Dois documentários que abordam as questões da escravatura e do passado colonial português vão ser exibidos no ciclo de cinema “Libertar a Memória #2”, que terá lugar nos dias 31 de Outubro e 14 de Novembro, no Armazém Regimental de Lagos, às 19h00, e se enquadra na programação do Museu de Lagos – Núcleo Rota da Escravatura.
As sessões, com entrada gratuita, serão seguidas de debate e incluem a oferta de livros selecionados no contexto do programa, que pode ser consultado aqui.
No dia 31 de Outubro, será exibido o documentário “Debaixo do Tapete”, da jornalista algarvia Catarina Demony, «cujos antepassados, os Matoso de Andrade e Câmara, foram dos maiores comerciantes de pessoas escravizadas em Angola entre o século XVIII e XIX, fazendo fortunas à custa de seres humanos retirados das suas terras à força», segundo a Câmara de Lagos.
Segue-se um debate moderado pela cineasta, investigadora e artista Patrícia Leal, com os convidados Apolo de Carvalho, mestre em Politique et Développement en Afrique e dans les Pays des Sud, pela Sciences Po Bordeaux, e Nuna, «multipremiada atriz, ativista tendo por base o afrofuturismo, tendo colaborado com as Nações Unidas, União Europeia, presidência portuguesa entre outras instituições».
No dia 14 de Novembro, poderá ser visto o documentário “Visões do Império”, da investigadora e realizadora Joana Pontes, no qual, «através da análise de registos fotográficos, torna-se possível reexaminar de forma crítica a História de Portugal e das antigas colónias, usando a fotografia enquanto objeto indispensável neste processo de conhecimento e reflexão».
O debate que se seguirá será moderado por Débora Pinho Mateus, antropóloga visual, formadora, produtora e programadora do FICLA – Festival Internacional de Cinema e Literatura do Algarve (2019 -2022) e membro da direção do Cineclube de Tavira. As convidadas são Marta Lança, jornalista, investigadora, programadora e editora, fazendo regularmente projetos nos PALOP, e Lúcia Furtado, uma das fundadoras da Femafro – Associação de Mulheres Negras, Africanas e Afrodescendentes em Portugal onde exerce a função de presidente da Direção, e que esteve envolvida na campanha por uma Outra Lei da Nacionalidade, no grupo que pretendia a Recolha de Dados Étnico-Raciais nos censos de 2021.
O programa contempla ainda uma curadoria literária da responsabilidade de Marta Lança e do projeto Buala, com «livros escolhidos para enquadrar, desafiar e abrir novos caminhos e consciência para estes temas e que poderão ser adquiridos em cada sessão».
«Nesta edição, dá-se continuidade ao uso do cinema como instrumento de discussão, de linguagem transformadora, de educação e conhecimento sobre um tema tão desconfortável quanto necessário: fala-se da História, de escravatura, do passado colonial e pós-colonial e das suas consequências que perduram até hoje num Portugal ainda com dificuldades em abordar estes assuntos, bem como pensar o seu impacto na construção da atual sociedade portuguesa. Assim, procura-se, através deste programa, suscitar o debate, colocar questões e abrir o diálogo ao público e à sociedade em geral», descreve a Câmara de Lagos.
«Fazê-lo em Lagos tem especial relevância, uma vez que se assume como local emblemático na História da expansão portuguesa e também como o primeiro posto de desembarque europeu de pessoas escravizadas. Na atualidade, a relevância da descoberta em 2009, de 158 ossadas de africanos escravizados onde, nos séculos XV a fim XVI-inícios do XVII, seria uma lixeira urbana comum do Vale da Gafaria, hoje a funcionar como um parque de estacionamento, veio confirmar as fontes documentais que referem que em Lagos aconteceu a grande primeira venda de pessoas escravizadas», acrescenta a autarquia.
Esta descoberta «é considerada a única de grandes dimensões conhecida na Europa. Questiona-se então, se a História, tal como a aprendemos, nos tem sido bem contada – o que se escolhe ensinar em detrimento do que se oculta? O que realmente sabemos sobre este assunto? E que vozes não foram ouvidas até agora que ainda é necessário ouvir?».
Libertar a Memória é um projeto promovido por O Corvo e a Raposa – Associação Cultural, com a coordenação e direção artística de Luísa Baptista, apoiado pela CCDR Algarve, I.P., tendo como parceiro o município de Lagos, Museu de Lagos – Núcleo Rota da Escravatura. Conta com o apoio de Cineclube de Faro, BUALA.org, Museu Zer0 e a livraria A Internacional.