Isabel Palmeirim, obrigado e até logo

«Bem sei que, quando falas em alhos, a presente administração do CHUA responde com bugalhos»

Isabel Palmeirim – Foto: Hugo Rodrigues | Sul Informação (arquivo)

Existem pessoas com aptidões especiais que se colocam tão completamente no que fazem que se torna patente que paixão e resultados magníficos podem coexistir. E tu, Isabel, tens este dom.

Não falarei de um modo isento, já que há muito acompanho algum do teu percurso, sobretudo aquele de liderança do Curso de Medicina da Universidade do Algarve.

Lembras-te, o curso de medicina do Algarve, então criado, era assim uma espécie de coisa bizarra aos olhos de muitos? Ok, o curso tinha sido criado de acordo com critérios inovadores entre nós, mas há muito estabelecidos em países civilizados e, talvez por esse carácter inovador, rapidamente foi motivo dos comentários mais absurdos.

Claro que, não sejamos ingénuos, havia subjacente o entendimento: “desde quando é que esses tipos do Algarve são capazes de ter um curso de medicina?” É que, se resultasse, muitas outras coisas ficariam em aberto. E o curso resultou.

Acompanhei, desde o início, o processo do curso. Mesmo quando o Prof. José Ponte abanou as águas, dizendo que seria pólo de atração de outras competências, na altura, nós, praticantes da medicina no Algarve, sentimos isto como provocador, já que poderia incorporar uma leitura desqualificadora.

Mas, sempre com aquela atitude de quem não deve, não teme, mantivemos a expectativa e, ao terceiro ano do curso, quando os primeiros alunos começaram a passar pelos hospitais, desde o início ficou imediatamente claro que estaríamos a formar clínicos notáveis! O que hoje é claríssimo. Digamos com todas as letras: os médicos formados na universidade do Algarve são muito bons!

Isabel Palmeirim: muito da formatação do curso tem o teu dedo. Mas o que definitivamente penso que é igualmente de te atribuir parte de leão é esta excelente qualificação atribuída presentemente ao curso. Sei que não é tua característica pores-te em bicos dos pés, mas deixa-me recordar que, mais do que minhas impressões pessoais, alguns elementos que são teus:

– Criação de um centro académico clínico, o Algarve Biomedical Center (ABC), de cuja intensa atividade todos nós nos orgulhamos;

– Criação de uma Faculdade de Medicina e Ciências Biomédicas na Universidade do Algarve, já com ofertas formativas ao nível do 1º, 2º e 3º ciclos;

– Criação do centro de investigação, o ABC-Research Institute, já com um recorde na captação de financiamento;

– Criação de um Programa Doutoral em Investigação Clínica e Medicina Translacional, permitindo, pela primeira vez, a formação local de médicos doutorados;

– Criação de uma Pós-graduação em Fundamentos da Medicina para investigadores da Fundação Champalimaud, favorecendo a translação da ciência em Portugal;

– Criação de uma Pós-graduação em Ação Humanitária, totalmente inédita em Portugal;

– Criação de um Plano de Formação Contínua para profissionais na área da Saúde, essencial para a atualização pós-graduada dos profissionais de saúde;

– Assinatura de um novo Contrato-Programa com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e com as autarquias da região algarvia, com consequente incremento do número de vagas de formação no Mestrado Integrado em Medicina de 48 para 96 em 2025.

– Criação do Centro de Simulação Clínica que coloca o Algarve no mapa da formação médica portuguesa ao nível pós-graduado;

Sabendo isto e que outros elementos existem, naturalmente que a projeção que o curso de medicina da Universidade do Algarve atualmente atingiu não será de surpreender.

O desprendimento notável de que deste mostra, ao bateres com a porta com a tua demissão, face ao que está em causa, mostra uma seriedade que é a tua.

Naturalmente que o curso de medicina precisa dos hospitais do Algarve. Bem sei que, quando falas em alhos, a presente administração do CHUA responde com bugalhos. E cá nos vamos diminuindo, com este estado onde estão as coisas.

Que melhor analogia poderia existir senão a que verificamos presentemente na comunicação social, onde um ministro “tecnicamente” não mentiu já que não lhe perguntaram acerca de uma reunião, mas só falaram na outra? Será que ainda não se viu que assim não vamos lá? Não sei se será por estar presentemente fora do país em férias, que me aguçará este sentido de intolerância para a palermice que ainda prevalece.

Isabel Palmeirim, com aquela simplicidade que consegues transmitir para a complexidade das tarefas a executar (bem sei que existe uma simplicidade tola de quem não percebe nada do que fala e uma outra, notável, que advém do domínio perfeito das matérias) e que vejo na tua vida, permito-me antever que te poderei dizer: “Até logo, Isabel!”.

Este “até logo”, como qualquer algarvio sabe, não terá de ser já na próxima curva. Desculpa-me este possível “paternalismo” de, sendo algarvio, pretender dar explicações para um entendimento mais completo, mas como sabes, entre nós, o tempo tem o seu tempo e, por vezes, este fica tão claro que nem tem de ser dito muito alto. Abraço.

 

Autor: Daniel Cartucho é médico, cirurgião geral do Centro Hospitalar Universitário do Algarve (CHUA)

 

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