Diretora Isabel Palmeirim demite-se após carta aberta dos estudantes de Medicina

«Pedimos que não utilizem os estudantes como arremesso neste conflito», lê-se na carta dos alunos

Isabel Palmeirim apresentou a demissão de diretora da Faculdade de Medicina e Ciências Biomédicas da Universidade do Algarve e do Mestrado Integrado em Medicina. Em causa, está uma carta aberta, do «grupo de estudantes» deste curso que diz estar a «ser coagido a ingressar» no Hospital Garcia de Orta (Almada) para cumprir o plano curricular, em detrimento das vagas disponibilizadas» pelo Centro Hospitalar Universitário, pedindo ainda para não ser «arma de arremesso» entre o CHUA e o ABC.

O pedido de demissão foi revelado pela própria Isabel Palmeirim em declarações ao Sul Informação. 

«Apresentei-o ontem à noite ao senhor reitor», disse.

Contactada pelo nosso jornal, a Universidade do Algarve apenas disse que qualquer destituição se processa «nos termos definidos no artigo 50 dos Estatutos» e que tem conhecimento da carta aberta, apesar de não ter sido «enviada para a reitoria» e não estar «assinada».

Segundo Isabel Palmeirim, que também fez parte da direção do Algarve Biomedical Center (ABC), o pedido de demissão surge porque a carta vem assinada em nome «do grupo de alunos» e não «de um grupo de alunos».

A carta aberta, enviada às redações, não vem assinada, mas nela o ou os autores dizem estar a ser «coagidos a ingressar» no Hospital Garcia de Orta, «fora da região, para cumprir o plano curricular», em vez do CHUA, mais perto geograficamente.

Nas suas declarações ao nosso jornal, Isabel Palmeirim assumiu que a opção Garcia de Orta foi «apresentada» aos estudantes, mas que não houve «qualquer coação».

Essa decisão só foi tomada, de resto, porque o Governo decidiu integrar «o Garcia de Orta no consórcio do ABC», segundo a diretora demissionária, e também porque a «dificuldade de cooperação» entre o CHUA e a UAlg é «total».

«Perguntámos aos alunos a sua origem, onde seria mais fácil e o certo é que temos alguns estudantes de Lisboa, por exemplo. Além disso, responsabilizamo-nos pelas despesas», explicou.

Isabel Palmeirim colocou ainda em causa a origem da carta, uma vez que não vem assinada. «A mim, o que os alunos me estão a dizer é que não sabiam de nada», disse.

Nessa missiva, o grupo de alunos, que quer manter o anonimato, afirma a sua «posição de neutralidade, afastando-se de qualquer juízo ou tomada de posição», mas confessa que existe, «há infindáveis meses», um «processo litigioso» entre o CHUA e o ABC (um consórcio que junta o Centro Hospitalar, a Universidade do Algarve e agora também o Hospital Garcia de Orta) que está a afetar os estudantes.

«Apelamos a todas as partes que cumpram com os seus valores estratégicos, sem prejuízo da acessibilidade aos cuidados de saúde, permitindo que os estudantes que ingressaram no Mestrado Integrado em Medicina da Universidade do Algarve possam usufruir da capacidade formativa do Centro Hospitalar Universitário do Algarve (CHUA), como estipulado».

Também contactado pelo Sul Informação, o Conselho de Administração do CHUA disse desconhecer esta situação, apesar de também ter recebido a mesma carta «no e-mail geral».

O Centro Hospital Universitário garante estar «disponível para receber os alunos para cumprirem os seus estágios».

«Iremos receber todos os que queiram connosco estagiar, quer seja da Universidade do Algarve ou de qualquer outra universidade nacional ou internacional que nos faça o pedido, como tem sido até agora», lê-se numa resposta enviada ao nosso jornal.

O CHUA assume, contudo, que compreende «os anseios» dos estudantes, expressos nessa carta aberta.

«Sabendo que a maior parte dos alunos têm residência e atividade assistencial já em simultâneo na região, compreendemos os seus anseios, sendo que o CHUA e a UAlg mantêm a colaboração institucional normal. Agendámos já nova tentativa de reunião da Comissão Bilateral Formal com a Direção da Faculdade de Medicina para preparar o novo ano letivo», diz o Conselho de Administração. 

O Centro Hospitalar Universitário do Algarve vai também reunir-se com Paulo Águas, reitor da UAlg, para «perceber a veracidade destas afirmações».

«O CHUA mostrou-se disponível para receber os representantes dos alunos para os ouvir, sendo apenas destinatário do mesmo. O CHUA recebeu ainda contacto de alunos preocupados com a situação, estando empenhado a continuar a trabalhar em prol do ensino pré e pós graduado de excelência na região», lê-se também. 

Mas a história não fica por aqui.

Em declarações ao Sul Informação, José Ponte, fundador do Mestrado Integrado em Medicina da Universidade do Algarve, acusou o CHUA de ser o «originário» desta carta, estranhando o facto «de não vir assinada».

«A carta não é representativa dos alunos e tem uma força relativa», considerou ainda.

Questionado sobre isto, o Conselho de Administração do CHUA apenas disse que não tem conflitos «de qualquer natureza com a Faculdade de Medicina, com algum dos seus membros, sequer com os que compõem o ABC, com o qual nem temos já processo ou litígio».

No meio da polémica, estão os alunos que, na carta aberta enviada, pedem para não serem «arremesso neste conflito».

O estudantes rejeitam «que a qualidade e futuro da formação médica no Algarve seja desvirtuada por conflitos institucionais alheios ao contexto académico, com imposição de deslocação até à região de Lisboa para cumprir o 5º e 6º ano de formação médica, desvirtuando o propósito da fixação de médicos na região, inerente à fundação do Mestrado Integrado em Medicina na Universidade do Algarve».

«Reiteramos a necessidade de diálogo para um entendimento célere, sereno e diplomático entre todas as partes, visando as respetivas missões institucionais protetoras da saúde no Algarve», conclui a carta aberta.

A polémica entre o ABC e o CHUA resulta do braço de ferro entre o atual presidente do ABC, o médico Nuno Marques, e o Conselho de Administração do CHUA, de que Sul Informação foi dando conta.

 

 



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