Tela bicentenária «de enorme valor» da Igreja de S. Pedro de Faro já está a ser restaurada

A tela que há mais de 200 anos emoldura o altar de Nossa Senhora da Vitória, na Igreja de São […]

A tela que há mais de 200 anos emoldura o altar de Nossa Senhora da Vitória, na Igreja de São Pedro, em Faro, já está a ser restaurada. A Fundação Millenium BCP acedeu ao apelo da diretora Regional de Cultura para patrocinar a recuperação deste elemento patrimonial «de enorme valor», que estava em risco de desaparecer, devido ao seu elevado estado de degradação.

O protocolo entre a Fundação e a Fábrica da Igreja de São Pedro, que formalizou a operação de restauro desta tela, foi assinado no sábado. Uma cerimónia que serviu, essencialmente, para oficializar o apoio de cerca de 23 mil euros que o Millenium BCP vai atribuir para recuperar este elemento patrimonial, que até já foi retirado do suporte em madeira onde estava pregado desde o século XVIII e enviado para Lisboa, onde será intervencionado.

Como explicou durante a cerimónia Alexandra Gonçalves, diretora Regional de Cultura, o valor da obra de arte que está a ser recuperada está intimamente ligado ao da própria Igreja de S. Pedro, imóvel classificado como Monumento de Interesse Público. A peça, «de autor desconhecido, mas datada da segunda metade do século XVIII», foi uma encomenda da Ordem de Santiago, que edificou a igreja em 1577, no local onde já existia uma capela, mandada erigir pelos pescadores do Bairro da Ribeira.

Já Susana Paté, do Museu Municipal de Faro, explicou que esta é «uma pintura cenográfica de enquadramento», criada para servir de moldura ao altar. «É composta por quatro panos pintados a óleo, em linho, cozidos entre si e pregados à estrutura em madeira que envolve o retábulo», enquadrou.

Com o passar dos anos, os pregos que foram utilizados para fixar a tela começaram a enferrujar, deixando marcas na peça. Em alguns locais, os pregos também estavam a sair, o que levou a que a tela começasse a sair do lugar. Por outro lado, houve infiltrações de água que causaram escorrimento da tinta e estragaram a obra. A própria estrutura de madeira que suporta os panos tem problemas, desde logo de infestação de caruncho e de outras pragas, mas também de desnivelamento.

A empresa Junqueira 220, que ganhou o concurso para restauro da peça, vai, grosso modo, estabilizar a peça, restaurá-la na medida do possível, sem a desvirtuar, corrigir intervenções feitas no passado – a tela foi repintada a dada altura – e intervir no suporte de madeira que envolve o altar.

Ao longo dos séculos, a Igreja de São Pedro foi, de resto, acumulando um espólio que continua a existir, embora nem sempre nas melhores condições. «Tenho de saudar a aposta crescente que há na recuperação do património, aqui no Algarve», algo que, considerou Fernando Nogueira, presidente da Fundação Millennium BCP, nem sempre aconteceu no passado, nomeadamente no que toca ao pertencente à igreja.

Fernando Nogueira

«A preservação do património é uma das coisas que mais me toca. É algo que os nossos antepassados ergueram, muitas vezes com enorme sacríficio, e nos legaram», disse.

«Esta igreja nasceu da vontade de homens do Mar. Depois veio uma ordem religiosa. O terramoto de 1755 destruiu grande parte do edifício, mas vontades ergueram-se para recuperar este património. O que estamos a fazer aqui hoje não tem, obviamente, essa dimensão, mas não deixamos de estar aqui para reabilitar um dos elementos mais importantes deste monumento», salientou Fernando Nogueira, que esteve em faro para assinar o protocolo.

O cónego César Chantre, pároco da Igreja de São Pedro, admite que tem sido difícil manter o vasto património da igreja, tendo em conta as limitações financeiras da paróquia. Mas, garantiu, «todos os responsáveis pela paróquia, ao longo do tempo, fizeram a sua parte».

O padre Chantre tem sido, de resto, um grande impulsionador da recuperação do espólio a cargo da Fábrica da Igreja de S. Pedro, seja através do apoio do Estado, como aconteceu nas obras de renovação do sistema elétrico e de recuperação do presbitério, seja com o apoio de outras entidades.

No âmbito da exposição “Pinturas do Barroco em Sevilha e no Algarve – Contactos, Coincidências e Discordâncias”, foi emprestada uma obra desta igreja ao Museu Municipal de Faro. «Nós conversámos com o museu, autorizámos a ida da peça e, como contrapartida, eles faziam o restauro dessa tela e nós pagaríamos a recuperação de outra», explicou o pároco.

O responsável pela Fábrica da Igreja de São Pedro adiantou que tentará introduzir dentro do financiamento dado pela Fundação Millennium a recuperação «de uma outra tela, que é uma que está ali na igreja e representa a Última Ceia».

Como se vê, património para recuperar não falta, no Algarve. E a Fundação Millennium BCP, que destina «cerca de um milhão de euros por ano» a apoiar projetos desta natureza em todo o país, sabe bem dessas necessidades e não tem virado a cara a dar o seu apoio.

«A doutora Alexandra Gonçalves apresentou-me este projeto no dia em que eu vim ao Algarve assinar um protocolo de apoio à recuperação do Castelo de Paderne. Isto leva a que agora tenha sempre um certo receio que ela me meta nas mãos e nos bolsos outra solicitação. Eu continuarei a vir ao Algarve, mas com algum cuidado», brincou Fernando Nogueira.

Desta vez, a diretora regional de Cultura do Algarve deu descanso a este mecenas, até porque, só este ano, foram três os projetos que a fundação apoiou, na região – também financiou o restauro de uma obra do Museu de Faro.

Na Igreja de São Pedro, os resultados do apoio poderão ser testemunhados assim que a Junqueira 220 termine o seu trabalho e volte a colocar a tela, desta vez com outros cuidados, nomeadamente ao nível dos elementos a usar para a sua fixação.

 

Identificação
Descrição: Tela pintada representando “Boca de Cena”, que emoldura o Altar de Nossa Senhora da Vitória, na Igreja de São Pedro, Faro
Localização: Igreja de São Pedro, Faro
Dono da obra: Igreja de S. Pedro
Técnica: Óleo sobre tela.
Dimensões: Grosso modo, dois triângulos superiores, com 2,5 m x 4 m e dois retângulos laterais com 5 m x 0,45 m
Autoria: Desconhecida
Datação: Séc XVIII

Comentários

pub