Relatório do Grupo de Trabalho das Grutas de Benagil está em consulta pública

Taxa turística não avança para já, mas sim fiscalização permanente por sistema CCTV ligado à Autoridade Marítima Nacional

Doze recomendações simples e um código de conduta deverão ser implementados, já em 2024, no acesso às Grutas de Benagil, através da publicação de Edital ou Regulamento Administrativo, a lançar pela Agência Portuguesa de Ambiente, Autoridade Marítima Nacional, Câmara Municipal de Lagoa e Instituto de Conservação da Natureza e Florestas.

Este é o principal resultado das reuniões do Grupo de Trabalho das Grutas de Benagil, cujo Relatório de Progresso e anexos estão a partir de hoje, dia 24, disponíveis na plataforma ”Participa.pt”, para consulta pública, por um período de 20 dias.

A questão da eventual criação de uma taxa de acesso não consta das recomendações, mas está bem explícita nas «Medidas a Consensualizar», quando se refere que um «registo prévio, na plataforma eletrónica, para visitação às Grutas de Benagil», que deverá ser implementado, irá «incluir o pagamento de uma taxa turística».

«As receitas resultantes deverão ser utilizadas em iniciativas de gestão e conservação dos valores naturais e culturais desta área, bem como, nas ações de segurança e gestão da visitação das Grutas de Benagil», explica-se.

A consulta pública, que decorre até 21 de Fevereiro, destina-se a recolher «opiniões e contributos», que depois serão avaliados e ponderados, de modo a fazer «os ajustamentos que se venham a justificar nos documentos a submeter superiormente à Tutela, habilitando as decisões políticas e de natureza legislativa consideradas adequadas».

As Recomendações Simplificadas e o Código de Conduta, que «devem ser apresentados aos clientes (e afixados em locais apropriados e visíveis)», destinam-se a ordenar «os múltiplos usos que coexistem nesta área, mitigando potenciais conflitos, fomentando a segurança, promovendo em simultâneo a conservação do património natural e cultural e contribuindo para a valorização da oferta turística nas Grutas de Benagil».

Segundo uma estimativa apresentada pela associação Algarve Anima, que é uma das entidades que integrou o Grupo de Trabalho, «só a partir da Marina de Albufeira, cerca de 750 000 passageiros visitam as grutas em embarcações, podendo extrapolar que nas referidas grutas ultrapassem 2 milhões de turistas anualmente (embarcados)».

 

Caos no acesso à gruta de Benagil – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

 

Há ainda a considerar que, «nos meses de Verão, existe um enorme tráfego de embarcações» sem motor, como kayaks, canoas e stand up paddle.

«Durante toda a época alta, durante o dia, estão permanentemente até 200 pessoas dentro do Algar de Benagil». Este congestionamento já tem provocado conflitos entre utilizadores e entre empresas de atividades marítimo-turísticas, conflitos esses que já chegaram até aos confrontos físicos.

É toda esta confusão e os perigos, para as pessoas e para a natureza, que daí advêm que o Grupo de Trabalho quer agora regular. Como salienta o Relatório agora em consulta pública, «face ao grande número de visitantes e aos conflitos verificados é unânime a urgência de regulamentação da visitação das Grutas de Benagil».

Enquanto não é possível que a regulamentação seja estabelecida legalmente, deverá então avançar, já este Verão, um conjunto de 12 Recomendações, que passam pela proibição do desembarque e/ou uso balnear do areal, no interior da gruta, ou mesmo do acesso ao interior das Grutas de Benagil de visitantes a nado ou com meios auxiliares de flutuação (e.g. boias, bodyboards, colchões) em simultâneo com plataformas motorizadas.

Para esses visitantes a nado, recomenda-se que «haja um horário antes das visitas das embarcações motorizadas», por exemplo das 7 às 10h00.

Além disso, os operadores das marítimo-turísticas (MT) «devem proporcionar aos clientes informação adequada e padronizada sobre a atividade, nomeadamente de segurança individual e coletiva, sublinhando que a atividade ocorre, simultaneamente, numa zona de risco e com estatuto de conservação, promovendo a sensibilização ambiental, recorrendo a metodologias pedagógicas eficazes e aceitáveis».

No acesso ao interior das Grutas de Benagil, é recomendada a separação entre embarcações a motor e outras sem motor, sendo que os caiaques e SUP «devem aceder ao interior e sair das Grutas de Benagil apenas pela Entrada Nascente, por fila única, e circulação em U para entrar e sair da Gruta», enquanto as «Plataformas Motorizadas deverão aceder ao interior das Grutas de Benagil e sair apenas pela Entrada Poente».

É ainda definido um número máximo recomendável de embarcações, motorizadas ou não, no interior, de modo a permitir «a execução de manobras em segurança dentro da gruta».

