Coragem para pensar

Desde o atentado do passado dia 7 de janeiro, em Paris, abateu-se sobre a Europa, talvez não uma nova cortina […]

Anabela AfonsoDesde o atentado do passado dia 7 de janeiro, em Paris, abateu-se sobre a Europa, talvez não uma nova cortina de ferro, mas seguramente uma densa nuvem de medo. Sobre o ato em si todos temos uma opinião.

Desde os assumidos Charlies, destemidos defensores sem tréguas da liberdade de imprensa e de expressão, até aos mais cautelosos, apologistas da tese que coloca a possibilidade de se ter pisado algum risco que, ainda que não o justificando, possa ter, em alguma medida, contribuído para o atentado.

Num ápice, entrámos numa espécie de piloto automático de gestão da crise, que visa sempre essencialmente duas coisas: encontrar culpados e resolver o “problema”, o que neste caso quererá dizer acabar com a ameaça terrorista no nosso território.

As respostas (e as soluções) não tardam. Rever o Acordo de Schengen, reabilitar a pena de morte, trazer o exército para a rua, reforçar o controlo policial, etc.

Os dirigentes europeus desdobram-se em reuniões, contactos e intervenções públicas para nos assegurar que não cederão ao medo nem ao terrorismo. Mas será que não estão a fazer exatamente isso?

Quando a única estratégia que vemos ser aplicada de modo empenhado é a securitária e a militar, não será precisamente isso que os recrutadores de mais jovens para as fileiras do extremismo estão à espera? Não será esse clima persecutório que continuará a alimentar o ódio necessário para formar mais jihadistas?

Dos inúmeros comentários e artigos que ouvi e li sobre este assunto, destaco dois em particular: a chamada de atenção da historiadora Raquel Varela para o facto de, logo após o atentado, os comentadores de serviço na televisão serem sobretudo os militares ou especialistas em estratégia militar, sem qualquer espaço para historiadores, filósofos ou especialistas de outras dimensões do problema que porventura convirá não esquecer; e um artigo do filósofo Slavoj Zizek, que começava da seguinte forma: “Agora, quando estamos todos em estado de choque depois da matança nos escritórios do Charlie Hebdo, é o momento certo para reunir a coragem necessária para pensar.” (Tradução minha da primeira frase do artigo que pode ser lido aqui http://www.newstatesman.com/world-affairs/2015/01/slavoj-i-ek-charlie-hebdo-massacre-are-worst-really-full-passionate-intensity)

Pergunto-me se, sob o peso dessa nuvem de medo que se instala, aparecerá alguém com coragem necessária para dizer que também é necessário parar para pensar e procurar como parceiros outros que não apenas aqueles que só sabem responder pela via militar.

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