“Video Lucem” põe grandes nomes da música a acompanhar filmes mudos nas igrejas do Algarve

Se a edição de arranque do “Video Lucem” já foi uma iniciativa pioneira, com as igrejas do Algarve a acolherem […]

“O Imigrante”, de Charles Chaplin

Se a edição de arranque do “Video Lucem” já foi uma iniciativa pioneira, com as igrejas do Algarve a acolherem sessões de cinema, a segunda edição, que começa no dia 9 de Novembro, quer ser ainda mais inovadora. Todos os filmes, que vão rodar em sete igrejas, de Novembro a Maio, são mudos, mas vão ser musicados por artistas de renome como os Dead Combo, Maria João, Viviane, João Frade ou Noiserv. 

Assim nascem cine-concertos, de entrada gratuita. Esta é uma atividade que até tem tradição no seio do Cineclube de Faro, a entidade que volta a organizar o “Video Lucem”, e que foi, inclusive, experimentada na 1ª edição desta iniciativa, na sessão de abertura.

Carlos Rafael Lopes é o diretor do emblemático Cineclube e explicou ao Sul Informação o porquê desta aposta arrojada para a segunda edição. «Quisemos imprimir um cunho diferente à programação, dando oportunidade de recuperar clássicos do cinema mudo e mostrá-los, porque têm a sua visibilidade cada vez mais debilitada».

Sérgio Marques, programador do “Video Lucem”, disse, por sua vez, que um dos critérios na escolha dos filmes foi fazer «uma mostra de várias cinematografias» e não ir só «àquela que tem sempre mais visibilidade: a americana». Por isso, há também filmes russos, franceses, portugueses, dando «uma boa mostra daquilo que é o cinema mudo».

Dead Combo

Quanto à vertente musical, o desafio proposto a quem aceitou participar neste “Video Lucem” é grande.

«Desafiámos músicos a trabalhar com outros músicos. Estas são criações feitas de propósito para aquele filme, para aquela sessão e para aquela igreja», ilustrou Sérgio Marques ao nosso jornal.

E a verdade é que reunir tantos nomes de referência «não foi fácil», segundo Carlos Rafael Lopes, mas «acabámos por conseguir reunir um conjunto de artistas absolutamente notável». Há quem vá cantar, quem vá tocar guitarra, piano e até o órgão de uma das igrejas.

Para começar há, na parte cinematográfica, Charles Chaplin em dose dupla, no dia 9 de Novembro, às 21h30, na Igreja de São Francisco, em Faro. As curtas-metragens “O Imigrante” e a “Rua da Paz”, de 1917, vão ser musicadas por Maria João, João Farinha e Zé Eduardo. O mesmo Zé Eduardo que vai apresentar uma surpresa nesta sessão.

Já na segunda sessão, a 7 de Dezembro, às 21h30, na Igreja de São Clemente, em Loulé, vão estar Custódio Castelo, na guitarra portuguesa, Carlos Menezes (contrabaixo) e Fad’NU (voz e guitarra) a musicar “A Mãe”, de Vsevolod Pudovkin (URSS, 1926).

Quanto à terceira sessão marcada, será, a 13 de Janeiro de 2018, na Igreja Matriz de Martim Longo (Alcoutim), às 21h30, com a exibição do filme português “Os Lobos”, de Rino Lupo (1923), musicado, ao vivo, pelo piano de Nicholas McNair.

A Igreja Matriz de Ferragudo (Lagoa) vai, por sua vez, receber a 8 de Março, às 21h30, uma sessão dupla. Em primeiro, “Ring Up the Curtain”, de Harold Llyod (EUA, 1919), musicado pelo acordeão de João Frade, e, em segundo, “Sherlock Jr.”, de Buster Keaton (EUA, 1924), onde a música ficará entregue aos vários instrumentos de Noiserv.

Este ano, há uma diferença que salta logo à vista na programação do “Video Lucem”: o facto de serem menos sessões. Na primeira edição, foram 22, agora são sete.

Tal deve-se à «questão orçamental», explicou Sérgio Marques, uma vez que há mais custos envolvidos com a presença dos músicos. No total, este “Video Lucem” tem 66 mil euros de orçamento: 54 mil atribuídos pelo 365Algarve e 12 mil da parte do Cineclube de Faro. A verba é maior do que a do ano passado.