Recomenda-se a criação de mapas de acesso e circulação das Grutas de Benagil, por Plataformas Motorizadas e Não Motorizadas, disponibilizados e divulgados entre os utilizadores das Grutas e Benagil, e afixados em locais adequados à sua efetiva divulgação.

Além disso, deverá ser implementada fiscalização permanente no local por sistema CCTV, ou similar, ligado à Autoridade Marítima Nacional.

O mergulho com escafandro autónomo ou em apneia não será permitido no interior das grutas de Benagil ou nas áreas circundantes de acesso, exceto em ações de monitorização ou investigação científica, necessitando de autorização prévia das autoridades competentes.

Por último, é proibida a pesca submarina e pesca recreativa (apeada ou embarcada) nas imediações ou no interior da gruta.

 

Visão idílica, mas muito rara, da gruta sem ninguém

 

Apesar de não constar deste conjunto de recomendações simplificadas, é ainda apontada como medida consensual entre os membros do Grupo de trabalho a necessidade de promover a «formação e capacitação (e requalificação periódica a definir)» dos guias das empresas MT, dando-lhes formação sobre a geologia e a ecologia da zona.

No futuro, o Grupo de Trabalho recomenda igualmente que seja «implementado um programa de monitorização específico para avaliação de risco da paisagem cársica onde se inserem as Grutas de Benagil. Esta monitorização deverá ter uma periodicidade anual/semestral e deve ser reforçada sempre que ocorram situações suscetíveis de agravar o risco (sismos, episódios de precipitação ou agitação marítima extrema)».

Como medida de prevenção, e se ocorrer algum dos eventos atrás descritos, o acesso às Grutas de Benagil poderá mesmo ser interdito.

Devem também «ser equacionadas medidas de correção da arriba da Gruta de Benagil, pela APA/ARH, sempre que a avaliação da monitorização assim o determinar, tentando minimizar o risco de quedas acidentais de blocos ou desmoronamentos», assim como «deve ser avaliada a possibilidade de desenvolvimento de ferramentas tecnológicas (sensores de movimento, vibração) a serem implementadas em pontos-chave no interior da Gruta de Benagil que permitam a monitorização contínua do risco de desmoronamento».

O grupo de trabalho multidisciplinar denominado “Grupo de Trabalho das Grutas de Benagil” foi criado na sequência da publicação, a 30 de agosto de 2023, do Despacho Conjunto nº 8777/2023, dos Secretários de Estado da Defesa Nacional, do Turismo, Comércio e Serviços, do Mar, do Ambiente, da Conservação da Natureza e Florestas, da Administração Local e Ordenamento do Território e da Secretária de Estado das Pescas.

A sua missão era estabelecer a capacidade de carga humana e de determinar as condições de acesso às Grutas de Benagil, localizadas ao largo da Praia de Benagil, no concelho de Lagoa, que constituem «património natural relevante e um dos principais pontos turísticos do Algarve que, no período de Verão, tem suscitado o interesse de cada vez mais visitantes, sobretudo por via marítima».

O Grupo de Trabalho, coordenado pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Algarve, era composto inicialmente por vinte entidades, entre as quais sete Secretarias de Estado, a Câmara de Lagoa, o Turismo de Portugal e a Região de Turismo do Algarve, o ICNF, o IPMA, a AMAL, a Autoridade Marítima Nacional. Mas acabaram por ser convidadas outras entidades, como a associação AlgarveAnima, a Associação Portuguesa de Empresas de Congressos, Animação Turística e Eventos, ou mesmo representantes da população de Benagil.

O acesso à gruta de Benagil – que localmente é conhecida como Algar do Zé Rodeira –, sobretudo durante o Verão, é um verdadeiro caos. Há embarcações de todos os tamanhos e tipos a entrar no imenso algar, mas também motos de água, canoas, caiaques, pessoas em padel ou em colchões insufláveis, banhistas a nado, até crianças com braçadeiras.

Há embarcações, marítimo-turísticas ou privadas, que vêm da vizinha praia de Benagil ou de Carvoeiro, mas também de zonas mais distantes, como Ferragudo, Portimão, Lagos, Albufeira ou mesmo Faro. Os barcos chegam a fazer fila, às dezenas, à entrada do frágil algar.

A gruta de Benagil já foi considerada como uma das mais bonitas de todo o mundo, aparece em todos os guias turísticos, consta em cartazes e vídeos de promoção… mas sempre como se fosse um local paradisíaco, sem ninguém. Ora, a realidade é bem diferente e há anos que se fala da necessidade de regular o acesso àquela zona sensível do litoral.

É o que o Grupo de Trabalho agora fez, embora ainda faltem muitos passos até que todas as medidas possam ser, de facto, implementadas.

 

 

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