«Este edifício tem boas acessibilidades?», interrogou Joana Gorgueira, gestora de projetos da Associação Salvador. A maior parte das pessoas presentes na sala respondeu que sim.
O edifício em causa é o Pátio das Gerações, em Lagoa, que, há alguns dias, recebeu o lançamento da candidatura “Projeto Acessibilidade 2.0 – Algarve + Acessível para Todos”, que resulta de um protocolo entre a Câmara Municipal e a Associação Salvador.
Já agora, a resposta à pergunta era: tem boas acessibilidades para alguns, como as pessoas com deficiência motora que usam cadeira de rodas, mas más para outras, como os cegos, por falta de um piso tátil.
Anabela Simão, vice presidente da Câmara de Lagoa, que participava na sessão de apresentação da candidatura, salientou que o edifício municipal do Pátio das Gerações se destina «a todas as gerações, todas as idades», uma vez que «quem está à frente de um Município tem de olhar para todos e por todos». Mas ainda há muito mais a fazer.
O projeto Acessibilidades 2.0, que conta com financiamento através do Programa Algarve2030, visa «combater a exclusão social de pessoas com deficiência através de soluções inovadoras que melhorem a acessibilidade física e informacional». As primeiras ações deverão ter lugar na cidade de Lagoa, mas prevê-se alargar a intervenção a todo o concelho.
Será desenvolvido um Assistente Virtual para facilitar o acesso a produtos de apoio e informações cruciais, além da atualização da aplicação (app) Map4Accessibility, permitindo às próprias pessoas com deficiência mapear e obter informações sobre acessibilidade em espaços públicos, promovendo a equidade social.
Será ainda promovida a melhoria da autonomia das pessoas com deficiência (PCD), facilitando o seu acesso a produtos de apoio e ao planeamento eficiente de trajetos, até como forma de reduzir o seu isolamento social e económico, promovendo a igualdade de oportunidades.

Outros objetivos são aumentar o bem-estar e autoestima das pessoas com deficiência, reduzindo problemas de saúde física e mental provenientes do isolamento social, aumentar a participação ativa das PCD na sociedade e nos processos de decisão que afetam diretamente as suas vidas, assegurando uma representação equitativa.
Neste sentido, o objetivo específico deste projeto é a inclusão social de pessoas com deficiência através de ferramentas tecnológicas, atividades de capacitação, empoderamento e sensibilização.
Para isso, o projeto conta com uma atividade principal intitulada “Desenvolvimento de um Assistente Virtual e Ações de Capacitação, Sensibilização e Self Advocacy – Acessibilidades 2.0: Algarve + Acessível para todos” e seis tarefas, cinco das quais totalmente dedicadas ao público-alvo.
Joana Gorgueira, gestora de projetos da Área das Acessibilidades da Associação Salvador, salientou, na sua apresentação, a necessidade de haver «apoio dos Municípios para este tipo de projetos».
No Algarve, acrescentou, além de Lagoa, também Faro, Portimão e Loulé vão apresentar candidaturas, prevendo-se até, em Outubro próximo, um grande evento nacional sobre o tema da Acessibilidade que envolverá os quatro municípios algarvios.
A tarefa não é fácil. «Mais de 70% das autarquias em Portugal não têm plano de Acessibilidade», enquanto «mais de 90% das lojas e restaurantes não são acessíveis», salientou Joana Gorgueira.
De tal forma que, como partilhou Luís André, embaixador da Associação Salvador, «nós, pessoas em cadeira de rodas, temos de planear qualquer saída, para perceber antes se é acessível ou não».
O lagoense Tiago Cantigas, campeão do Mundo e da Europa de andebol em cadeira de rodas em 2022 e militar da GNR de profissão, que participava na sessão até por ser embaixador local, lamentou a dificuldade em «encontrar pavilhões desportivos adaptados com capacidade para receber uma equipa inteira».
Mas também salientou que, no concelho de Lagoa, como em toda a parte em Portugal, «a via pública é um grande desafio».
Apesar dos investimentos que a Câmara tem vindo a fazer nos últimos anos, Tiago Cantigas apontou diversas falhas no espaço público, em zonas do Parchal, Ferragudo e Molhe, assim como a falta de casas de banho adaptadas e de saídas de emergência que possam ser utilizadas por pessoas com deficiência.

Por seu lado, Miguel Conduto, técnico superior do Município de Lagoa, onde é responsável pelas Áreas da Reabilitação Urbana e Mobillidade, afirmou que «o grande inimigo público da acessibilidade é a apropriação do espaço público pelo automóvel».
Este responsável anunciou igualmente que, no Auditório Municipal Carlos do Carmo, em Lagoa, está a ser desenvolvido um «projeto integral de acessibilidade», que garanta condições não só para o público, como para os artistas e os técnicos.
Por outro lado, está prestes a ser instalada a primeira passadeira com semáforo sonoro para pessoas com deficiência visual. Mas há muitas outras intervenções em curso no concelho, para tornar Lagoa mais inclusiva e acessível.
Luís André aproveitou para deixar um «desafio» ao Município: «há quatro anos, fui à Fatacil para um espetáculo, mas, na zona destinada a pessoas com deficiência, não conseguia ver nada para o palco». Além disso, «se há estacionamento para pessoas com deficiência, essa informação não está visível».
Por isso, desafiou, porque não é criada uma «bancada acessível ou um palco elevado, acessível por rampa, onde uma pessoa com deficiência, como eu, possa ver os espetáculos em condições?»
Depois da apresentação, o grupo saiu para a rua, junto à Escola EB1 de Lagoa, ao Convento de São José e à Junta de Freguesia, em pleno centro antigo da cidade. E foi possível constatar que, mesmo coisas que parecem facilmente transponíveis, como um ressalto no pavimento de meros dois ou três centímetros, podem ser obstáculos à vida das pessoas com deficiência motora.
Luís André mostrou o caso do lugar de estacionamento para deficientes frente à escola, mas situado numa zona de piso muito inclinado, que o torna quase inutilizável pelas pessoas a quem, em teoria, o espaço se destina.
Curiosamente, ali a meia dúzia de metros, em local plano e bem mais acessível, foram criados dois lugares de estacionamento para…tuk-tuks.
Em resumo: o “Projeto Acessibilidade 2.0 – Algarve + Acessível para Todos” chega em boa altura, porque em Lagoa, cidade e concelho, há, de facto, muito a fazer no que à acessibilidade diz respeito.
Obrigado por fazer parte desta missão!