183 médicos do Centro Hospitalar do Algarve denunciam «degradação dos cuidados de saúde»

Os médicos assistentes do Centro Hospitalar do Algarve (CHA) enviaram esta sexta-feira uma carta ao conselho de administração desta estrutura, […]

Os médicos assistentes do Centro Hospitalar do Algarve (CHA) enviaram esta sexta-feira uma carta ao conselho de administração desta estrutura, alertando para a «degradação dos cuidados de saúde» sete meses depois da criação do CHA.

A carta de três páginas, a que o Sul Informação teve acesso, foi assinada por 183 dos 220 médicos especialistas dos hospitais de Faro, Portimão e Lagos, que constituem o CHA. Ao que o nosso jornal apurou, só ficaram de fora médicos estrangeiros, nomeadamente espanhóis, e os médicos residentes, por opção dos promotores desta iniciativa.

Na carta, que será também enviada ao ministro da Saúde, bastonário da Ordem dos Médicos, e aos presidentes da ARS Algarve, Comissão Parlamentar de Saúde e AMAL, bem como a cada um dos presidentes dos Municípios do Algarve, os signatários acusam o próprio destinatário da missiva, Pedro Nunes, de fazer «ameaças» e «chantagens» aos médicos que têm contestado a sua gestão.

Os médicos acusam mesmo a «forma autocrática» como Pedro Nunes «tem exercido os poderes que lhe assistem enquanto presidente do Órgão de Gestão» de estar a levar «a que muitos profissionais, com anos de dedicação às unidades hospitalares que compõem este Centro Hospitalar optem por deixar de colaborar com a instituição, facto que assume contornos de especial gravidade, considerando a carência de recursos humanos médicos com que o Centro Hospitalar se confronta».

Os 183 médicos dizem estar a assistir «de forma preocupada à degradação dos cuidados de saúde da população algarvia» e denunciam casos concretos com que se deparam todos os dias: «frequentemente são adiadas cirurgias programadas, por falta de material cirúrgico», bem como «aumentam as faltas às consultas médicas» por parte dos doentes, devido à «nova organização do Centro Hospitalar» e aos «constrangimentos que têm sido (im)postos aos doentes», nomeadamente a distância.

Existem ainda «atrasos inaceitáveis na realização de exames complementares, nomeadamente de imagiologia», sendo também «inexplicável a realização de tomografia axial computorizada – tomografia por emissão de positrões em Sevilha».

Por outro lado, denunciam, os profissionais e os doentes são confrontados, «com frequência», «com faltas de medicamentos (doentes oncológicos e com doenças autoimunes, por ex.) com graves reflexos na saúde destes (aumento da morbilidade e provável aumento da mortalidade a curto/médio prazo) e com repercussões diretas negativas sobre os indicadores hospitalares, como a demora média de internamento e aumento dos reinternamentos».

São ainda «habituais as faltas de material de uso corrente, como seringas, agulhas, luvas».
Na opinião dos médicos que assinaram a carta, «eEstá em curso todo um processo que leva ao descrédito dos Serviços Hospitalares, por parte de quem os utiliza».

Os signatários acusam ainda o presidente do Conselho de Administração da CHA de insistir na «subalternização de todos os Serviços Hospitalares ao Serviço de Urgência», uma situação que lhes parece «redutora e perigosa», uma vez que «não tem em consideração toda uma atividade clínica de qualidade, assegurada aos doentes do Algarve».

Para mais porque, «paradoxalmente, não se verifica qualquer melhoria da qualidade desse mesmo Serviço de Urgência, nomeadamente na Unidade Hospitalar de Portimão, que passa frequentemente por situações ridículas, ao melhor estilo dos países em vias de desenvolvimento».

Os médicos assistentes hospitalares pertencentes ao CHA consideram, na sua carta, que, sete meses depois da fusão, este é o «momento adequado para uma reflexão e tomada de posição no que se refere à atual situação deste Centro Hospitalar», que tem a «particularidade de ser constituído por unidades hospitalares que distam mais de 60 quilómetros entre si».

