Jorge Froes: “Só a transferência de caudais de outras bacias permite garantir a água necessária aos diferentes usos”

Jorge Froes, engenheiro agrónomo e especialista em engenharia rural, traça um retrato da realidade da disponibilidade de água na região sul de Portugal e, em particular, da região do sudoeste alentejano. A conclusão é clara: “ou se implementam soluções de abastecimento através de interligações entre bacias, ou deixa de haver atividade económica viável a Sul, as populações emigram para as cidades e para o litoral, desertificando-se todo o Sul interior do País.”

Jorge Froes, Engenheiro agrónomo e especialista em Engenharia Rural

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O sudoeste alentejano, em particular a região de Odemira, encontra na agricultura a sua principal atividade económica, que representa cerca de 60% da totalidade. São mais de 40 culturas agrícolas que asseguram emprego a mais de 10.000 pessoas na região e que enfrentam um dos maiores desafios para a atividade: a disponibilidade de água.

Com vários milhões investidos ao longo dos anos na investigação e instalação de sistemas de uso de água mais eficientes, com recurso a tecnologia que permite dar a cada planta exatamente a água que ela necessita para ser produtiva, os produtores da região precisam de uma solução que garanta disponibilidade e previsibilidade para todos os tipos de consumo das várias atividades, desde a agricultura ao turismo e à indústria, sem esquecer o consumo doméstico.

No estudo “Interligação Alqueva – Mira: Reforço do abastecimento do Perímetros de Rega do Mira com base em caudais derivados do sistema do Alqueva”, desenvolvido por iniciativa da Lusomorango, Organização de Produtores de pequenos frutos, Jorge Froes apresenta aquela que defende como a melhor solução para o território. Neste estudo verifica-se que, apesar de ter capacidade para transportar 89hm3/ano, o Subsistema de distribuição de água, Rio de Moinhos – Monte da Rocha (alimentado pelo Sistema do Alqueva), transporta apenas 31hm3/ano, deixando disponíveis 58 hm3/ano, que podem ser usados na alimentação de zonas próximas com problemas de seca, nomeadamente o Perímetro de Rega do Mira.

A solução, que pressupõe um investimento de 63 M€, consta da duplicação do sistema existente, que liga o Reservatório 3 de Rio de Moinhos à Barragem do Monte da Rocha. A partir desta barragem será instalado um novo Sistema, semelhante ao anterior, agora com estação elevatória, seguida de conduta de ligação à albufeira de Santa Clara com 18 km de comprimento. Equacionada na solução está também a instalação dum novo Bloco de Rega perto de Ourique. Junto à albufeira, aponta-se para a instalação duma Central Hidroelétrica, que permitirá recuperar mais de 50% da energia gasta na elevação de caudais entre o Monte da Rocha e Santa Clara.

Jorge Froes sublinha que “o litoral alentejano sofre de seca já há alguns anos, desconhecendo-se se a mesma se prolongará indefinidamente. Apesar da capacidade de armazenamento de água disponível ser elevada, nomeadamente na barragem de Santa Clara, não existem afluências hídricas suficientes para responder às necessidades e a dessalinização, apesar de poder ser um recurso complementar, não é solução base para a agricultura, dado o elevado custo da água, superior a 1 €/m3. Só a transferência de caudais de outras bacias permite garantir a água necessária aos diferentes usos”.

Barragem de Santa Clara

É, no entanto, fundamental que a solução esteja integrada num sistema eficiente, o que passa, prioritariamente, pela reabilitação do Sistema de Distribuição do Perímetro de Rega do Mira (PRM), sistema construído há mais de 60 anos e que aguarda obras há cerca de 30 anos, obras estas que contam com financiamento aprovado, mas que ainda não foram concretizadas. De acordo com o especialista, “ambas (reabilitação e interligação) podem ser concluídas nos próximos quatro anos, garantindo os recursos hídricos necessários aos consumos atuais e futuros do PRM”. Os dados disponíveis mostram que o atual sistema de distribuição de água ao PRM tem perdas na ordem dos 40%, o que compromete o presente e o futuro de todas as atividades na região. Consensual é a urgência de concretizar soluções que defendam o território e as suas pessoas, assim como o seu desenvolvimento.

Para Jorge Froes, é simples: “O país tem de fazer opções. A água, que é fundamental ao desenvolvimento, escasseia no Sul e existe em abundância no Norte. Ou se implementam soluções de abastecimento através de interligações entre bacias, ou deixa de haver atividade económica viável a Sul, as populações emigram para as cidades e para o litoral, desertificando-se todo o Sul interior do país”.

A interligação proposta neste estudo é vista como uma solução a longo prazo que pode, inclusive, apoiar a disponibilidade de água no sul do país, já que pode ser prolongada “a partir da albufeira da barragem de Santa Clara, chegando à albufeira da barragem de Odelouca Arade, no Barlavento Algarvio, já ligada por túnel às barragens do Funcho e do Arade, e cuja ligação à barragem de Bravura não se reveste de grande complexidade”, como afirma o consultor. Esta interligação, do Alentejo ao Algarve, pode representar um investimento de 67M€ que, somado aos 63M€ previstos para o sistema Alqueva-Mira, totaliza 130M€.

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