pelas suas temperaturas, mas que a região não pode suportar pela sua natural necessidade de água já que é uma espécie oriunda de regiões de elevada pluviosidade como são as regiões tropicais».

«O argumento, discutível, de que o abacate consome tanta água como os citrinos é recorrentemente usado por produtores e pela DRAP-Algarve mas apenas serve para demonstrar que se está a investir na perpetuação do erro da multiplicação das áreas de regadio numa região que já não o pode mais sustentar. Aliás, fica também claro no estudo que a tecnologia de rega adotada não garante um racionamento adequado do recurso água», diz a PAS.

«Este é apenas um dos casos que se tem conhecimento por existir um procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental que tem origem na denúncia exercida pelos movimentos de cidadania no Algarve ou seria mais uma plantação a surgir sem que fossem avaliadas as consequências para os recursos hídricos. A região debate-se com sérias necessidades, quer de informação técnica quer de fiscalização, e o incremento das culturas intensivas de regadio pode estar a condenar irremediavelmente o desenvolvimento sustentável de toda a região e das suas atividades económicas», conclui.

Quem quiser participar no processo de consulta pública, pode fazê-lo aqui.

 

 

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