Albufeira tem uma estratégia para fazer cada vez mais «parte da sua vida»

Continuando a ter o sol e mar como prioridade, objetivo é mudar o foco e o tipo de turismo

Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Turistas bêbados na rua, às vezes seminus, a provocar desacatos. Esta é uma imagem que muita gente, mesmo no estrangeiro, evoca quando se fala de Albufeira. Mas este é também o concelho com a maior concentração de hotéis de 5 estrelas e de restaurantes Michelin de todo o Algarve.

Para recentrar a imagem – e o mercado turístico – de Albufeira, a Câmara Municipal encomendou ao Instituto de Planeamento e Desenvolvimento do Turismo (IPDT) uma “Estratégia de Desenvolvimento, Promoção e Captação de Novos Turistas para Albufeira” para o período até 2030, que foi ontem apresentada.

«Sol e praia será sempre o ponto principal» do produto turístico de Albufeira, mas apostando em diversificar a oferta, de forma até a contribuir para esbater a sazonalidade, mas também para atrair novos mercados turísticos, de outras nacionalidades, «com novas potencialidades», como salientou José Carlos Rolo, presidente da Câmara Municipal.

Com o mote «Albufeira faz parte da sua vida!», que remete «para as diferentes gerações que têm escolhido o concelho para as suas férias» e «resume o posicionamento estratégico de Albufeira 2030», o documento apresenta «as medidas estratégicas e as ações necessárias para que se consolide como o Melhor Destino Turístico de Sol e Mar de Portugal, reconhecido a nível internacional».

 

 

Por isso mesmo, o objetivo deste documento, garantiu o presidente da autarquia, é que seja de facto implementado, posto no terreno. Para isso, até deve ser criada uma Estrutura de Gestão profissional «dedicada em exclusivo à gestão do destino, reforçada com conhecimentos técnicos e de mercado». «Esta estratégia não é para pôr na gaveta», sublinhou o autarca.

Acrescentando que o documento pode continuar a ser «alimentado» com contributos de todos e «alterado» se as «contingências» assim o exigirem, Rolo sublinhou que esta é uma estratégia que, resultando já dos contributos de muitos dos atores e população locais, «não se pretende que seja imposta, seja por quem for, mas sim que seja implementada em parceria com todos», «para benefício da atividade económica e turística de Albufeira».

Tal como viria depois a vincar Mónica Montenegro, diretora executiva do IPDT, a estratégia apresentada não rompe com o passado, não é «disruptiva», mas sim tira partido da experiência acumulada por Albufeira ao longo de 60 anos de turismo, para lançar outras pistas de modo a reforçar e complementar o produto, bem como a dar «resposta aos desafios do Algarve e de Albufeira, em particular».

Uma das questões principais – e foi daí que partiu a encomenda da Câmara de Albufeira ao IPDT para que fizesse este trabalho – é mudar a imagem de Albufeira como uma zona para turistas de baixo poder de compra, estadias curtas, apenas interessados na praia e na diversão dos bares e discotecas.

Albufeira é já muito mais do que isso, mas, muitas vezes, não é essa a perceção que as pessoas têm do destino, seja em Portugal, seja no estrangeiro. E não é essa a imagem que os próprios residentes no concelho têm da sua terra.

É que, segundo os dados compilados durante a elaboração da Estratégia, embora 89% dos residentes considerem que «o turismo é determinante para a economia de Albufeira e para a geração de emprego», «apenas 20% concordam que a maioria dos turistas atuais respeitam os residentes e adotam um comportamento cívico quando visitam Albufeira». Ou seja, a maioria dos albufeirenses não gosta do comportamento dos seus turistas.

A opinião também não é muito melhor entre os agentes económicos, já que 76% «consideram que existiu, nos últimos 10 anos, uma alteração do perfil do turista de Albufeira, que agora se envolve menos na cultura local, gasta menos e tem menor preocupação com a preservação dos recursos naturais».

52% desses agentes económicos referem mesmo estar «insatisfeitos com o comportamento cívico da maioria dos turistas que Albufeira recebe».

Só os operadores turísticos parecem contentar-se com a situação. 85% dos operadores internacionais que comercializam Albufeira consideram-na «um destino seguro, sendo o segundo elemento mais bem avaliado, após a qualidade das praias (90%)».

