Hospitais do Algarve “oferecem” «projetos diferenciadores» para atrair médicos

Ana Castro também quer discutir com o Governo soluções para a dificuldade de encontrar casa no Algarve

Proporcionar aos médicos, nomeadamente aos mais jovens, a oportunidade de «liderar projetos diferenciadores e implementá-los» pode ser a chave para convencer mais clínicos a ingressar nos quadros do Centro Hospitalar Universitário do Algarve (CHUA), acredita Ana Castro, a nova presidente do Conselho de Administração dos hospitais do Algarve.

No entanto, isto não será, por si só, o suficiente para fixar cá estes profissionais. Outra questão, que já levou a nova administração do CHUA a apelar à tutela, é a da dificuldade em encontrar casa e do preço das habitações, na região algarvia.

Numa entrevista ao Sul Informação, a primeira de fundo após ter tomado posse como presidente do CA do CHUA, em Julho, Ana Castro revelou qual a sua visão sobre a falta crónica de médicos no CHUA e quais as soluções que podem ser implementadas.

Afinal, assegurou, a sua intenção é «fazer alguma coisa» para melhorar os hospitais algarvios, tendo em conta que considera que «as pessoas que moram no Algarve também merecem ter uma saúde em condições».

Quanto à atração de mais médicos, Ana Castro não duvida de que «há aqui várias coisas favoráveis e que podemos fazer, que têm a ver, sobretudo, com captar os médicos mais jovens, pelos diferentes projetos que podem fazer aqui».

«Este centro hospitalar, por ter um quadro de pessoal um pouco mais curto, tem uma vantagem perante outros. Quem vem para cá pode fazer  projetos mais facilmente, lidera mais facilmente iniciativas. Nós estamos a apostar nas pessoas mais jovens, também, para que eles queiram ficar para liderar projetos diferenciadores e implementá-los. Estamos a permitir que façam isso», disse.

«Eu acho que são os projetos que fazem as pessoas ficar no Serviço Nacional de Saúde. Não é o dinheiro, o dinheiro é igual para todos», acredita.

 

Ana Castro presidente do CA do CHUA – Foto: Nuno Costa | Sul Informação

 

Por outro lado, há a questão da habitação, uma provação que Ana Castro sentiu na pele, uma vez que, também ela, veio de fora da região.

«Outra dificuldade – que já transmitimos à tutela, pedindo, também, a manutenção das vagas para zonas carenciadas -, tem a ver com a dificuldade que as pessoas novas e que queiram vir para cá têm em arranjar casa. Isto é uma dificuldade crónica aqui no Algarve que eu experienciei na primeira pessoa, sei bem o que é que lhes acontece», disse ao Sul Informação a responsável máxima pelos hospitais públicos do Algarve.

Ou seja, as pessoas «ganham o mesmo e pagam muito mais de casa. E tem uma dificuldade maior em arranjar uma casa».

«O Algarve é muito bonito, vir cá de férias é espetacular. As pessoas vêm uma semaninha, mas não pagam uma casa todos os meses. Se pagarem uma casa todos os meses vão perceber como é difícil. Há algo essencial, que tem a ver com conseguir arranjar uma casa, pelo menos, anualmente, porque habitualmente só se conseguem casas cá ali de Outubro até Maio. E as pessoas, no intervalo, não podem andar com as coisas às costas», considerou.

Também é «importante» manter o Algarve na lista de zonas carenciadas e onde são oferecidas aos médicos especialistas que ali se fixarem benesses como mais dias de férias e um incentivo salarial, por um período de três anos.

«Eu acho que se tem de repensar um bocadinho esta área de habitação, porque é difícil atrair profissionais, seja de que setor for, se não tivermos depois condições para as pessoas viverem. Torna sempre tudo mais complexo. O custo de vida aqui é muito mais caro. A alimentação, as casas, tudo é muito mais caro e as pessoas recebem o mesmo», ilustrou.

Ainda assim, há outras questões que têm sido apontadas por diferentes responsáveis na área da saúde, como justificação para as dificuldades crónicas do Algarve em atrair mais médicos: a turbulência interna nos hospitais da região, a grande competição que é feita pelas unidades de saúde privadas e a inexistência de um Hospital Central, moderno e bem dimensionado, entre outras.

No que toca à turbulência interna, Ana Castro desvaloriza a questão.

«Eu acho que o que se passa aqui não é diferente em relação aos outros hospitais do país. Uma instituição é a mesma coisa que uma casa: quanto mais gente lá puser, maior a probabilidade de as pessoas se aborrecerem. Pois, o CHUA tem 4700 funcionários, portanto, há de ser normal que haja tensões, como há em qualquer outro hospital e centro hospitalar de grandes dimensões», disse.

 

Hospital de Faro – Foto: Nuno Costa | Sul Informação

 

No que toca ao Hospital Central, embora admita que a modernização dos equipamentos pode ser um factor de atração, a presidente do CA do CHUA acredita que as pessoas «viriam na mesma se modernizássemos os que cá estão neste momento».

«Um hospital central vai resolver um problema estrutural, ou seja, das paredes. Vai ser mais bonito, mais apelativo. Mas continua com o mesmo problema, continua com falta de pessoas», acredita.

«Eu acho que é preciso, primeiro, motivar as pessoas, fazê-las perceber que há investimento à séria no Algarve. E, neste momento, investimento à séria não passa só por paredes, passa também pelos equipamentos, passa por valorizar quem cá temos. Enquanto não fizermos isso, não adianta ter umas paredes espetaculares. Porque, e depois? Quem é que eu vou meter lá a trabalhar?», questionou.

Neste campo, «foi feito um plano de investimentos para tentar começar a renovar e ter outro tipo de equipamentos que não temos. Há o caso da angiografia, por exemplo, que é um equipamento que queremos ter para poder apoiar a cirurgia vascular».

Quanto à prática de medicina em instituições privadas «é mais atrativa, no sentido daquilo que paga aos profissionais».

Daí ser importante ter «projetos aliciantes», uma vez que há muitos clínicos que preferem o SNS porque «fazem operações que não fazem lá fora, porque tudo o que é complicado e complexo é no SNS e os médicos quando se formaram foi na perspetiva das situações complexas».

«Há muito poucos médicos que achem piada a estar no consultório a fazer consultas e a tirar o sinalzinho. Obviamente que eu percebo que, do ponto de vista remuneratório, acaba por ser mais atrativo ir para o privado, porque lá conseguem pagar aquilo que eu não pago, não é? Porque o que eu pago é igual em todo o lado. Agora, acredito que com projetos diferenciadores se possam trazer muitos médicos».

Quanto aos clínicos que já estão na casa, Ana Castro quer «majorar o valor hora dos meus médicos do hospital».

«Foi essa a proposta que apresentei à senhora ministra, para podermos discutir, embora neste momento, com a atual conjuntura, não seja a altura certa para ela sequer poder pensar em ouvir-nos: mas estamos a tentar majorar o valor hora dos nossos médicos da casa, para que não sejam precisos prestadores de serviços para fazerem o trabalho adicional», concluiu a presidente do Conselho de Administração do CHUA.

Na mesma entrevista, Ana Castro revelou as medidas que foram tomadas pelos hospitais do Algarve para enfrentar a segunda vaga da Covid-19, como o Sul Informação já deu conta.

 

 

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