Médicos a menos e problemas a mais obrigam a investimento nos hospitais do Algarve

Bastonário da Ordem dos Médicos visitou o Hospital de Faro e defende que investimento no Algarve «é uma prioridade»

O bastonário da Ordem dos Médicos considera o investimento nos hospitais do Algarve «uma prioridade» e exige que o Governo «tenha em atenção a capacidade de resposta que o SNS tem de dar numa região que, para além de tudo [turismo e visibilidade internacional], tem um setor privado muito forte, que entra, facilmente, em concorrência com o setor público».

Miguel Guimarães visitou esta terça-feira o hospital de Faro, onde encontrou «deficiências importantes na área do serviço de urgência», mas também uma falta generalizada de médicos especialistas que afeta profundamente a capacidade de resposta desta unidade de saúde.

«É preciso que se consiga, de facto, melhorar a capacidade de resposta através da contratação de capital humano, para que a elevadíssima pressão que neste momento os médicos sentem, seja menor. Porque com este elevado nível de pressão, é muito difícil fixar recursos humanos no Algarve», acredita.

Esta é uma das sugestões deixadas pelo Bastonário da Ordem dos Médicos após a sua visita ao hospital algarvio. A outra é que «há que ouvir mais os médicos», tendo em conta que estes não têm «sido devidamente ouvidos, para participar naquelas decisões que têm impacto na clínica do dia-a-dia».

No que toca às deficiência que encontrou, Miguel Guimarães chamou a atenção para as que existem nas urgências, onde, na visão do bastonário, se gasta demasiado dinheiro na contratação de médicos à hora. «A contratação de serviços externos, através de empresas, representa um valor muito elevado, que no primeiro semestre deste ano rondou os 3 milhões de euros e, em 2017, 6,8 milhões de euros».

Também «já conhecidos» são os problemas dos blocos de partos do país, nomeadamente no do Hospital de Faro, uma das situações mais graves do país, em conjunto com os hospitais de Amadora-Sintra e de Braga.

«Depois, existem muitas carências de capital humano ao nível da obstetrícia, da medicina interna, da anestesiologia – o que condiciona, de forma global, o que é o movimento cirúrgico do hospital -, da pediatria, da dermatologia, da ortopedia, na neonatologia, na otorinolaringologia, na oftalmologia, na anatomia patológica, na urologia e na hematologia», enumerou.

«Uma especialidade que ainda não existe em termos de organização de serviços, mas que já tem cá uma especialista, é cirurgia pediátrica. Este especialidade é vital para o Algarve. Não é aceitável que crianças que podiam ser tratadas cá, tenham de se deslocar 300 quilómetros para ir a Lisboa», acrescentou.

Desta forma, considerou, «é fundamental que o Ministro da Saúde atenda a estas situações, que reforce os recursos humanos, que tenha uma atenção especial à cirurgia pediátrica».

O Governo até tem aberto vagas para o Algarve, mas elas ficam, muitas vezes, por preencher. Até agora, e apesar de terem passado mais de dois meses desde o lançamento da medida,ainda não foi ocupada qualquer vaga no Algarve ao abrigo do regime de mobilidade especial, que dá condições muito vantajosas a médicos que aceitem mudar-se para zonas mais carenciadas.

As dificuldades que o Algarve tem em atrair médicos está intimamente ligada, na visão de Miguel Guimarães, à elevada pressão que existe nos hospitais da região e às dificuldades que estes enfrentam.

E como se inverte a situação? «Antes de ontem ouvi o nosso primeiro-ministro a dizer que ia tentar captar os jovens que emigraram em determinado período. E pensei para mim: Nós vamos tentar atrair os jovens que emigraram. Muito bem, é positivo para o país. Mas o que é que estamos a fazer para fixar os nossos jovens no nosso país? Nas zonas mais carenciadas, porque é que não usamos os mesmos argumentos, em termos de incentivos?», questionou.

É que, lembrou, o incentivo anunciado, determina «para além de outras coisas, que os jovens irão pagar menos 50 por cento de impostos durante 10 anos».

Ou seja, «há uma desigualdade naquilo que é a possibilidade que temos de tentar fixar os médicos nas zonas mais carenciadas, como é o caso do Algarve, que que não consigo entender. Porque se nós oferecemos melhor condições a estes médicos, é óbvio que eles ficam no SNS. Até porque o sistema público, para estes jovens, é muito importante, porque se trabalha em equipa, com outros médicos e com outros profissionais de saúde. E daqui é que resulta uma boa medicina».

A opção por dar incentivos aos médicos que vierem de fora para reforçar os hospitais do Algarve pode nem sempre ser bem aceite pelos que já cá estão a aguentar o barco há muitos anos, admitiu o presidente da sub-região de Faro da Ordem dos Médicos.

Ulisses de Brito admitiu que «há um risco» destas medidas causarem mal-estar. «Mas, neste caso, temos de nos centrar naquele que é o objetivo prioritário, que é fazer com que estas pessoas venham», considerou.

Apesar de poderem ser «prejudicados nesse aspeto», os médicos que já pertencem aos quadros do Centro Hospitalar e Universitário do Algarve também podem sair a ganhar, caso haja «investimento e se houver projetos de desenvolvimento».

«As pessoas hoje não se movem apenas pelo dinheiro, mas também pelas possibilidades de progressão de carreira e diferenciação técnica. Penso que é essa a questão fundamental e que é esse o caminho», considerou Ulisses de Brito.

Miguel Guimarães vai mais longe e considera que «esta política de incentivos deve ser estendida às pessoas que, durante 20 ou 30 anos, ou mesmo mais, estiveram a dar o corpo ao manifesto e a assegurar a saúde nas zonas mais carenciadas e menos acarinhadas pelo Estado, que se podem sentir defraudados se isto se aplicar só a determinados tipos de médicos».

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