Apesar de tudo, os operadores turísticos têm uma crítica a fazer: «55% consideram ser importante o destino encontrar soluções para combater o encerramento sazonal dos negócios», nomeadamente hotéis, bares e restaurantes.

 

Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 

 

De acordo com o documento, entre os seis objetivos estratégicos que vão orientar a atuação até 2030, destaca-se a necessidade de «reverter/desmistificar a imagem generalizada de Albufeira enquanto destino turístico massificado», bem como de reduzir a «dependência do mercado britânico, aumentando a taxa de captação de mercados com potencial de crescimento».

«Queremos diversificar mercados, consolidando segmentos estratégicos. O destino tem como principal mercado o Reino Unido, verificando-se uma grande dependência deste. Neste contexto, numa perspetiva de sustentabilidade de longo-prazo, é imperiosa a implementação de medidas que impliquem o investimento na diversificação de mercados com motivações de procura alinhadas com a oferta alargada de Albufeira, disponível ao longo de todo o ano», sublinha a Estratégia.

Além disso, porque a sazonalidade torna o emprego «muito volátil», criando uma sensação de insegurança entre a população, outro objetivo estratégico é «gerar valor económico e social através do turismo», levando à «fixação de residentes» e ao «desenvolvimento e retenção de recursos humanos qualificados».

«A sazonalidade é um dos principais desafios ao desenvolvimento turístico de Albufeira, por este ter como principal produto o sol e mar, que tem como época alta os meses de Verão. A solução passa pela estruturação de uma oferta turística que garanta a procura ao longo de todo ano e que permita a estabilização do mercado de trabalho do município, que sofre do turismo sazonal», salienta o documento.

Entre os desafios que se colocam, está a necessidade de «distribuir os fluxos turísticos» por todo o concelho. É que a atividade turística «tem a sua maior concentração na freguesia de Albufeira e Olhos de Água, sendo desejável que os fluxos turísticos se distribuam de forma mais equitativa pelo território».

Tanto mais que essa distribuição «garante a sustentabilidade do destino e reduz a pressão turística em zonas com capacidades de carga comprometidas».

Esta será também mais uma forma de ganhar o apoio da população. «Queremos envolver de forma próxima a comunidade local no processo do desenvolvimento turístico. É necessário garantir que os residentes, além de serem envolvidos no processo da experiência turística, reconhecem os benefícios diretos e indiretos do turismo, sejam estes a económicos, sociais e/ou culturais», sublinha o documento.

 

Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 

Mas, como salientou Mónica Montenegro, do IPDT, um dos desafios mais difíceis da nova Estratégia é desenvolver «uma nova notoriedade para Albufeira». A imagem atual e a perceção de Albufeira «como um destino massificado e de alguns excessos associados à animação noturna constitui-se como um dos nossos principais desafios». Neste contexto, «a atual estratégia identifica as soluções para reverter e desmitificar a atual situação», que, embora não corresponda «à realidade do destino», acaba por «prejudicar a sua atuação junto de mercados e segmentos estratégicos».

Para alterar a imagem, muito trabalho terá de ser feito. Por isso mesmo, o documento orientador do turismo albufeirense até 2030 assume «a posição de que não queremos turistas cujos perfis fragilizem o posicionamento estratégico de Albufeira e que colocam em causa a nossa imagem global e o bem-estar dos nossos residentes».

Como «segmentos de não aposta», surgem os turistas que procuram «destinos low-cost, estadias curtas (menos de 3 noites), com a única motivação de diversão, sem motivações culturais, pouco sensíveis à vida local e à interação com residentes», bem como os «grupos de despedidas de solteiro» e as «viagens de finalistas».

E não é que Albufeira vire as costas à animação noturna. Antes pelo contrário, esta atividade é considerada como uma das forças de Albufeira, até quando comparada com outros destinos no Algarve e no país ou mesmo no estrangeiro.

Mas há que virar a agulha, para uma animação noturna que seja sinónimo de «noites memoráveis e descontraídas, onde a diversão está sempre garantida e preparada para atender todos os gostos, num ambiente seguro e saudável», afirmando-se Albufeira como «um destino que aposta na inovação da oferta, procurando trazer novidade aos visitantes, época após época».

Aliás, entre as ações concretas a implementar, destacam-se a criação e disseminação, ainda este ano, de um Código de Conduta denominado “Fun Meets Respect: Albufeira’s Shared Guidelines”, bem como a «elaboração de um estudo para adequabilidade de um regulamento municipal para a gestão de comercialização de bebidas alcoólicas».

