Reserva Natural da Lagoa dos Salgados é boa notícia, mas faltam medidas e articulação com Parque Marinho

Almargem discorda da decisão da Câmara de Silves, que optou «por não revogar a Unidade Operativa de Planeamento para onde está previsto o empreendimento agora nas mãos do Banco Millenium BCP»

A associação ambientalista algarvia Almargem congratula-se com a proposta de criação da Reserva Natural da Lagoa dos Salgados, mas salienta que há «ainda muito trabalho por fazer para proteger este importante local, com medidas concretas a serem aplicadas no terreno», não podendo ser esquecida «a articulação com o futuro Parque Natural Marinho do Recife do Algarve.

A Almargem considera que o anúncio feito no dia 22 de Novembro, pelo Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), «constitui sem sombra de dúvida um marco histórico para a conservação da Natureza no Algarve, mas também uma vitória de todos aqueles que, ao longo de mais de duas décadas, lutaram para que a Lagoa dos Salgados tivesse um estatuto de proteção como o agora anunciado, o qual é plenamente justificado».

A associação recorda que «a proteção desta área é há muito reivindicada, por várias Organizações Não-Governamentais de Ambiente (locais e nacionais), entre as quais a Almargem, através da participação na Plataforma dos Amigos da Lagoa dos Salgados, a qual integra membros da sociedade civil», nomeadamente «Frank McClintock, responsável pela petição “Save Salgados” que mobilizou mobilização de mais de 35.000 pessoas em torno desta causa».

A própria Almargem promoveu, em 2019, um estudo sobre três Zonas Húmidas da região, que incluiu, além da Lagoa dos Salgados, outras duas zonas húmidas – Foz do Almargem e Trafal, em Loulé, e Alagoas Brancas, em Lagoa – que não gozavam de qualquer estatuto de proteção.

Este estudo viria a concluir sobre «a importância da Lagoa dos Salgados e a necessidade de promover a sua proteção efetiva por via da classificação da área, e a correspondente revisão dos PDM em vigor de forma a assegurar os seus valores naturais».

A associação sublinha que a zona onde se localiza a Lagoa dos Salgados «integra uma vasta área, conhecida por Praia Grande, onde se inclui uma outra zona húmida – o Sapal/Foz da Ribeira de Alcantarilha». Toda essa área tem «grande interesse científico ao nível geológico e biológico, não só por albergar uma grande quantidade e variedade de espécies de aves, mas também pela sua riqueza em flora, fruto de um mosaico de habitats, que, além de integrar aquelas duas zonas húmidas, inclui sistemas dunares, prados, pomares de sequeiro e habitats de natureza agrícola, constituindo um dos únicos troços livres do litoral central do Algarve».

A Almargem acrescenta que «apesar do atual PDM de Silves (cuja revisão teve lugar recentemente) condicionar bastante a ocupação/alteração do uso do solo naquela área», a verdade é que «continua a pairar sobre esta área a ameaça do mega-empreendimento que está previsto para a zona da Praia Grande», que contempla três hotéis de 4 e 5 estrelas e cerca de 350 unidades residenciais integradas em aldeamentos turísticos, num total de 4.000 camas, bem como um campo de golfe com 18 buracos.

Por isso, a Almargem discorda da decisão da Câmara de Silves, que optou «por não revogar a Unidade Operativa de Planeamento para onde está previsto o empreendimento agora nas mãos do Banco Millenium BCP», e recorda que esse projeto «foi chumbado em definitivo em 2018», após um processo de Avaliação do Impacte Ambiental.

Aliás, em 2012, seis organizações não governamentais de ambiente – SPEA, A Rocha, Liga para a Protecção da Natureza, Quercus, Geota e Almargem – entraram com uma ação em tribunal, pedindo a impugnação do Plano de Pormenor de Praia Grande de Silves, bem como da primeira Declaração de Impacte Ambiental, datada de 2013. Nove anos depois, a ação ainda está pendente no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé.

A Almargem diz querer acreditar que a decisão de criar a Reserva Natural «resulta de um interesse genuíno em preservar toda a área entre a Lagoa dos Salgados e o Sapal de Alcantarilha – proposta que irá fazer valer em sede de Consulta Pública – em articulação com o futuro Parque Natural Marinho do Recife do Algarve».

Só que essa classificação, na opinião daquela associação ambientalista, não é «de todo compatível com a ocupação prevista para a Praia Grande».

Por isso, exorta as autoridades «a impedir o avanço do referido projeto nos moldes anteriormente apresentados, por mais “verde” que seja o rótulo que lhe seja colocado, substituindo-o por um projeto que seja verdadeiramente sustentável e respeitador do património natural que esta área alberga».

Em paralelo, a Almargem diz esperar «que este ato de classificação seja acompanhado, de forma indubitável, por um conjunto de medidas concretas», que «promovam a efetiva proteção das duas zonas húmidas existentes na zona e da área que as enquadra».

Essas «medidas concretas» deverão passar pela «execução das ações necessárias para a manutenção e recuperação das espécies que ali ocorrem, bem como dos habitats em presença e dos geossítios identificados, a valorização do património cultural em presença, a elaboração e dinamização de um programa anual de atividades, bem como o condicionamento da visitação a um regime que permita o usufruto lúdico e pedagógico da Lagoa, mas que garanta ao mesmo níveis mínimos de perturbação do ambiente natural».

Depois da publicação do anúncio em Diário da República, no dia 23 de Novembro, a criação da Reserva Natural da Lagoa dos Salgados entrará em fase de discussão pública no próximo dia 6 de Dezembro. Os contributos poderão ser dados durante 30 dias úteis.

Durante o período de discussão pública, os documentos que compõem o processo referente à presente proposta de classificação podem ser consultados a partir do portal do ICNF e do portal Participa.

A consulta presencial dos documentos disponibilizados poderá ser feita durante o horário normal de expediente nos serviços centrais do ICNF, em Lisboa, e na Direção Regional da Conservação da Natureza e Florestas do Algarve, no Centro de Educação Ambiental de Marim, Quelfes, Olhão.

Devido à Covid-19, o atendimento presencial será efetuado através de agendamento prévio para o endereço eletrónico [email protected].

Durante o período de discussão pública, os interessados poderão apresentar as suas observações e sugestões diretamente no portal Participa, ou através de correio eletrónico para o endereço [email protected] ou por correio postal dirigido ao Presidente do Conselho Diretivo do ICNF, para a morada da sede do ICNF, na Avenida da República, n.º 16, em Lisboa (1050-191), mediante o preenchimento da ficha de participação (que poderá ser descarregada aqui), até à data do termo da consulta.

 

 
 



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