Com barragens mais vazias que nunca, Algarve exige construção de outra dessalinizadora

Vice-presidente da APA diz que a prioridade é executar projetos previstos no PRR

Barragem de Odeleite, esta terça-feira, 17 de Outubro – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

A dessalinizadora que vai ser construída em Albufeira ainda não saiu do papel, mas as forças vivas da região já exigem que se avance com uma segunda unidade deste tipo, com uma capacidade que permita ao Algarve ser autosuficiente, ao nível da água para consumo urbano.

Esta exigência foi feita esta quinta-feira, dia 19, em Faro, por autarcas, mas também por José Apolinário, presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve, pouco depois de Pimenta Machado, vice-presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, ter revelado que, neste momento, há 40 hectómetros cúbicos (hm3) acumulados nas barragens algarvias, quando, por ano, o Algarve precisa de 80 hm3 para garantir o consumo urbano – ou seja, humano.

A intervenção de Pimenta Machado, que falou sobre a seca em Portugal, com especial atenção ao Algarve, e nas medidas que estão a ser tomadas para a mitigar, deu o pontapé de saída para a H2O & Sustainability Summit (Cimeira da Água e Sustentabilidade), que termina hoje, sexta-feira, na capital algarvia.

Foi também na sessão de abertura da conferência que António Pina e Rogério Bacalhau, presidentes das Câmaras de Olhão e Faro, respetivamente, e José Apolinário exigiram um reforço da aposta na dessalinização, a curto prazo, e soluções que permitam trazer água do Norte do país para Sul, através de transvases.

«Parece-me evidente que o Algarve não pode ficar dependente do ciclo da água, até porque a nossa principal atividade é o turismo, que não se coaduna com uma eventual redução de água nas torneiras. Isso seria um prejuízo tremendo para o Algarve, que demoraria anos a recuperar», defendeu, à margem da sessão, António Pina, que esteve na sessão enquanto presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve – AMAL.

«Julgamos que está na altura de projetar já a segunda dessalinizadora, de modo a dar outra robustez e independência muito maior do S. Pedro. Não podemos estar à espera que chova», acrescentou.

Outra medida defendida tanto por António Pina, como por Rogério Bacalhau, é o transvase de água entre regiões, mais precisamente, entre o Alqueva e Odeleite, barragens que até pertencem à mesma bacia hidrográfica.

«Noutra partes do país, há água e, em alguns casos, um exagero dela, que até se torna um problema. Já existem algumas ligações entre bacias hidrográficas e parece-nos que, até para gestão das cheias, que são um fenómeno que acontece muito Norte do país, a dispensa da água de Norte para Sul é algo que o país deve estudar e desde já», desafiou o presidente da AMAL.

 

António Pina – Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação

 

Pouco tempo antes, durante a sessão, José Apolinário já havia defendido que é preciso «criar consensos na região e procurar modo de financiar uma segunda dessalinizadora de nível médio no Algarve».

Parte desse dinheiro poderá ser garantido pelo Algarve 2030, que tem «66 milhões de euros alocados para políticas da água», acrescentou o presidente da CCDR Algarve.

Rogério Bacalhau, que até preferia que se optasse por construir apenas uma dessalinizadora de grande capacidade, que permitisse produzir «70 ou 80 hm3 ao ano», pediu mesmo a José Apolinário que passe a  verba destinada a estes projetos, no Algarve 2030, «para 90 ou 100 milhões», porque «o custo de não ter água é superior a qualquer investimento».

É que, avisa o presidente da Câmara de Faro, a água que havia até ao início da semana nas barragens do Algarve só chega para seis meses de consumo urbano.

«Temos água para mais ou menos seis meses, nas barragens. Estamos com 40 hm3, quando as necessidades anuais do Algarve, só para o consumo urbano, são de 80 hm3», lembrou.

 

Rogério Bacalhau – Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação

 

Esta realidade já tinha ficado bem patente na apresentação feita por Pimenta Machado, que salientou que este «é o pior início de ano hidrológico de sempre [começa a 1 de Outubro], no que à disponibilidades nas barragens do Algarve diz respeito».

«Em relação ao início do anterior ano hidrológico, que terminou agora em Setembro, temos menos 8% de água acumulada nas seis barragens do Algarve [Bravura, Odeleite, Arade, Funcho, Beliche, Odeleite], o que responde a menos 35 hm3», revelou.

«Nos últimos 20 anos, a precipitação diminuiu 15%, em Portugal. Ao mesmo tempo, houve um aumento da temperatura, o que leva a que, por um lado, haja mais evaporação e, por outro, que seja necessária mais água para rega», acrescentou .

E se no país a diminuição é significativa, no Algarve tem-se vindo a assistir a «uma redução severa da pluviosidade».

«Estamos há 9 ou 10 anos consecutivos com chuva inferior ao normal, aqui no Algarve», ilustrou o vice-presidente da APA.

 

Pimenta Machado – Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação

 

«O sistema que tínhamos até à data, baseado nas albufeiras, estava previsto para uma determinada pluviosidade, mas as alterações climáticas já chegaram. Nós não demos por isso e começámos tarde. Mas se não quisermos, daqui a dez anos, continuar a dizer que começámos tarde, é preciso fazer mais do que já estamos a fazer e começar a projetar agora», defendeu, por seu lado, António Pina.

Para Pimenta Machado, a prioridade é executar as medidas previstas no Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve que têm financiamento garantido pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

«Acima de tudo, temos de focar as nossas energias naquilo que é a execução dos projetos que estão financiados no PRR. A grande aposta é no uso eficiente da água, quer no setor urbano, quer no setor agrícola, essa é a nossa proposta e deve ser a prioridade», começou por dizer, referindo-se às verbas destinadas à redução de perdas nas redes de água.

«Depois, é trabalhar nas novas fontes, nas novas origens de água [dessalinizadora e ligação do Pomarão a Odeleite], e no uso de Água para Reutilização», ou seja, águas residuais tratadas.

No que toca à dessalinizadora prevista, defendeu, «será uma grande central. São 16 hm3 e já está preparada do ponto de vista estrutural para aumentar para 24 hm3. Esta é a grande aposta, além da ligação ao Pomarão. No final do dia, é aqui que devemos concentrar toda a energia na execução dos projetos».

Quanto às exigências feitas pela região de construção de uma nova dessalinizadora e de transvases de Norte para Sul, o vice-presidente da APA é cauteloso e não se compromete com nada.

«Não há tabus aqui. Obviamente que estamos abertos a discutir outras soluções, naturalmente estamos sempre abertos e disponíveis», disse, insistindo sempre que «convém, acima de tudo, concentrar o nosso esforço na execução dos projetos que trabalhámos em 2019», ou seja, os que estão previstos no PRR.

 

 

 

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