E o que se pretende alcançar com esta Estratégia, além da afirmação de Albufeira como o principal destino de sol e mar do país?

Há seis metas estratégicas (e ambiciosas) a atingir até 2030: alcançar uma taxa de sazonalidade das dormidas de 38% (atualmente é de 45%, quase metade do total de dormidas), aumentar para 100 euros a RevPAR, ou seja, a receita por quarto disponível (em 2022 era de 65 euros), bem como aumentar para 8% a quota de dormidas dos mercados estratégicos, que incluem Canadá, EUA, Dinamarca, Suécia, Noruega e Finlândia (4% em 2022), atingir uma taxa de satisfação dos turistas de 90%, garantir que 75% dos residentes reconhecem que os benefícios do turismo superam os impactos negativos (em 2022 apenas 31% tinham essa opinião favorável) e certificar Albufeira como “Destino Turístico Sustentável”.

 

Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 

Para alcançar tão ambiciosas metas e objetivos há que apostar na comunicação, não a deixando apenas nas mãos dos operadores turísticos internacionais (que controlam atualmente 75% da comunicação sobre o destino).

A aposta agora é em «manter e estreitar as relações de proximidade com os mercados com representatividade na dinâmica turística de Albufeira e fomentar o crescimento de outros com potencial de diversificação do espectro de públicos com interesses e motivações coincidentes com a nossa vocação turística».

Assim, 60% desse esforço será concentrado na «aposta prioritária em mercados consolidados, com histórico de procura estruturante e qualificada para a dinâmica turística de Albufeira», como o Reino Unido, Portugal, Irlanda, Alemanha, Países Baixos, França e Espanha.

25% do esforço será dirigido ao reforço da aposta em mercados «com presença no destino, com elevada margem de crescimento e que podem acrescentar valor à dinâmica turística de Albufeira» (Canadá, EUA, Dinamarca, Suécia, Noruega e Finlândia).

10% do esforço será feito na manutenção da aposta em mercados «com presença no destino, mas com reduzida margem de crescimento»: Bélgica, Suíça, Polónia, Itália, Brasil, Áustria e Luxemburgo.

Finalmente, os restantes 5% serão destinados a «explorar oportunidades» em mercados «com pouca expressão, mas com potencial de crescimento elevado, numa lógica de diversificação». São os casos da Chéquia, Estónia, Letónia, Lituânia, Roménia e Hungria.

Através da Estrutura de Gestão (DMO – Destination Management Organization), Albufeira pretende «adotar uma estratégia de comunicação que combine a promoção direta junto do consumidor final e a promoção intermediada, numa lógica de 50%/50%».

«Esta abordagem irá permitir-nos interagir diretamente com novos potenciais consumidores, contribuindo também para que a operação turística tenha o seu trabalho facilitado no alcance também de novos públicos, aumentando as suas quotas de mercado», explicou Mónica Montenegro.

Vão ainda ser encetados «esforços para aumentar a capacidade de comunicação direta com o consumidor, tendo maior autonomia e capacidade de intervir diretamente junto dos segmentos que pretendemos captar». A aposta ainda maior nas redes e suportes digitais será uma realidade.

A apresentação da “Estratégia de Desenvolvimento, Promoção e Captação de Novos Turistas” decorreu com o salão nobre da autarquia completamente cheio. A assistência incluía os principais responsáveis pelo turismo regional, como André Gomes, presidente da Região de Turismo do Algarve, Alberto Mota Borges, diretor do Aeroporto de Faro, Hélder Martins, presidente da Associação de Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), Vítor Neto, presidente do NERA – Associação Empresarial do Algarve, bem como muitos empresários e outros responsáveis e gestores do setor turístico e hoteleiro, académicos, autarcas.

No final, o presidente da Câmara José Carlos Rolo fez votos de que «tenham ficado agradados, com alguma curiosidade e alguma dúvida sobre este documento», que «não pretende ser uma bíblia que não se pode alterar».

A “Estratégia” pretende ser apenas um «ponto de partida para uma nova fase do turismo de Albufeira». E não é pequena a pretensão.

 

Clique aqui para ver o resumo da “Estratégia de Desenvolvimento, Promoção e Captação de Novos Turistas” (em português e inglês)

 

Fotos: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 

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