Os signatários defendem, por isso, «que teria sido de todo aconselhável que tivesse havido um apropriado período de reflexão, discussão e preparação, com participação ativa dos profissionais que trabalham na Região com dedicação e competência, antes da fusão das unidades hospitalares. Não sendo já possível essa via, visto que o Centro Hospitalar já é uma realidade de facto e de direito, resta aos médicos aqui signatários chamar a atenção para algumas situações que estão a ocorrer neste Centro Hospitalar e que fazem antever um futuro preocupante. Os Gestores vão e vêm; os Algarvios continuam cá…»

Os médicos contestam a forma como Pedro Nunes está a gerir o CHA e recordam mesmo que este responsável assumiu «publicamente que o Conselho de Administração do Hospital de Faro, EPE [do qual Pedro Nunes era presidente antes de ser nomeado para o CHA], não cumpriu o contrato programa em dois anos consecutivos». Com tudo o que se tem passado, garantem os signatários, «é certo que as metas clínicas serão piores nos próximos anos, com grave prejuízo dos doentes da Região».

Os autores da carta sublinham que o que está em causa não é tanto «o tipo de modelo a implementar», mas sim «a forma como é implementado». Ou seja, «já não se trata de virtuosidade ou não do modelo ou da organização interna, mas sim da virtuosidade da gestão implementada e da capacidade do Órgão de Gestão para envolver e motivar os profissionais na implementação do novo modelo organizacional; da capacidade e disponibilidade do Órgão de Gestão para estabelecer uma base dialogante com os profissionais que todos os dias constroem e dão a cara pela instituição», acusam.

Por isso, concluem, os signatários estão «não só preocupados com a degradação dos cuidados de saúde na região do Algarve, devido às políticas que estão a ser implementadas, com grave prejuízo dos doentes», mas também indignados «pela forma pouco dialogante e autocrática» que caracteriza a relação de Pedro Nunes com os profissionais médicos deste Centro Hospitalar. Uma relação «autocrática» que, «em última análise, muito prejudica os doentes, uma vez que antes da tomada de decisões com repercussão clínica não são ouvidas nem tidas em consideração as opiniões técnicas dos médicos especialistas».

 

Leia aqui a carta na íntegra:

 

«Faro, 6 de Janeiro de 2014

Assunto: Centro Hospitalar do Algarve

Exmo. Senhor
Dr. Pedro Nunes
Presidente do Conselho de Administração
do Centro Hospitalar do Algarve

C/c a:
Exmo. Senhor Ministro da Saúde
Exmo. Presidente da ARS Algarve
Exmo. Senhor Pres. da Comissão Parlamentar de Saúde
Exmo. Senhor Bastonário da Ordem dos Médicos
Exmo. Senhor Presidente da AMAL
Exmos Senhores Presidentes dos Municípios do Algarve

 

Passados que são sete meses desde a criação do Centro Hospitalar do Algarve, através da fusão do Hospital de Faro EPE e do Centro Hospitalar do Barlavento Algarvio, EPE, os médicos Assistentes Hospitalares pertencentes a esta instituição consideram ser este o momento adequado para uma reflexão e tomada de posição no que se refere à atual situação deste Centro Hospitalar.

Tendo o Centro Hospitalar do Algarve a particularidade de ser constituído por unidades hospitalares que distam mais de 60 Km entre si, consideram os ora signatários que teria sido de todo aconselhável que tivesse havido um apropriado período de reflexão, discussão e preparação, com participação ativa dos profissionais que trabalham na Região com dedicação e competência, antes da fusão das unidades hospitalares. Não sendo já possível essa via, visto que o Centro Hospitalar já é uma realidade de facto e de direito, resta aos médicos aqui signatários chamar a atenção para algumas situações que estão a ocorrer neste Centro Hospitalar e que fazem antever um futuro preocupante. Os Gestores vão e vêm; os Algarvios continuam cá…

Temos assistido de forma preocupada à degradação dos cuidados de saúde da população Algarvia. Frequentemente são adiadas cirurgias programadas, por falta de material cirúrgico, aumentam as faltas às consultas médicas pela nova organização do Centro Hospitalar e pelos constrangimentos que têm sido (im)postos aos doentes. Existem ainda atrasos inaceitáveis na realização de exames complementares, nomeadamente de imagiologia, sendo também inexplicável a realização de tomografia axial computorizada – tomografia por emissão de positrões em Sevilha.

