O Festival Terras sem Sombra vai, pela primeira vez, a Coruche, no próximo fim de semana de 29 e 30 de Junho, e vai, literalmente, «meter água». As palavras, bem humoradas, são de Sara Fonseca, diretora executiva do certame, que convida todos os amantes da música para uma «estreia absoluta»: um concerto «no meio do rio Sorraia, dentro de um barco, com músicos profissionais de primeira água».
O fim-de-semana contará, assim, com um concerto “aquático”, sulcando as águas do rio Sorraia, no Festival Terras sem Sombra (TSS). O terceiro concerto da 20.ª edição desta temporada musical arreigada ao Alentejo encontra novos horizontes contíguos à planície, em pleno Ribatejo, no concelho de Coruche.
Num momento único que une música, património e biodiversidade, o TSS apresenta-se assim, em parceria com o município de Coruche, numa visita a terras ribatejanas que sublinha a mundividência do TSS, um festival que se afirma no panorama nacional e internacional, este ano com Itália como país convidado.
«Ter a Itália, essa grande nação lírica, como país convidado em 2024, quando o Terras sem Sombra cumpre a sua 20.ª edição, é um privilégio e uma distinção. A Itália, além de ser um marco da história da música, é uma potência europeia que encontrou na cultura um softpower impressionante», assinala José António Falcão, diretor-geral do Festival.
E acrescenta: «esta presença constitui um avanço extraordinário para a vida artística do Alentejo e abre portas a outros intercâmbios relevantes do ponto de vista social e económico; trata-se verdadeiramente de um grande passo em frente e queremos prossegui-lo noutras vertentes».
Subordina ao tema «”Liberdade, quem a tem chama-lhe sua”: Autonomia, Emancipação e Independência na Música (Séculos XII/XXI)», o Terras sem Sombra vai, desta feita, ao encontro de terras coruchenses para um concerto marcado pela singularidade.
Em noite de Estio, o concerto, entregue ao talento do ensemble La Nave Va, decorre nas margens do Sorraia. Um convite a fruir a grande música junto a um curso de água que marca a geografia e a história de um dos maiores concelhos do país, com mais de 1115 quilómetros quadrados. Fonte de vida, abundante em recursos naturais, a serenidade deste rio imprime o tom ao momento musical. Será oportunidade para acompanhar a interpretação do quarteto de músicos que atuarão a bordo de uma embarcação tradicional do concelho, oferecida ao município e que foi recentemente recuperada.
A plateia, com 180 lugares, será instalada na areia da praia fluvial (bandeira azul) do Sorraia, sendo o acesso livre, como sempre acontece em todas as atividades do Festival.
A viagem musical que se faz em torno de obras, entre outros, de nomes maiores como Marc-Antoine Charpentier, Georg Friedrich Händel, Jean-Baptiste Drouart de Bousset, Pedro Lopes Nogueira e Henry Purcell, junta em palco um elenco de virtuosos.
A António Carrilho competem a direção musical e as flautas. Carrilho é um notável intérprete de flauta de bisel, pedagogo e maestro, várias vezes premiado. Organiza os Cursos Internacionais de Música Antiga da Casa de Mateus.
Ao palco sobe também Duncan Fox (violone), um estudioso de instrumentos de corda e de tecla de época, dando especial atenção ao violone.
Helena Raposo (tiorba e guitarra barroca) tem atuado em Portugal, Espanha, Inglaterra, Holanda, Bélgica, Itália e Alemanha, com diversos ensembles, tanto como solista, como contínuo/acompanhamento. É diretora artística e professora no Early Music Summer Camp, em Castelo Novo.
O quarteto completa-se com Armando Possante, barítono que se apresenta regularmente como solista em recital, oratória e ópera, tendo colaborado com as principais orquestras e maestros do país.
Entre o sagrado e o profano
Na sua dimensão patrimonial, o programa do Terras sem Sombra em Coruche contempla a atividade subordinada ao tema «Devoção e História: O Santuário de Nossa Senhora do Castelo e o Centro Medieval de Coruche».
Com ponto de encontro marcado para o santuário de Nossa Senhora do Castelo, no sábado, 29 de Junho (15h00), a agenda da tarde completa-se a vários tempos. A visita orientada por Dulce Patarra e Aníbal Mendes, do Museu Municipal de Coruche, e José António Falcão, historiador de arte com obra publicada sobre a arte sacra de Coruche, parte de um miradouro privilegiado sobre as terras contíguas.
Ali, onde a planície arborizada cede lugar às alturas, erigiu-se o santuário mariano de Nossa Senhora do Castelo, que deve o seu nome ao assentamento outrora nele existente, de reconhecida importância estratégica no processo da “Reconquista” cristã.
Reza a lenda que terá sido fundado por D. Afonso Henriques, em agradecimento a Santa Maria, após a tomada do castelo aos mouros. Na tribuna do altar-mor, a imagem de Nossa Senhora do Castelo, padroeira da vila, tem o Menino ao seu lado.
O périplo do TSS pelo centro histórico da vila termina com uma receção no Museu Municipal, equipamento inaugurado em 2001 e que tem por especial missão inventariar, salvaguardar e divulgar o património local, tanto material como imaterial.
Será oportunidade para os participantes da atividade assistirem à inauguração da exposição “Armindo Cardoso: Um Fotógrafo Humanista em Coruche”, que salienta o percurso de um homem, nascido no Porto em 1903, e a marca que deixou na sua passagem por Coruche, de 1979 a 1989.
Um cidadão do mundo, de França ao Chile, e um profissional que documentou profusamente o país após a Revolução de Abril, Armindo Cardoso fotografou, com talento plástico e argúcia documental, operários, agricultores, corticeiros, mineiros, pescadores, manifestações e reuniões de trabalhadores.
Homenagem à cortiça e ao montado
Num concelho onde é extraída cerca de 10% da cortiça nacional, a atividade do Terras sem Sombra dedicada à salvaguarda da biodiversidade faz justiça a esta feição corticeira. No domingo, 30 de Junho (9h30), o festival tem encontro marcado para o Largo de São José, ponto central da aldeia de São José da Lamarosa.
O objetivo da atividade com o tema «Património da Humanidade: O Montado e o Sistema Agro-Silvo-Pastoril», é a Herdade dos Leões, uma conhecida fazenda desta castiça freguesia coruchense, exemplar do ponto de vista da exploração da cortiça em moldes modernos e sustentáveis.
Ali, vai-se assistir a uma tirada de cortiça, sob a orientação do respetivo proprietário, o perito subericultor José Custódio Alves, e de José Mira Potes, especialista em Agro-Silvo-Pastorícia, antigo professor da Escola Superior Agrária de Santarém.
Depois de um interregno durante os meses de Julho e Agosto, a 20.ª temporada do Festival Terras sem Sombra prossegue a 7 e 8 de Setembro, no concelho de Castelo de Vide.
Toda a programação da presente temporada pode ser consultada no novo site do Festival Terras sem Sombra.