Variações, Jorge Palma e Sofia Escobar nos 90 anos inquietos do Cineteatro Louletano

Os 90 anos do Cineteatro Louletano têm como mote a «Inquietação»

António Variações a subir ao palco do Cineteatro Louletano, ou antes, o ator Sérgio Praia com a banda que o acompanhou no filme, um concerto de tributo a Chico Buarque, com um coletivo de músicos brasileiros, as eliminatórias do Prémio Jovens Músicos da Antena2, Jorge Palma em diálogo com o Trio de Jazz de Loulé, Carlos Bica, com o seu trio de contrabaixo, giradiscos e saxofone tenor a comemorar os 250 anos de Beethoven, Sofia Escobar com um ensemble de professores do Conservatório de Música de Loulé.

Estes são apenas alguns dos destaques do primeiro semestre de programação do Cineteatro Louletano, que, ao longo de 2020, comemora os seus 90 anos de idade, mostrando a juventude e a «inquietação» das suas propostas culturais.

A programação foi apresentada esta terça-feira, ao início da noite, ao som da Orquestra de Jazz do Algarve, no Aderita Artistic Space, em Vale do Lobo, ou seja, um pouco longe do Cineteatro Louletano que, por estes dias, está a sofrer «obras de reforço estrutural», como explicou Dália Paulo, diretora municipal da Câmara de Loulé.

Mas a escolha do local teve a ver sobretudo com a própria filosofia do trabalho de programação cultural da equipa do Cineteatro Louletano, chefiada por Paulo Pires, e que passa por trabalhar com todo o território do concelho.

«Cultura não se faz apenas de programação, é preciso escutar as pessoas, perceber que dinâmicas há no território e, a partir daí, criar esta inquietação dos nossos 90 anos», explicou a diretora municipal.

As nove décadas do Cineteatro Louletano cumprem-se em 2020, não só com uma programação «para todos os gostos», como resumiu Adriana Freire Nogueira, diretora regional de Cultura do Algarve, mas também com nova imagem, que se traduz num novo logotipo.

«Eu e o Paulo [Pires] dizíamos, desde há dois anos, que tínhamos que mudar a imagem do Cineteatro, até porque o nosso público já não é o mesmo», revelou Dália Paulo, acrescentando que a nova imagem é da autoria da designer Susana Leal.

 

O programador Paulo Pires com o novo logotipo do Cineteatro Louletano

Vítor Aleixo, presidente da Câmara de Loulé, falando sobre os 90 anos «de um equipamento emblemático e central no Algarve», começou por elogiar «os funcionários municipais de grande qualidade e com grande paixão pelo que fazem». «Se não fossem eles, não seria possível Loulé ter a notoriedade nacional que atualmente tem».

O autarca chamou depois a atenção para o facto de haver «uma nova geração de louletanos que descobriu que Loulé é terra de oportunidades para se exprimirem nas mais diversas formas artísticas». Muitos desses louletanos, sublinhou, estarão agora presentes na programação do Cineteatro, seja a solo, seja em colaboração com outros artistas.

«Temos tido a inteligência de nos abrirmos ao exterior, mas também de valorizar o que temos cá», não se esquecendo, até, de «trabalhar com as escolas».

Recordando outros projetos culturais nos quais o Município está a investir – como a Bienal do Humanismo, o «Quarteirão Cultural», no centro histórico da cidade, a musealização dos banhos islâmicos e o «grande museu», com «linguagens de comunicação contemporânea» -, Vítor Aleixo salientou: «não tenho dúvidas de que Loulé, dentro de cinco ou dez anos, será uma cidade com uma paisagem cultural muito diferente».

Mas, afinal, qual vai ser a programação do Cineteatro Louletano? Paulo Pires, o programador deste espaço, começou por explicar que «não somos apenas um espaço de apresentação, mas também de criação, envolvendo-nos com os artistas». E isso transparece nas propostas.

Logo a 1 de Fevereiro, dia em que se comemora a elevação de Loulé a cidade, sobe ao palco «um concerto especial»: a transposição do filme «Variações» para um espetáculo ao vivo, com o ator que deu corpo e voz, na tela, a António Variações, interpretando ao vivo as músicas que canta na película, acompanhado pela banda que aí atuou também. «Não é uma coisa vulgar, este tipo de concertos».

Em Abril, mais ou menos pela altura em que Chico Buarque de Holanda estará em Portugal para receber o Prémio Pessoa, haverá um concerto de tributo ao grande artista brasileiro. No próprio dia 25 de Abril, será Jorge Palma a subir ao palco, com o Trio de Jazz de Loulé, em mais um espetáculo do ciclo «Longe é aqui», que junta valores nacionais a artistas locais.

