A contabilista que não era feliz e se transformou em agricultora biológica

Fátima Torres era contabilista, mas não era feliz. Por isso, há sete anos mudou radicalmente de vida e resolveu voltar […]

Fátima Torres era contabilista, mas não era feliz. Por isso, há sete anos mudou radicalmente de vida e resolveu voltar para Lagos e pegar na quinta da família, na zona do Sargaçal, para aí criar a sua Quinta das Seis Marias, uma exploração agrícola com seis hectares que se dedica à agricultura biológica e se destaca pela inovação.

«Trabalhava na Madeira, numa empresa offshore, como contabilista, mas estava farta e quis mudar. Tinha aquela sensação de olhar para o relógio e a hora nunca mais passar, às vezes nem queria ir trabalhar», recorda. Mas, quando resolveu mudar radicalmente de vida, não foi fácil: «ninguém me apoiou quando disse que queria fazer agricultura biológica: nem a minha mãe, nem o meu ex-marido (por isso é que ficou ex). Mas eu sou teimosa e investi nisto». Um investimento de que Fátima Torres, apesar do muito trabalho, não se arrepende e do qual fala com os olhos a brilhar.

Esta jovem agricultora foi convidada da mais recente Beta Talk, em Portimão, numa sessão que cruzou os destinos e as experiências de dois empreendedores algarvios, um ligado à terra, a Fátima Torres, outro ao mar, Pedro Bastos, sócio-gerente e diretor comercial da Nutrifresco – Comércio e Indústria de Pescados.

Na Quinta das Seis Marias (assim chamada em homenagem à sua mãe e às cinco filhas, Fátima e as irmãs), a empresária agrícola cultiva e produz mais de 80 variedades de hortícolas, aromáticas e frutas, que vende em mercados no Algarve, Lisboa e Porto, escolas, lojas de produtos biológicos, restaurantes, mercearias e pequenos supermercados. Desde há cerca de dois anos que tem uma loja na quinta, onde os consumidores podem ir abastecer-se diretamente com os produtos da época.

Na lojinha, cada cliente pode escolher os legumes ou frutas que pretende mas também pode optar por comprar um cabaz biológico, um dos produtos de sucesso da Quinta das Seis Marias, e que também distribui através do projeto PROVE. Fátima explica que «os cabazes têm sempre frutas da época, legumes e saladas variadas». E com a vantagem de, se as pessoas quiserem, poderem «colher os seus produtos». Os preços dos cabazes variam entre os 7,5 euros (5,5 kg) e os 15 euros (10 kg).

A crise, garante, não afetou o seu negócio: «nós nascemos com a crise, por isso tivemos logo de nos adaptar. Apesar da crise, no ano passado dupliquei as vendas e este ano já tripliquei. Já vendo para Lisboa e Porto, além do Algarve». E o sucesso tem sido tanto, que Fátima até já se uniu a outros colegas agricultores biológicos algarvios, «para levar os produtos deles para Lisboa». «Todas as semanas vai uma carrinha para Lisboa e agora também outro carro carregado. Isto é bom sinal», garante.

Só há um problema: é que a motorista nestas viagens para Lisboa e pelo Algarve é a própria Fátima, que assim, confessa, está «mais longe do que gosto mesmo de fazer, que é meter as mãos na terra». «Não gosto nada de fazer estas carreiras e tenho mesmo de arranjar um comercial para tratar disso».

 

Agroturismo e transformação de excedentes

Mas Fátima Torres não fica parada e já tem outros planos, para explorar áreas complementares à agricultura biológica, que continuará sempre a ser o negócio principal, e para garantir que na sua Quinta das Seis Marias nada se perde, tudo se transforma…e gera rendimento.

E foi assim que a jovem empresária agrícola candidatou ao Proder um projeto de agroturismo e de criação de uma pequena unidade de transformação. O projeto, no montante de 200 mil euros, foi aprovado e deverá arrancar em breve, logo que estejam prontas todas as licenças.

O projeto, segundo explicou à audiência da Beta Talk de Abril, que decorreu, como sempre, no espaço de Café-Concerto do Teatro Municipal de Portimão, passa por aproveitar as sete casas que já existem na propriedade para as transformar em alojamento para turistas, mas também pela criação, nessas casas, de uma «sala multifuncional» que sirva de cozinha agroindustrial para a transformação de excedentes da quinta, de modo a poder comercializá-los (os morangos, por exemplo, para produzir compotas) e também como local para dar formações, quer aos hóspedes, quer a pessoas de fora.

«A filosofia do agroturismo é mesmo isso: as pessoas ficam aqui alojadas, mas participam nas atividades da quinta. Podemos oferecer pacotes de fim de semana que incluam, por exemplo, workshops para aprender a fazer pão, compotas, ou outras coisas tradicionais do Algarve, como olaria e cestaria», explicou Fátima Torres. «Este é um segmento do mercado turístico muito pouco explorado em Portugal, mas que lá fora tem grande procura», acrescentou.

Para já, mesmo enquanto não há alojamento disponível, as pessoas são encorajadas a visitar a Quinta das Seis Marias, no Sargaçal, em Lagos. E Fátima desafia também quem quiser ser voluntário a ir até lá: cada quatro horas de trabalho voluntário são recompensadas com um cabaz de produtos biológicos. E quais são as tarefas? Arrancar ervas, por exemplo. Numa exploração agrícola biológica, onde os herbicidas são proibidos a bem da qualidade dos produtos, «há sempre ervas a monte!», garante Fátima Torres.

A Quinta das Seis Marias é gerida e trabalhada pela Fátima e pela sua mãe (que entretanto se converteu à agricultura biológica», com a ajuda de mais quatro funcionários permanentes. Mas Fátima, que atualmente é dirigente da Agrobio, sua representante no Algarve e formadora da associação, já conseguiu também converter dois vizinhos à agricultura biológica.

Uma das produções “estrela” da Quinta das Seis Marias são os seus morangos, produzidos sem quaisquer químicos e que, por isso, têm um sabor «que não tem nada a ver com os que se compram na maior parte dos sítios» (algo que os participantes da Beta Talk de Abril puderam comprovar, durante o wine break).

«O Algarve, mesmo a nível da agricultura biológica, tem uma enorme vantagem competitiva que é o seu clima, menos húmido e mais quente. No caso dos morangos, conseguimos produzi-los quinze dias antes de produtores da zona de Lisboa e um mês antes dos do Norte. E, graças ao nosso clima, também temos menos doenças e pragas».

 

Contactos:
Maria de Fátima Torres
Quinta das Seis Marias
Rua da Escola Primária, Sargaçal
8600-325 Lagos

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