“Douro, Faina Fluvial”

Para que tudo isto se possa realizar, há outro apoio fundamental: o das igrejas que acolhem os filmes.

Isto apesar de, este ano, o evento não ter a chancela geral da Diocese do Algarve, quando no ano passado a teve.

O padre Miguel Neto, responsável pela Pastoral do Turismo desta Diocese, explicou ao nosso jornal que a retirada de apoio direto se deveu à «gestão das atividades paroquiais».

Já o padre Carlos Aquino, responsável pela Pastoral da Cultura da Diocese do Algarve, disse, ao Sul Informação que, apesar de não existir essa chancela geral, o “Video Lucem” tem o apoio quer desta Pastoral, quer da do Turismo. E, na verdade, não se pode dizer que não tem o apoio, ainda que indireto, da Diocese, uma vez que são cedidas as igrejas.

No fundo, todos os párocos foram livres de aceitar, ou recusar, receber a iniciativa nas suas paróquias. «Houve algumas observações, de alguma parte interior da Igreja e do clero, dando considerações menos positivas ao facto de se realizar cinema dentro das igrejas, que é um espaço sagrado», explicou o padre Carlos Aquino.

Ou seja, houve alguns padres que não aceitaram bem a ideia.

Ainda assim, a iniciativa vai passar um pouco por todo o Algarve, desde o Barlavento (exibições em Ferragudo, por exemplo), ao Sotavento (Tavira e Faro), passando pelo interior algarvio, com Alcoutim.

Pároco em Loulé, Carlos Aquino confessou que gosta «muito desta programação». «É de excelência», sendo reforçada com os «músicos».

Ao contrário do que alguns dos seus colegas padres pensam, para o responsável pela Pastoral da Cultural o “Video Lucem” é «uma oportunidade de acolher, com novas metodologias, um processo de evangelização». Além disto, um dos objetivos do próprio “Video Lucem” também é dar a conhecer o património religioso e histórico das igrejas algarvias.

De acordo com o padre Carlos Aquino, «todas as pessoas que participaram neste evento, e muitas delas nem comungam da fé ou a praticam, consideraram a iniciativa muito válida. É uma oportunidade de ver não só cinema, mas de o ver em espaços próprios, que, em si mesmo, já convidam à avaliação da vida».

Voltando ao calendário das sessões há, a 8 de Fevereiro, “O Vento”, de Victor Sjostrom (EUA, 1928), às 21h30, a rodar na Igreja de Santiago, em Tavira, com uma particularidade: Filipe Raposo vai tocar o órgão daquela igreja.

Zé Eduardo

Outra sessão mais especial será a 6 de Abril, a partir das 21h30, na Sé de Silves.

É que nesse dia se vão comemorar os 65 anos do Cineclube de Faro.

Essa noite ficará reservada para as curtas-metragens “Douro, Faina Fluvial”, de Manoel de Oliveira (Portugal, 1931), “À propos de Nice”, de Jean Vigo (França, 1930), e mais uma surpresa que vai envolver imagens antigas do Algarve.

Na música, vão estar Ana Deus (voz e percussão), Luva Argel (viola), Viviane (voz) e Tó Viegas (guitarra) Promete…

Já para a última sessão do Video Lucem, a ideia é fazer um «evento absolutamente marcante», a 30 de Maio, em Vila Real de Santo António, também a partir das 21h30.

Para isso, a ideia é exibir um filme que poucas vezes passou em Portugal, apesar de ser português: “Os Faroleiros”, de Maurice Mariaud (1922).

Noiserv

Se isto já parece ser motivo suficiente para uma ida a Vila Real de Santo António, há, também, a presença confirmada dos Dead Combo, na parte musical, e o facto de estar previsto o filme ser exibido junto ao farol daquela cidade.

Assim nasce um cenário com um filme sobre faroleiros a ser exibido precisamente junto a um farol, com a música dos Dead Combo.

Numa edição em que é tudo «mais ou menos home made, com ajudas de colaboradores e sócios do Cineclube de Faro», mas sem o apoio, para a programação, de nomes exteriores, como foi o caso da primeira edição, as expetativas «são as maiores», segundo Carlos Rafael Lopes.

«Nós vemos a programação como bastante aliciante. Temos consciência de que há sessões que teoricamente serão mais populares, como a de abertura e fecho», acrescentou.

O padre Carlos Aquino não podia estar mais de acordo: «é um projeto para continuar».

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