Em Maio, chega uma proposta em estreia absoluta, com «uma dupla que nunca trabalhou junta»: a atriz Beatriz Batarda e o bailarino Romeu Runa. «Não sei se é dança, teatro, performance, de tão híbrido que é», comentou Paulo Pires. As duas representações, denominadas «Perfil Perdido» e encenadas por Marco Martins, terão lugar «após residência dos artistas em Loulé».

Em Junho, as eliminatórias do Prémio Jovens Músicos, organizado pela RTP/Antena2, saem pela primeira vez de Lisboa e vêm para Loulé, para o Solar da Música Nova e o Cineteatro.

 

No mesmo mês, apresenta-se Cristina Branco, que no ano passado esteve em residência neste concelho algarvio. Dessa residência, que o Sul Informação acompanhou, vai resultar o disco «Eva», cujo primeiro videoclip, a lançar dia 20 de Janeiro, como recordou Paulo Pires, foi «gravado na mina de sal gema de Loulé».

Daqui a uns meses, será então a vez de a artista estrear em Loulé o seu novo álbum. A programação do Cineteatro Louletano, explicou o seu principal responsável, também passa por «poder atrair estes nomes de referência».

Porque o que se pretende é fazer programação e estimular a criação, o Cineteatro também fez «três grandes encomendas». A primeira é a de Jorge Palma, com o Trio de Jazz, já falada acima.

A segunda foi dirigida ao trio de Carlos Bica, com Daniel Erdmann e DJ Illvibe, mais João Paulo Esteves da Silva ao piano, para assinalar os 250 anos de Ludwig von Beethoven. E o que vai ser apresentado, a 29 e 30 de Maio, será «uma releitura de Beethoven algo arriscada».

A terceira encomenda trará a Loulé a consagrada cantora e atriz portuguesa Sofia Escobar, que tem feito sucesso nos palcos de Londres e de toda a Europa.

Também em Maio, no ciclo «Longe é aqui», Sofia Escobar vai trabalhar com um ensemble de professores do Conservatório de Música de Loulé, para apresentar, no dia 20, véspera do feriado municipal, um concerto «muito especial» que revisita o universos dos musicais e das bandas sonoras de cinema.

Entre as novidades deste ano, Paulo Pires destacou igualmente os dois dias do Fórum de Dança Inclusiva (27 e 28 de Abril), que trará a Loulé o projeto madeirense «Dançando com a Diferença».

Haverá um workshop, uma palestra e uma masterclass, mas o que se pretende, mesmo, é promover «uma colaboração regular com este projeto, trazer para cá o seu know-how». «Vamos pôr as pessoas que estão nas instituições – nomeadamente na Unir, Asmal e Existir – a trabalhar com este corpo de bailarinos», revelou Paulo Pires.

No âmbito do novo ciclo «Implikação», que «percorre os anos de 2020 e 2021», haverá a apresentação de «peças que abordam questões que achamos serem chave hoje em dia», mas também debates. Neste primeiro semestre, o ciclo começa em Fevereiro com o tema «Europa», tendo como destaque a estreia, no Algarve, da peça «Canto da Europa», de Jacinto Lucas Pires, que por estes dias se estreia no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa.

Haverá ainda um debate que junta aquele dramaturgo, à antropóloga Eglantina Monteiro e ao professor universitário João Guerreiro, bem como um espetáculo «Isto só neste país», com o humorista Hugo van der Ding.

O ciclo «Implikação» voltará mais duas vezes neste primeiro semestre, em Abril com o tema «Fake News» e em Junho falando sobre «Turismo e Gentrificação». Os restantes temas, nos meses seguintes, serão a Burocracia, Novas Tecnologias, Refugiados e Igualdade de Géneros.

 

E porque «programar é olhar à volta», o Cineteatro Louletano vai estar «muito atento aos talentos locais», começando desde logo com o concerto de lançamento do novo disco de João Frade (a 30 de Janeiro), mas também à «arte para a infância».

Nesta última vertente, o objetivo, explicou Paulo Pires, será «qualificar desde muito cedo quem trabalha com a infância. Há muito pouca oferta no Sul do país». Assim, em Janeiro (27 a 29) e de novo em Julho, (20 a 26), haverá formação «transitiva» e «imersiva» em arte para a infância, com a Companhia de Música Teatral, de Lisboa.

Os 90 anos do Cineteatro Louletano têm como mote a «Inquietação». E foi lendo parte da letra da canção de José Mário Branco, que Dália Paulo deu o tom e o pontapé de saída para um ano de comemoração:

«Há sempre qualquer coisa que está pra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Cá dentro uma inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Mas sei
É que não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que eu tenho de fazer
7Qualquer coisa que eu devia resolver
Porquê, não sei
Mas sei
Que essa coisa é que é linda»

 

Fotos: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 

 

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