O dia seguinte, o Algarve como nunca visto

Há que ouvir e fazer acontecer para que o Algarve seja mais do que um contribuinte para o PIB nacional ou um destino de férias

O Algarve foi redescoberto no dia seguinte às eleições legislativas.

A razão? O único distrito do país que se pintou de azul com uma expressiva maioria de votos no CHEGA. O azul que, até então, pintava os céus e o mar pintou os votos na região. Em termos concelhios, o CHEGA ganhou em seis concelhos: Portimão, Lagoa, Silves, Albufeira, Loulé e Portimão.

Por sua vez, a AD foi a segunda força/coligação mais votada também em seis concelhos: Monchique, Albufeira, Loulé, Faro, Tavira e Alcoutim (coincidindo apenas dois dos concelhos com os anteriores).

Se compararmos 2022 com estas eleições, em termos de deputados eleitos, verifica-se que é o Partido Socialista que transfere dois deputados para o CHEGA (partido com mais votos na região do Algarve), pelo que, cada um dos mais votados elege três deputados. A coligação da AD obteve a 3ª posição com três eleitos e 52.885 votos (22,39%), sendo que o CHEGA, com três deputados eleitos pelo Algarve, obteve 64.228 votos (27,19%).

Este resultado surpreendeu todo o país, mas não aqueles que estão no terreno e percebem todos os dias como a região está distante das decisões políticas e das prioridades da Estratégia Nacional.

O cartão “azul” resulta muito mais de uma incapacidade de qualquer um dos partidos do arco da governação de fazer passar a sua mensagem, do que de uma estratégia ativa de redes sociais bem-sucedida de um protagonista ou do facto de ter cabeças de lista de fora da região.

A monocultura do turismo também não deve ser o alvo de todas as críticas, mas a falta de visão e de decisão do poder central, e daqueles que o têm liderado para fazer os investimentos necessários em equipamentos e infraestruturas que possibilitem a criação de competitividade noutras áreas na região.

Regional e localmente, a falta de lideranças é assunto recorrente, assim como a incapacidade contínua das estratégias associadas ao financiamento europeu para contrariar a falta de inovação e modernização do tecido económico e produtivo regional.

No dia 11 de março, seguiram-se análises e comentários que demonstravam uma enorme surpresa, mas também a constatação do aumento de votos esperados no CHEGA. É no jornal Expresso de 14 de março que um título traz o Algarve para uma ribalta muito negativa e coloca sobre os holofotes uma realidade “nua e crua”: uma população com menos habilitações, com mais pobreza, mais imigração e trabalho sazonal. Tem mais jovens, mas menos população que a média nacional com o Ensino Superior.

Cresceu mais em habitantes, mas não tem casas para os novos residentes.

Tem avondo!

Esta é uma fotografia muito negra de um território apenas recordado no período de férias para ir a banhos (e agora também lembrado em período eleitoral). A penalização foi maior para quem estava no Governo à data das eleições, mas não deixa de fora as responsabilidades de políticas e políticos anteriores.

A redução da abstenção e a mobilização sentida revelava o desejo de mudança, mas, no Algarve, sobretudo uma forte chamada de atenção para tudo o que não tem sido feito.

A saúde, as infraestruturas, a habitação e a melhoria das condições de vida dos que vivem todos os dias neste território não podem continuar no esquecimento ou apenas a ser recordadas a 15 dias das eleições. Parece que os novos residentes já foram integrados na forma de ser Algarvio e perceberam muito bem o que significa: “tem avondo!” (já chega).

Não esqueçamos que, a seguir, temos as Eleições Europeias, e as Autárquicas para breve, por isso há que ouvir e fazer acontecer para que o Algarve seja mais do que um contribuinte para o PIB nacional ou um destino de férias.

10 de março de 2024, o dia em que o Algarve disse “não é não” a ambas as forças políticas do arco da governação, foi o dia em que as eleições nacionais também trouxeram uma nova realidade ao país.

O Algarve como nunca visto; tem avondo!

 

 

Autora: Alexandra Rodrigues Gonçalves é professora adjunta da Escola Superior de Gestão, Hotelaria e Turismo da Universidade do Algarve

 

Leia mais um pouco!
 
Uma região forte precisa de uma imprensa forte e, nos dias que correm, a imprensa depende dos seus leitores. Disponibilizamos todos os conteúdos do Sul Infomação gratuitamente, porque acreditamos que não é com barreiras que se aproxima o público do jornalismo responsável e de qualidade. Por isso, o seu contributo é essencial.  
Contribua aqui!

 



Comentários

pub