Foi por Vexa assumido publicamente que o Conselho de Administração do Hospital de Faro, EPE, não cumpriu o contrato programa em dois anos consecutivos. É certo que as metas clínicas serão piores nos próximos anos, com grave prejuízo dos doentes da Região.

Com frequência são confrontados os profissionais e os doentes com faltas de medicamentos (doentes oncológicos e com doenças autoimunes, por ex.) com graves reflexos na saúde destes (aumento da morbilidade e provável aumento da mortalidade a curto/médio prazo) e com repercussões diretas negativas sobre os indicadores hospitalares, como a demora média de internamento e aumento dos reinternamentos. São ainda habituais as faltas de material de uso corrente, como seringas, agulhas, luvas. Está em curso todo um processo que leva ao descrédito dos Serviços Hospitalares, por parte de quem os utiliza.

Tem insistido Vexa na subalternização de todos os Serviços Hospitalares ao Serviço de Urgência. Parece-nos redutor e perigoso, uma vez que não tem em consideração toda uma atividade clínica de qualidade, assegurada aos doentes do Algarve. Paradoxalmente, não se verifica qualquer melhoria da qualidade desse mesmo Serviço de Urgência, nomeadamente na Unidade Hospitalar de Portimão, que passa frequentemente por situações ridículas, ao melhor estilo dos Países em vias de desenvolvimento.

Por outro lado, muitos dos profissionais médicos têm manifestado preocupação, desconforto e, em alguns casos, indignação, pelo facto de terem sido – ou serem amiúde – confrontados com ameaças e chantagens por parte de Vexa na relação que mantem com os profissionais médicos, desconsiderando por completo a Direção Clínica. A forma autocrática como Vexa tem exercido os poderes que lhe assistem enquanto Presidente do Órgão de Gestão tem levado a que muitos profissionais, com anos de dedicação às unidades hospitalares que compõem este Centro Hospitalar optem por deixar de colaborar com a instituição, facto que assume contornos de especial gravidade, considerando a carência de recursos humanos médicos com que o Centro Hospitalar se confronta.

Todos os profissionais já presenciaram a passagem pelas Instituições de vários órgãos de gestão mas muito poucos terão partilhado experiências gratificantes com os mesmos.

Todos pensamos que já não se trata do tipo de modelo a implementar, mas sim da forma como é implementado. Já não se trata de virtuosidade ou não do modelo ou da organização interna, mas sim da virtuosidade da gestão implementada e da capacidade do Órgão de Gestão para envolver e motivar os profissionais na implementação do novo modelo organizacional; da capacidade e disponibilidade do Órgão de Gestão para estabelecer uma base dialogante com os profissionais que todos os dias constroem e dão a cara pela instituição.

Estamos não só preocupados com a degradação dos cuidados de saúde na região do Algarve, devido às políticas que estão a ser implementadas, com grave prejuízo dos doentes, como também consideramos ser este o momento para manifestar a nossa indignação pela forma pouco dialogante e autocrática que caracteriza a relação de Vexa com os profissionais médicos deste Centro Hospitalar e que, em última análise muito prejudica os doentes, uma vez que antes da tomada de decisões com repercussão clínica não são ouvidas nem tidas em consideração as opiniões técnicas dos médicos especialistas.

Sem outro assunto,

Os Médicos Assistentes Hospitalares do Centro Hospitalar do Algarve»

 

 

 

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