Algarve é «das zonas mais afetadas» pelas alterações no AL previstas no “Mais Habitação”

Votação final global do programa “Mais Habitação” é hoje, na Assembleia da República. Associação do Alojamento Local promete mais luta

O Alojamento Local representa cerca de 35% das dormidas turísticas no Algarve, região que «será das mais afetadas pelo novo pacote legislativo que o Governo quer aprovar», garante Eduardo Miranda, presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP).

Esta quarta-feira, dia 19 de Julho, cinco meses após a aprovação da primeira versão, pelo Conselho de Ministros, o programa “Mais Habitação”, que prevê severas restrições ao Alojamento Local (AL), vai a votação final global na Assembleia da República.

A 6 de Julho, a ALEP promoveu, em Albufeira, uma conferência sobre o «Impacto do “Mais Habitação” no Alojamento Local, Turismo e Economia do Algarve», que contou com mais de centena e meia de participantes, na sua maioria proprietários de AL na região.

Nessa sessão, Eduardo Miranda defendeu que as medidas anunciadas pelo Governo para o AL e supostamente destinadas a resolver o problema da falta de casas para habitação em Portugal são uma falácia. «Não é com medidas radicais que se resolve problemas estruturais» da habitação no país, disse.

Citando um estudo que a NOVA SBE fez sobre o setor do Alojamento Local, o presidente da ALEP sublinhou que, a nível nacional, o AL representa, atualmente, 40% das dormidas, além de que «os turistas que usaram o Alojamento Local nas suas visitas a Portugal gastaram mais de oito mil milhões na economia nacional, um valor que representa 3,8% do PIB».

Daí que, sublinhou, «as medidas vão destruir por completo o Alojamento Local, um pilar do Turismo e da Economia nacional».

A conclusão que se retirou ao fim de duas horas de conferência, com vários convidados, foi que a Economia do Algarve assenta no Turismo, representando o Alojamento Local mais de 60% da capacidade de alojamento turístico na região. Ora, defenderam, «as medidas do “Mais Habitação” podem não só colocar em risco boa parte do setor do alojamento local, mas todas as atividades relacionadas como a imobiliária, restauração, comércio, serviços turísticos e muitas outras».

 

 

Sobre a importância do AL no Algarve, falou Cláudia Ribeiro de Almeida, professora na Escola Superior de Gestão, Hotelaria e Turismo da Universidade do Algarve e investigadora CinTURS, que apresentou os dados mais recentes sobre o Alojamento Turístico em geral e AL em particular.

Segundo a investigadora, o Algarve concentra 39,2% do AL do país, seguido da Área Metropolitana de Lisboa (27%) e do Norte (18,5%).

No Algarve, das 269.695 camas turísticas, quase 60% (160.156 camas) são AL. As restantes situam-se em empreendimentos turísticos e hotéis.

O top5 dos concelhos com mais Alojamentos Locais registados começa por Albufeira, com 9967 (correspondendo a 34.314 camas), seguindo-se Loulé (6871 AL e 29.063 camas), Portimão (6115, 17.737), Lagos (5827 e 21.951) e Lagoa (3747 e 14.524).

Ainda segundo os dados revelados por Cláudia Almeida, por freguesias, aquela que se destaca é Albufeira e Olhos de Água, com 8415 AL aí registados. A segunda freguesia tem mais ou menos metade desses: trata-se da Freguesia de São Gonçalo, em Lagos, com 4110 AL.

Seguem-se, já a grande distância, a União de Freguesias de Lagoa e Carvoeiro (2201), Luz de Lagos (1509) e Guia (1305).

 

Aspeto do auditório municipal de Albufeira durante a conferência sobre o AL

 

No Algarve, 66,37% do AL pertencem a pessoas singulares, enquanto apenas 33,63 são propriedade de empresas. Ou seja, há pouco peso de grandes proprietários na região algarvia.

No AL cá pelo Algarve, 65,7% são apartamentos, 30,8% são moradias, dividindo-se o restante por quartos (0,9%), hostels (0,3%) e estabelecimentos de hóspedes ou guesthouses (2,3%).

O Alojamento Local é também responsável pela grande maioria das camas turísticas nos 16 concelhos algarvios, à exceção de Monchique (onde há poucos AL e é maior o peso dos hotéis) e de Vila Real de Santo António, onde pesa muito a hotelaria tradicional em Monte Gordo.

2018 foi o ano em que abriram mais AL no Algarve (5992), enquanto em 2023, apesar de todas as nuvens que ensombram o futuro do setor, já abriram 4848.

