Orçamentos Participativos do Japão vão ter um “toque” algarvio

A ideia é obter conhecimento para promover os primeiros Orçamentos Participativos naquele país

Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação

Haruka Fujiwara e Emi Kobayashi vieram de muito longe e fizeram a demorada viagem entre o Japão e o Algarve com um objetivo (aparentemente) simples: saber o que é um Orçamento Participativo e conhecer boas práticas de promoção deste processo de participação cidadã.

E foi com a ajuda da Oficina, uma associação sem fins lucrativos algarvia focada na promoção da participação cívica e da cidadania, e de vários municípios portugueses, que as duas professoras e investigadoras japonesas, vindas das Universidades de Fukushima e de Yokohama, aprenderam mais sobre Orçamentos Participativos, numa visita ao Algarve e a outros pontos de Portugal, entre os dias 13 e 18 de Março.

Parte desse tempo foi passado na Universidade do Algarve, em cujo ninho de empresas a Oficina tem a sua sede, a conhecer bons exemplos de Orçamentos Participativos que se realizam em diferentes municípios portugueses.

«Fiquei muito impressionada com a experiência portuguesa de orçamento participativo. Achei o sistema muito sofisticado», disse ao Sul Informação Haruka Fujiwara, que encontra paralelismos entre os sistemas orçamentais de Portugal e Japão, «o que poderá possibilitar introduzir o modelo português de OP nos municípios japoneses».

Hakura Fujiwara e Emi Kobayashi não escolheram o Algarve e a sua universidade por acaso. «Escolhemos Portugal porque lemos o Atlas Mundial dos Orçamentos Participativos criado pela Oficina e percebemos que o vosso país tinha boas práticas, incluindo comparando com outros países da Europa. Desta forma, achámos que poderíamos obter mais ideias, ao visitar Portugal».

O documento a que as duas académicas vindas do Japão se referem foi elaborado pela Oficina, uma organização que foi fundada e é liderada pelo sociólogo Nelson Dias, antigo presidente da In Loco e especialista em participação e cidadania, nomeadamente em Orçamentos Participativos, que está ligado a dezenas de processos desta natureza não só em Portugal, mas em quatro continentes.

«Há vários municípios no Japão interessados em começar processos desta natureza. Há um município da Área Metropolitana de Tóquio cujo presidente decidiu implementar o OP e já estão a ser feitos os preparativos para que arranque no próximo ano», segundo Hakura Fujiwara.

O objetivo é «aprender e, mais tarde, propor aos munícipios um sistema e estratégias de Orçamento Participativo».

 

Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação

 

Hakura Fujiwara e Emi Kobayashi «tiveram conhecimento que em Portugal existem muitas iniciativas de Orçamento Participativo, algumas delas com interesse e relevo até internacional. Depois tiveram conhecimento do trabalho que a Oficina desenvolve nesta área da participação pública, não apenas os Orçamentos Participativos, mas também em outras matérias. E questionaram-se: “porque é que o Japão não está”? », enquadrou, por seu lado, Nelson Dias, em declarações ao Sul Informação.

O também consultor do Banco Mundial, da ONU e do Orçamento Participativo Jovem Portugal conta que falou com as duas investigadoras japonesas, que decidiram, depois disso, organizar uma visita a Portugal.

«Pediram para vir cá, porque os processos de orçamento participativo no Japão estão a começar. Eles têm outras iniciativas de participação, mas não desta natureza, em que há uma afetação de dinheiro público», explica Nelson Dias.

«O que nós fizemos aqui foi preparar uma visita em que explicámos, no primeiro dia, o que é um OP, como é que se organiza, as condições que é necessário reunir, o que é que são boas práticas e o que é que são más práticas – porque também as temos», enquadrou.

A Oficina também convidou várias autarquias portuguesas para dar o seu testemunho, de modo a que as convidadas pudessem contactar com «uma certa diversidade de casos».

Uma delas foi a Câmara de Tavira, que «está aqui próxima e foi possível ter os representantes numa sala aqui na Universidade», sessão à qual o Sul Informação assistiu e durante a qual as visitantes fizeram muitas perguntas.

Os outros fizeram por videoconferência, «porque era mais fácil, por causa das deslocações».

 

Investigadoras japonesas com a comitiva de Tavira e a equipa da Oficina – Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação

 

«Elas ficaram fascinadas com o que viram, mas também preocupadas com aquilo que está por detrás de uma coisa destas, porque não basta, simplesmente, dizer que vamos fazer», acrescentou.

«Vamos focar-nos em poucos municípios, para experimentar e tentar começar. Não podemos espalhar muito, antes de termos mais experiência», salienta Haruka Fujiwara.

Esta cautela tem a ver com a própria cultura japonesa, que é muito diferente da ocidental. Apesar de, no Japão, ser um hábito ouvir os cidadãos, os «agentes políticos pensam que a participação pública só deve ser, de facto, uma realidade, se melhorar a eficiência e eficácia da máquina do Estado», segundo o fundador da Oficina. 

«Então elas vieram aqui tentar perceber de que forma é que este processo pode ajudar a melhorar a eficácia e a eficiência, porque esses são os argumentos que elas vão ter que utilizar para conseguir convencer os políticos lá do Japão», reforçou.  

Ou seja, será necessário adaptar aquilo que viram e ouviram em Portugal, uma vez que os OP, no nosso país, foram pensados, «sobretudo, para reconstruir a confiança, numa sociedade que não confia tanto na administração pública». 

Agora, as duas académicas japonesas «têm imensa informação e vão trabalhar sobre isso». 

«O Japão vai passar a constar no Atlas com estas primeiras iniciativas que está a desenvolver. E eu acho que se abriu aqui uma porta de cooperação entre Portugal e o Japão, que pode levar a que venham cá políticos japoneses, a que possam ir equipas nossas lá. Penso que essa porta se abriu. Há, pelo menos, a garantia de que elas vão fazer parte do Atlas nas próximas edições», concluiu Nelson Dias. 

 

 

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