Foi o que alguém me disse… Monchique é um vulcão?

Como é que rochas magmáticas, formadas no interior do planeta, surgem à superfície?


Há cerca de 200 milhões de anos (Ma), no Jurássico, a disposição dos continentes era bastante distinta da atual. Tão diferente que todos os continentes formavam um único supercontinente, a Pangeia.

Nesta altura, e devido ao afastamento das placas tectónicas, começou a fratura e separação deste supercontinente, com o afastamento da América do Norte da Europa e do Noroeste de África, o que, por sua vez, fez nascer um oceano nosso conhecido, o oceano Atlântico.

Tal como todos os eventos geológicos, o processo de “oceanização” (abertura de um oceano) desenvolve-se a uma escala temporal muito longa, e só no Cretácico Inferior, entre os 145-135 Ma, é que o Atlântico Sul abriu, com a separação da América da África.

Assim, constata-se que as fraturas que deram origem ao oceano Atlântico não se propagaram rapidamente, atravessando os continentes de um extremo ao outro, como acontece quando se parte um prato, por exemplo. Trata-se sim, de um afastamento lento e progressivo das placas tectónicas, com uma dinâmica idêntica a quando se abre um fecho de um casaco.

Milhões de anos mais tarde, no Cretácico Superior (70-74 Ma), e ainda relacionado com a abertura do oceano Atlântico, a Península Ibérica encontrava-se em movimento de rotação em direção ao resto da Europa. Esta movimentação, aliada a outros eventos geológicos, promoveu uma fase de intensa atividade magmática. Um exemplo muito importante desta atividade está marcado em Portugal na forma do complexo ígneo de Monchique.

A questão que surge neste momento é: como é que estas rochas magmáticas, formadas no interior do planeta, surgem à superfície? Para isso, é necessário perceber que o nosso planeta Terra tem uma estrutura interna composta por diferentes camadas, tal como uma cebola. De uma forma simples, as três principais divisões são: crosta (continental e oceânica), manto (inferior e superior) e núcleo (interno e externo).

O magma que originou o sienito nefelínico de Monchique nasceu numa câmara magmática situada na parte superior do manto, entre 30 a 45 quilómetros de profundidade, uma distância parecida a ir de Lagos a Monchique. Após o seu nascimento, as rochas de Monchique subiram até níveis superiores da crosta, entre os 3 a 10 km de profundidade, através das fraturas que foram geradas durante toda a evolução geológica descrita anteriormente. Esta subida do magma é devida à diferença de densidades existente entre o magma e as rochas que ele atravessa.

O magma, por estar muito quente, entre 800 e 1200 ºC, é menos denso que as rochas encaixantes e, por isso, tende a ascender, tal como acontece quando aquecemos água para fazer os nossos chás, quando a água ferve, expande e ascende.

Em seguida, o magma instalou-se na crosta superior durante alguns milhões de anos, o que permitiu que o seu arrefecimento fosse lento e, consequentemente, desenvolver minerais com uma dimensão visível a olho nu.

Junto à capela das Caldas de Monchique, é possível verificar os dois tipos de sienitos nefelínicos de Monchique, os quais se distinguem por possuírem minerais com dimensões diferentes. As diferenças devem-se ao facto de a subida e instalação do magma ter-se realizado em dois momentos magmáticos distintos.

Por fim, o aparecimento do complexo ígneo de Monchique à superfície ocorreu devido a processos de erosão diferencial, ou seja, as rochas sedimentares que circundam este complexo ígneo são menos resistentes aos processos erosivos que os sienitos nefelínicos e, por isso, sofreram mais erosão, deixando a serra de Monchique mais proeminente.

Verifica-se, assim, que Monchique não é vulcão. O complexo ígneo de Monchique não apresenta as características que tipicamente definem um aparelho vulcânico, nomeadamente cone vulcânico, chaminé vulcânica e cratera, nem apresentam rochas com minerais não percetíveis a olho nu.

Agora que já podemos emendar os nossos amigos, dizendo-lhes que Monchique nasceu a um pouco mais de 30 km de profundidade e que não é um vulcão, poderá colocar-lhes a seguinte questão: onde é que, no Algarve, é possível ver e tocar num antigo vulcão?

Aposto que não saberão!

 

Autor: Lourenço Crispim (Centro Ciência Viva de Lagos)

NOTA: Este artigo foi desenvolvido no âmbito do projeto PaNReD – Património Natural transformado em Recursos Didáticos Digitais, financiado pelo Programa CRESC Algarve 2020, através do Portugal 2020 e do Fundo Social Europeu (FSE).

 

 

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