A pornografia “está a transformar por completo” as relações entre os jovens, alertou a presidente da Comissão Nacional de Proteção das Crianças e Jovens, para quem este fenómeno pode ser contrariado com “educação muito próxima”.
Em entrevista à agência Lusa para um balanço dos sete anos em que esteve à frente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ), Rosário Farmhouse alertou para o impacto nas crianças e jovens da exposição a conteúdos pornográficos, tendo por base estudos internacionais.
“[A pornografia] está a transformar por completo as relações entre adolescentes porque, quando começam a chegar à puberdade, o exemplo que têm foi baseado em conteúdos que viram e que são desadequados para a idade deles”, apontou.
Segundo a responsável, estão a perder-se as relações de afetividade e os adolescentes estão a experienciar “graves problemas de iniciação da sua vida [sexual] ”.
“Não sabem como iniciar porque querem replicar aquilo que viram, porque acham que aquilo que viram é que deve ser o modelo”, explicou, apontando que isso muitas vezes tem como consequência relações de subjugação e de violência.
Rosário Farmhouse salientou que alguns adolescentes “acabam por entrar em relações que não querem porque acham que isso é normal”.
“Sentem-se violentadas, muitas raparigas queixam-se disso. Os rapazes sentem uma frustração enorme por não corresponderem e tudo porque não tiveram formação e porque não perceberam que há todo um caminho a percorrer até depois fazerem o que entenderem dos seus corpos”, alertou.
“Há todo um caminho a percorrer, que tem várias etapas que têm que ser seguidas”, acrescentou.
De acordo com a responsável, não há por enquanto dados sobre esta realidade em Portugal e os estudos mais recentes baseiam-se na experiência australiana e inglesa.
O Conselho da Europa está a tentar construir materiais que ajudem os vários países a lidar com estes “desafios novos” e para que possa “vir a haver uma educação sexual adequada à idade”, para todas as crianças.
“Sendo que esta é uma matéria que para alguns países ainda é tabu”, apontou.
A presidente da CNPDPCJ contou que o Conselho da Europa está a tentar um consenso com os 46 Estados-membros, criando “documentos estruturantes e que permitam que as crianças cresçam de forma saudável em todos os ambientes”.
“É um dos grandes desafios neste momento”, apontou, sublinhando que esta questão está relacionada com a pouca qualificação digital por parte dos pais e a consequente pouca supervisão.
Para Rosário Farmhouse, só será possível contrariar este fenómeno com “uma educação muito próxima”.
A responsável defendeu que as crianças com competências digitais podem aprender não só os benefícios, mas também os perigos da internet, bem como os cuidados a ter no acesso a determinados conteúdos, formação que deve ser extensível aos pais ou cuidadores.
“Só com esta educação é que conseguimos proteger, porque estamos perante um mundo que não tem fronteiras, que deixou de ter forma de travar o que quer que seja. Ou conseguimos pela educação chegar lá ou então vamos estar todos desprotegidos”, salientou.
Sobre a educação sexual nas escolas, a responsável entende que “os conteúdos têm que ser adequados à idade”, preparados por pessoas que saibam falar do tema.
A par da educação sexual, a presidente da CNPDPCJ defendeu que é “absolutamente fundamental” que haja uma educação intercultural, apontando que as escolas são cada vez mais plurais e diversas e que isso “é uma enorme oportunidade”.
“Temos de os ensinar a viver juntos. O respeito pelos outros, não generalizar, não julgar antes de conhecer, celebrar as diferenças é fundamental e as escolas que conseguem aproveitar a oportunidade da diversidade são escolas em que todos ganham”, afirmou a responsável.
Texto de Susana Venceslau (Agência Lusa)
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