Os Turistas portugueses não abandonaram o Algarve

Mais um artigo de opinião de Vítor Neto, desta feita a desconstruir a ideia de que os turistas portugueses estão a fugir da região

Não se confirmam as previsões catastróficas dos arautos da desgraça, segundo as quais os turistas portugueses estavam a abandonar o Algarve, trocando-o pela Espanha, em consequência do “aumento dos preços”!

Os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) de Julho (e de Agosto também), sobre as dormidas de turistas nacionais no Algarve, assinalam, de facto, uma quebra de 1,8%, de Janeiro a Julho, correspondente a 44 mil dormidas, em relação a 2022, mas isso não justifica serem usados, como fez alguma Comunicação Social nacional, como prenúncio de uma catástrofe iminente. A tal ponto que até levou a que algumas entidades relevantes tivessem manifestado a sua “solidariedade” à região.

Mas uma coisa é certa: não podemos ignorar que, além de terem prejudicado a imagem do Algarve como destino turístico, essas notícias tiveram um impacto negativo no universo empresarial e na opinião pública que, com serenidade, devemos procurar ultrapassar.

Factos:

Houve efetivamente um aumento de preços nalguns setores relacionados com a atividade turística em consequência, desde logo, dos aumentos de custos no setor (energia, mão-de-obra, etc.) e das dinâmicas de concorrência do mercado. Mas isso não aconteceu apenas no Algarve, também se verificou noutras zonas do nosso país, em Espanha e noutros destinos turísticos europeus.

É evidente que esse fator pode ter alterado as opções de potenciais turistas que habitualmente procuram o Algarve e pode ter induzido alguns a optar por outros destinos, ou por outras soluções na região, compatíveis com os seus orçamentos, escolhendo segmentos mais acessíveis, por exemplo, na área do alojamento.

Temos razões para crer que isso possa ter acontecido, o que, afinal, pode explicar a forte presença de turistas nacionais no Algarve, que foi visível.

Os números do INE e a realidade

Para avaliar melhor a realidade, importa ter em conta um facto em geral pouco conhecido: as dormidas reais dos turistas no Algarve estão subavaliadas nas estatísticas oficiais. Os dados apresentados pelo INE sobre dormidas não refletem a realidade total da região, nomeadamente em relação ao alojamento e, mais concretamente, ao chamado alojamento local.

A contabilização feita pelo INE engloba (oficialmente) apenas as unidades com mais de 10 camas, deixando de fora as unidades com menos de 10 camas, que são a maior parte. Para além, claro, do alojamento “paralelo”, isto é, não registado.

Estamos a falar de muitas dezenas de milhares de dormidas de portugueses no Algarve que não estão contabilizadas e que confirmam a forte presença de turistas nacionais na região, para além dos números do INE.

O quadro é reforçado se pensarmos nos turistas não residentes, cuja forte presença é atestada pelos números positivos de chegadas ao Aeroporto de Faro – mais 18% de passageiros internacionais desembarcados, entre Janeiro e Julho deste ano, num total de 2,6 milhões, incluindo 160 mil nacionais (mais 31%/2022), certamente turistas.

Não deixa de ser significativo que esta região “à beira do desastre”, o Algarve, tenha registado em Agosto a mais alta taxa de ocupação-cama do país (75%).

Visibilidade do Turismo na região

Outro dado importante para avaliar a situação do Turismo é a perceção sobre os impactos da atividade turística nos vários setores para além do alojamento. E as informações que registamos nos contactos com os colegas empresários é que muitos setores económicos, não falando agora do alojamento, registaram em geral uma evolução positiva, tendo gerado bons resultados.

Estamos a falar de empresas da área do comércio e restauração, do fornecimento de produtos alimentares e bebidas de elevado consumo no Verão, de setores de eventos, de feiras e parques de animação e desportivos, etc.

E até houve provas “visuais”: a intensa circulação nas estradas algarvias, nomeadamente na EN125 e na Via do Infante, tendo esta tido um crescimento, nos primeiros nove meses do ano, de cerca de 20% em relação a 2022. Não é difícil imaginar que muitos eram turistas nacionais.

Estes elementos permitem sustentar a ideia de que os turistas nacionais (e também os estrangeiros) não só não abandonaram o Algarve, como, pelo contrário, continuaram a frequentá-lo em força.

Portanto, para além dos danos provocados pela agitação inenarrável, tentando fazer do turismo do Algarve um “caso”, importa regressar ao bom senso e ao sentido de responsabilidade.

O Turismo do nosso país, em particular do Algarve, atingiu importantes resultados, tem um peso extraordinário na economia, exigindo-se, por isso, sentido de responsabilidade e bom senso. Porque os pontos fracos são muitos, não só no Algarve, e os desafios imensos, impõe-se uma postura responsável da parte de todos, não só a nível regional como nacional.

O Turismo é uma realidade séria

Os dados do Turismo nos primeiros oito meses do ano confirmam não só a pujança do setor na economia do país, como o peso do Algarve, que está na primeira linha a nível nacional nos principais vetores, sendo perfeitamente natural que outras regiões, partindo de uma posição diferente, apresentem nalguns casos taxas de crescimento mais elevadas.

As expetativas de evolução até ao final do ano são animadoras, dando continuidade à recuperação de 2022, podendo até ultrapassar, em muitos casos, os dados de 2019 e projetar a atividade para um 2024 que se apresenta com perspetivas positivas (com a consciência, claro, de que podem ser postas em causa pela evolução do quadro económico-político internacional).

É uma batalha que exige a convergência de vontades de todas as regiões.

Algarve: os desafios que aí vêm exigem instrumentos adequados

O Algarve, perante situações complexas e de forte impacto na opinião pública, não pode continuar a atuar de forma dispersa e improvisada, como agora aconteceu perante o anúncio da debandada dos turistas portugueses da região.

Uma atitude que só favoreceu os prevaricadores e preocupou sobretudo os cidadãos algarvios, nomeadamente os empresários e em particular os jovens, sobre o “futuro” do Turismo e da economia da região.

A lição é evidente. Ficou demonstrada, mais uma vez, a falta não só de uma estrutura política regional, como de uma estratégia capaz de responder aos desafios do futuro.

O futuro do Algarve assim o exige!

 

Autor: Vítor Neto é presidente do NERA – Associação Empresarial da Região do Algarve

 

 

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