A importância da I&D e dos seus benefícios fiscais no Algarve

Do lado de quem legisla é importante que se compreenda que é imprescindível criar mais previsibilidade fiscal

Falar de fiscalidade é sempre uma conversa de curto-prazo, devido ao facto de Portugal ter um sistema fiscal pouco previsível e que se encontra constantemente a mudar as regras do jogo.

Atualmente, existe uma instabilidade legislativa constante, que afasta o investimento, torna a ação de planeamento fiscal e a tomada de decisão das empresas e até das próprias famílias num jogo cheio de nuances às quais é preciso ter muita atenção.

No âmbito dos benefícios fiscais, porém, destaca-se o caso do SIFIDE – Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial, que tem tido até algum destaque nos últimos tempos, oriundo da proposta do Governo para tornar o SIFIDE mais restritivo, uma vez que foram identificados abusos através do uso de uma dupla dedução do benefício concedido.

É sabido que a Investigação e Desenvolvimento (I&D) tem um impacto positivo muito importante ao nível não só das empresas, como também da economia como um todo, pois é através da I&D que se desenvolve novos conhecimentos científicos e técnicos com vista à melhoria de matérias-primas, produtos, serviços ou até mesmo processos de produção e fabrico de novos produtos.

No caso do SIFIDE, o seu objetivo é apoiar o esforço das empresas em I&D com o propósito de aumentar a competitividade da malha empresarial em Portugal nesta área.

Segundo os dados da Agência Nacional de Inovação (ANI), no exercício fiscal de 2021, foram declarados investimentos em I&D no valor de 1.614 milhões de euros, só no contexto do SIFIDE, alcançando um total de 3.400 empresas.

De forma muito resumida, este instrumento fiscal permite recuperar parte do investimento realizado em I&D, de forma a potenciar o investimento futuro em I&D.

Contudo, o acesso a este benefício fiscal tem um conjunto de condições cumulativas e exigências de elegibilidade das despesas, que vão desde as despesas com pessoal com um certo nível de habilitações literárias mínimas, até aos custos com o registo e manutenção de patentes, que tornam o seu acesso um pouco complexo, e isto para não falar de todas as obrigações de comunicação e formalidades, que o sistema fiscal português preza muito.

 

E no caso do Algarve. Quais são os indicadores no âmbito da Despesa em I&D?

Numa breve pesquisa de dados estatísticos na base de dados da Agência Nacional de Inovação (ANI) sobre a despesa a preços correntes em I&D, em termos percentuais o Algarve representa 0,8% no total de Despesas em I&D no setor empresas, por localização geográfica (NUTS II e III).

O indicador acima resulta do Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional (IPCTN21) com referência ao ano de 2021 onde foram inquiridas 11.666 empresas relativamente às suas despesas em I&D.

Dito isto, é claro que o Algarve se encontra com um indicador em despesas em I&D manifestamente abaixo das expectativas comparando, por exemplo, com o Alentejo que possui cerca de 3,96% de Despesas em I&D, e isto é algo que nos devia inquietar, pois o Algarve possui um conjunto de condições excecionais que podem muito bem alavancar este valor para números mais simpáticos.

Desde logo, o Algarve possui na sua região universidades, e a inovação depende em parte da relação entre as empresas e as universidades, que produzem investigação com alto valor económico e é essencial as empresas beneficiem mais dessas externalidades positivas que a investigação académica cria.

Em segundo lugar, o Algarve possui ainda dentro da própria Universidade do Algarve uma aceleradora de empresas, o UAlg Tec Campus que tem como principal objetivo a dinamização e expansão do ecossistema tecnológico da região, em parceria com Algarve Tech Hub, onde as empresas podem beneficiar de I&D produzida in loco e ao mesmo tempo fazer a transição e aplicação desse conhecimento.

Existe também em Portimão, no ISMAT (Instituto Superior Manuel Teixeira Gomes), o “Nature-Based Solutions” (NBS) Hub Portugal, que pretende implementar uma regeneração urbana inovadora e inclusiva, envolvendo empresas, municípios e as comunidades locais.

Ora, não quer isto dizer as universidades ou as empresas da região não estejam a fazer o seu papel e a aproveitarem de forma simbiótica todas as externalidades positivas criadas por ambos. Existe investigação e desenvolvimento de alta qualidade no seio académico algarvio, aliado a ótimas relações de cooperação com o meio empresarial, aliás, ambas as partes têm tido uma ação hercúlea face às conjunturas macroeconómicas em que a região tem vivido nas últimas décadas. Infelizmente, o que lhes falta é economia de escala.

E aí a culpa não é da academia, nem do tecido empresarial, mas sim das políticas públicas débeis e desprovidas de estratégia de longo-prazo, implementadas na região nos últimos anos.

Em suma, para se aceder aos benefícios fiscais, no caso especifíco do SIFIDE, é necessário haver I&D e, para isso, é essencial que se crie condições para que as empresas possam aproveitar todo o valor económico produzido pelas universidades nos seus centros de investigação.

Do lado de quem legisla, é importante que se compreenda que é imprescindível criar mais previsibilidade fiscal, para que as empresas possam fazer um planeamento fiscal eficaz e uma eficiente tomada de decisão, e sem isto Portugal continuará a ter infelizmente imprevisibilidade fiscal.

 

Autor: Ricardo Proença Gonçalves é licenciado em Gestão de Empresas e Pós-Graduado em Gestão de Unidades de Saúde, pela Faculdade de Economia da Universidade do Algarve. Detém também um Executive Program em Controlo de Gestão e Avaliação de Performance pela Nova SBE. É igualmente membro efetivo da Delegação Regional do Algarve da Ordem dos Economistas e membro do think tank «Thinking Algarve».

Nota: artigo publicado ao abrigo do protocolo entre o Sul Informação e a Delegação do Algarve da Ordem dos Economista

 

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