Ricardo Encarnação tem apenas 11 anos, mas já sabe que quer ser arqueólogo. Descobriu-o no Verão passado, quando, pela primeira vez, se voluntariou para – durante as férias, que passa sempre na casa dos avós, em Alferce, aldeia do concelho de Monchique – ajudar nos trabalhos que decorrem no topo daquele cerro.
Às 10h00 de uma manhã de quinta-feira, Ricardo já escavava naquela zona com o objetivo de tentar encontrar mais alguma coisa utilizada pelos mouros ou pelos pré-históricos, mas não era o único.
Foi ali, naquele local, que Fábio Capela, arqueólogo da Câmara Municipal de Monchique, e outros colegas, se começaram a dedicar em 2020 às escavações para avaliar o potencial destas áreas que nunca antes tinham sido alvo de estudo profundo.
Nessa altura, ninguém imaginava que o que restava daquela fortificação, que aos olhos dos leigos podia parecer apenas pedras, pudesse servir de alavanca para outros grandes investimentos feitos naquela aldeia: o Miradouro do Castelo de Alferce, inaugurado em Abril, mesmo ali ao lado das escavações arqueológicas, o Passadiço do Barranco do Demo, inaugurado em Outubro do ano passado, e, brevemente, o Centro Interpretativo do Castelo de Alferce.
«Este local já está aberto ao público, mas agora, no dia 31 de Agosto, no âmbito do Dia Aberto, vamos inaugurar o Centro Interpretativo e fazer visitas guiadas», explicou Fábio Capela ao Sul Informação, no âmbito de uma visita ao local, esta quinta-feira, 22 de Agosto.
De acordo com o arqueólogo, o sítio é, neste momento, «um grande atrativo turístico».
«Digamos que a alavanca de todo este projeto turístico aqui em Alferce é o próprio Castelo, tudo o resto surgiu associado. A construção do Passadiço, que faz a ligação da aldeia ao Castelo, o Miradouro, e agora a terceira fase, que é o Centro Interpretativo. No meio disto tudo, as escavações decorrem sempre no Verão e essa é uma maneira também de trazermos cá pessoas porque sabem que, todos os anos, vamos colocar novas áreas a descoberto», continuou.
A altura do ano escolhida para os trabalhos deve-se não apenas às condições climatéricas, mas também ao facto de trabalharem com voluntários das universidades, que têm férias entre Julho e Setembro.
«Eles acabam por ter a formação prática, porque têm disciplinas que necessitam de trabalho de campo, e nós, além de ensinarmos, porque isto funciona como “campo-escola”, temos a ajuda deles em termos de mão de obra para colocar estruturas a descoberto», frisou Fábio Capela.
Maria Batista, aluna da Universidade do Algarve, é uma dos muitos jovens que já por aqui passaram.
Aos 20 anos, com o curso terminado, este é já o segundo ano em que realiza escavações no Castelo de Alferce.
«O sítio, mas também o que aprendo aqui, foi o que mais me cativou e incentivou a voltar», conta, admitindo que este local a tem ajudado a perceber que gosta do período «medieval-islâmico» e que lhe traz «alguma magia».
Enquanto cá estão a fazer trabalho voluntário, os jovens têm alimentação e alojamento garantindos, precisando apenas de assumir o transporte até Alferce.
Como algarvia, mas que pouco conhecia Monchique até então, Maria admite que estes investimentos feitos no interior são «uma mais-valia enorme».
Quem também o acha é José Vinagre, de 26 anos, que, ao contrário de Maria, sempre esteve mais próximo do interior do que ao litoral, não fosse ele de Évora.
Questionado sobre o que o trouxe até aqui, conta que veio para cá escavar a primeira vez em 2021 e apaixonou-se pelo espaço e pela equipa.
«Desde aí, fui ganhando competências, experiência, evoluindo na área… e em 2023 surgiu a oportunidade de poder fazer aqui a minha tese de mestrado. Como surgiu essa oportunidade, no ano passado integrei a equipa de coordenação do projeto e a partir daí desenvolvi o estágio, estive também a trabalhar na Câmara, eles gostaram do meu trabalho e fizeram-me contrato até ao final do ano», revelou ao nosso jornal.
Apesar de não ser da região, José Vinagre diz já se sentir em casa em Monchique e, por isso, fica bastante satisfeito com a forma como a aldeia de Alferce está a ser valorizada.
«Isto é uma mais-valia para todos. Lembro-me que, nos primeiros anos da campanha, as pessoas não nos ligavam muito, diziam que isto era um “monte de pedras”, agora já dizem que é “o nosso castelo” e perguntam pelas novas descobertas e como está a evoluir. Depois, como temos esta sorte de ter os miúdos da aldeia, as pessoas veem que eles gostam de estar aqui e isso também acho que foi bom para a nossa relação com a população», remata o jovem.
Em declarações ao Sul Informação, José Gonçalves, presidente da Junta de Freguesia de Alferce, fala também dos benefícios que tanto o Passadiço como o Miradouro trouxeram para a aldeia que, desde então, tem «mais pessoas, mais negócios e mais comércio».
Marta Diogo, proprietária do Real 13, uma café localizado mesmo à entrada de Alferce, não podia estar mais de acordo. O negócio, que abriu há um ano, ainda antes de o Passadiço ter sido inaugurado, sentiu o impacto positivo.
«No Verão, nota-se uma quebra, porque, com o calor, as pessoas fogem um bocadinho daqui, mas noutras alturas do ano nota-se muito que quem cá vem é porque veio também fazer os passeios e pára para almoçar ou lanchar», conta.
Neste momento, além da inauguração do Centro Interpretativo do Castelo, está prevista uma novidade no Passadiço: uma via ferrata.
De acordo com o presidente da Junta, a empreitada está em fase de adjudicação e «até ao final do ano estará montada e será mais uma atratividade».
Fotos: Mariana Carriço | Sul Informação
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