Os dados revelados e comentados pela investigadora do CinTURS dão bem uma ideia da importância do setor do Alojamento Local na região do Algarve. «Um destino não pode ser só hotelaria, não pode ser só apartamentos turísticos, tem que ter outro tipo de alojamento», sublinhou a professora da Universidade do Algarve.

 

 

Cláudia Ribeiro de Almeida terminou a sua apresentação falando do impacto que o AL tem em todos os setores da economia, desde os serviços, aos transportes, à restauração e animação noturna, ao pequeno comércio, aos parques de diversões e museus, até à cobrança de impostos e taxas, já para não falar na reabilitação urbana.

«Quando fui viver para Faro, há 22 anos, havia uma série de casas abandonadas naquela zona, assim como em Olhão. Hoje, estas cidades têm uma dinâmica brutal e muito se deve ao Alojamento Local», acrescentou.

De facto, a própria construção e imobiliária será afetada, ao avançarem as draconianas medidas preconizadas no pacote “Mais Habitação”. Como lembrou Eduardo Miranda, «a compra de imóveis de férias no Algarve sempre teve na exploração para turistas um argumento».

José Carlos Rolo, presidente da Câmara de Albufeira, presente na conferência promovida pela ALEP, por seu lado, sublinhou que o AL «não interessa só por si, mas também por todos os negócios que giram à sua volta».

O autarca, que lamentou que as Câmaras não tenham sido ouvidas pelo Governo para a elaboração do pacote “Mais Habitação”, acrescentou que «antes de haver AL, as camas já estavam disponibilizadas, eram as camas paralelas, mas não tinham qualquer controlo, o que havia era fuga aos impostos».

Quanto ao argumento de que as medidas impostas ao AL são para garantir mais casas para arrendamento no mercado, Rolo foi perentório: «ninguém vai passar as casas de AL para habitação».

Ou, como salientou o empresário Reinaldo Teixeira, CEO do grupo empresarial Garvetur, também convidado da conferência, se passar, «será a preços tão altos que não será o cidadão médio que as poderá arrendar».

José Carlos Rolo admite que o Alojamento Local tem que ter «alguma regulação», para evitar certos problemas, como o do ruído. Mas defendeu que «não é acabando com o AL que se vai resolver o problema da habitação, isso é querer esconder o problema».

 

 

O empresário Reinaldo Teixeira, que participou na definição das primeiras regras do AL, recordou que «desde há 40 anos que ando nisto e já queimei muitas pestanas nesta matéria».

«Se isto for para a frente – e estou a ver isto com dificuldade em voltar para trás… – é desarrumar o que estava arrumado. Se isto avançar, vão criar informalidade, bem como medo e desconfiança por parte dos potenciais investidores. Isto afeta a confiança do investidor, porque é alterar as regras a meio do jogo. Quem está lá fora, a pensar investir, ouve isto e recua. Que imagem é que se está a passar de Portugal?», interrogou Reinaldo Teixeira.

«Os investidores pensarão: se não posso rentabilizar, não compro. E se não compram, não há compra de terreno, não há IMT, não há trabalho de arquiteto e engenheiro, não há trabalho para as empresas de construção», disse ainda. «Tudo isto terá um impacto no PIB que é incalculável!», alertou.

«Isto não resolve o problema da habitação, pelo contrário, prejudica!», afirmou. Quem investiu no AL, como é o caso da Garvetur, «está totalmente empenhado em fazer parte da solução para a habitação. Mas não desta maneira. Isso consegue-se incentivando a economia, fazendo com que as pessoas invistam, não o contrário».

Para hoje, 19 de Julho, o setor do Alojamento local preparou uma «mobilização nacional», frente à Assembleia da República, para protestar contra a muito provável aprovação do programa “Mais Habitação”.

Mas Eduardo Miranda, presidente da ALEP, perante as mais de centena e meia de pessoas que encheram o auditório municipal de Albufeira, prometeu que a luta do setor não vai ficar por aqui, nem acabar com a aprovação do pacote.

Anunciou que a associação está «a trabalhar num parecer jurídico sobre esta lei», prevendo até um possível recurso para o Tribunal Constitucional e mesmo para a Comissão Europeia, «porque esta lei vai contra as regras da livre concorrência».

Com as novas medidas, avisa, haverá um forte retrocesso na economia e na regulação das camas para alojamento turístico em todo o país.

«Ainda vamos voltar a ver a Tia Maria e o Tio Manel que tinham os chambres, rooms, zimmers», ironizou Cláudia Ribeiro de Almeida.

 

 

Nota: todos os gráficos foram retirados da apresentação de Cláudia Ribeiro de Almeida, denominada «As dinâmicas do alojamento local num destino de sol e mar. O caso do Algarve», a quem o Sul Informação agradece a colaboração.

 

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