«Meias medidas» não são eficazes para conseguir geração livre de tabaco, dizem especialistas

Especialistas lamentam recuo na proposta da lei do tabaco em relação à venda nos postos de combustíveis

Especialistas defenderam hoje que «meias medidas» não são eficazes para promover uma geração sem tabaco em 2040, lamentando o recuo na proposta da lei do tabaco em relação à venda deste produto nos postos de combustíveis.

O jornal Público noticia hoje que a interdição de venda de tabaco nas estações de serviço dos postos de abastecimento de combustíveis acabou por ser retirada da versão final do documento de alterações à lei do tabaco que esta quinta-feira foi enviado para a Assembleia da República.

«O recuo na lei proposta pelo próprio Governo é muito preocupante porque mostra que o Governo não soube defender a lei», afirmou à agência Lusa Sofia Ravara, coordenadora da Comissão de Tabagismo da Sociedade Portuguesa de Pneumologia.

A especialista defendeu que estas «medidas robustas» de prevenção de tabagismo têm que ser antecipadamente preparadas, fazendo estudos sobre a opinião da população e envolvendo a população e os vários atores económicos e sociais cujas medidas vão ter impacto na sua atividade económica para depois saberem quais são os seus argumentos e as suas posições e saberem rebatê-las, fazendo também estudos.

«Tem que sempre haver países que sejam pioneiros para implementar as medidas mais avançadas, aquelas que poderão fazer a diferença na prevenção do tabagismo e também na cessação tabágica, ajudar os fumadores a deixar de fumar, poder reduzir a prevalência de tabagismo e as suas consequências sociais, económicas e também ambientais», bem como conseguir «desnormalizar o consumo» de um «produto legal, mas altamente aditivo e letal», que ainda tem «uma grande aceitação social», salientou.

Contactado pela Lusa, o coordenador da Comissão de Tabagismo da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia Paulo Côrrea, defendeu que «meias medidas não são eficazes para promover uma geração sem tabaco em 2040», referindo que «cabe ao Governo de Portugal e à Assembleia da República proteger a saúde de todos os portugueses».

Paulo Côrrea deu o exemplo do Brasil, onde as políticas de controlo do tabagismo avançaram muito, apesar de ser o segundo país produtor mundial e um dos maiores exportadores de tabaco.

«Esse avanço só foi conseguido graças à articulação de vários órgãos da sociedade civil. Então é importantíssimo que a sociedade de Portugal toda entenda que o controlo do tabaco exige uma articulação entre as diversas entidades» envolvidas, defendeu o pneumologista e investigador que criou uma organização não-governamental de promoção da saúde.

Por outro lado, defendeu que a sociedade portuguesa tem que entender que «deixar a indústria livre para aferir lucros faz com que o Governo português tenha que gastar muito mais com o tratamento dos fumadores».

«A imprensa e a sociedade civil têm um papel importantíssimo a exercer, denunciando e evitando a interferência da indústria nas políticas públicas», defendeu.

Hilson Cunha Filho, dirigente da Confederação Portuguesa de Prevenção do Tabagismo, disse, por seu turno, que «os pontos de venda [de tabaco] são um assunto que está na agenda, mas que o Governo nunca discutiu», apesar de se saber que «mais cedo ou mais tarde tem que avançar em relação à imensa oferta de produtos do tabaco que existe na comunidade portuguesa».

«Vende-se tabaco em todos os lugares e de todas as formas e as pessoas não estão preparadas para fazer esta venda. Não estão preparadas para limitar o acesso a menores», uma preparação e responsabilidade que disse nunca ter sido exigida, disse o investigador.

Também lamentou que o Governo não tenha tido força para levar a medida adiante e disse ser “muito complexo” avançarem com medidas sem consultarem e discutirem com os especialistas envolvidos na implementação das políticas na área tabagismo.

«Depois é preparar os agentes comerciais, a indústria para aquilo que é necessário ser implementado, não digo consultá-los porque a indústria do tabaco no seu todo não deve ser fazer parte da decisão política», defendeu.

Para Hilson Cunha e Filho, a decisão política «tem que ser comunicada como deve ser e deve ser medida antes de avançar», porque, vincou, «esses avanços e recuos por parte do Governo só prejudicam a estratégia como um todo e mostram uma fraqueza daqueles que tem que mostrar que sabem o que estão a fazer».

«Do lado de lá, cada vez mais sentimos que existe uma verdadeira e efetiva ação de ‘lobbying’ por parte da indústria e de todos os outros agentes comerciais que fazem parte dessa indústria do tabaco. É desagradável ter que admitir, mas é isto que acaba acontecendo», lamentou o investigador.

O ministro da Saúde confirmou hoje, no Porto, o recuo na proibição de venda de tabaco em postos de combustíveis, por se ter constatado que havia muitas localidades onde não existiam alternativas.

«Se fosse levada por diante a ideia de proibir a venda nas bombas de gasolina, havia muitas localidades onde o sítio para comprar tabaco ficava demasiado longe», justificou Manuel Pizarro, exemplificando que pessoas que por motivos laborais só pudessem comprar tabaco à noite ficariam sem oferta.

 



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